A TECELÃ Tentei fugir desta sina, andei saindo da linha, rodando feito pião no giro desta ciranda, desta louca sarabanda, que, quando...

Nova versão dos poemas publicados no II Varal de Poesia da Estação Primeira de Manguinhos – 1999

A TECELÃ

Tentei fugir desta sina,
andei saindo da linha,
rodando feito pião
no giro desta ciranda,
desta louca sarabanda,
que, quando a vida desanda,
não tem barca nem fieira,
não tem unha, não tem mão
pra aparar a ponteira.

Venceu o tempo. O teu nome
já dado por esquecido,
impõe de novo o compasso,
ordena ritmo e som,
onipresente consome
a vastidão do espaço.

Abro os ouvidos,
alargo o coração
e retomo a canção
há muito interrompida.

(Forte, que forte é a tua voz na poesia!)

Ando a exercer outra vez o meu poder,
limitado poder que é apenas este:
lidar com as palavras
e nelas refazer
caminhos, gestos, atos,
resíduos de um tecido esgarçado
bordado na memória.


AVESSO/DIREITO

O que antes eu era virou pedra,
virou gelo talvez,
que é pedra dura e mole,
derretida.

Na minha pedra d´ água ninguém bate,
não bate e ela não fura.
Escorre embaixo da porta,
meio sal, meio sorvete,
meu passado me lambuza,
gruda em mim, tira o sossego
e me deixa desse jeito
assim como estou: confusa.

Sou a que não tem chão, desensofrida.
Nem sei mais o que quero. Isto me impele
a zanzar no sem rumo, aturdida:
por dentro o espanto, e o medo à flor da pele.


[Nova versão dos poemas publicados no II Varal de Poesia da Estação Primeira de Manguinhos – 1999]

Deny Gomes nasceu em São Luís-MA, em 1938, e desde a infância vive no Espírito Santo, em Vitória, cidade que considera como sua terra natal. Licenciada em Letras Neolatinas, pela PUC/RJ (1959), foi professora titular de Teoria da Literatura, na Ufes, por mais de vinte anos. Autora de diversas obras literárias e de crítica literária.
(Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

0 comentários :