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1/22/2016
SUMÁRIO
PREFÁCIO
INTRODUÇÃO - Posição atual do problema de aclimatação
PRIMEIRA PARTE – A TERRA E A GENTE
CAPÍTULO I - O Espírito Santo
O Espírito Santo: A terra; o povoamento; produção e comércio; política e finanças; generalidades.
CAPÍTULO II - As colônias alemães
As colônias de alemães: O território; o clima da região; o clima da região baixa; a fundação da colônia de Santa Isabel; a fundação da colônia de Santa Leopoldina; a expansão do povoamento; a formação das comunidades; a topografia das áreas onde se situam as comunidades; lugarejos e sítios.
CAPÍTULO III - Número de colonos; crescimento demográfico
Número de colonos; crescimento demográfico: Número de colonos alemães; nascimentos e óbitos (números absolutos e números relativos).
SEGUNDA PARTE – O TRABALHO
CAPÍTULO IV - Os métodos de produção dos sitiantes alemães
Os métodos de produção dos sitiantes alemães: superfície, em média, cultivada; a derrubada; o café: plantação, trato cultural e colheita; o beneficiamento do café; o milho e a abóbora; os tubérculos; as outras culturas; a criação; a construção; o ano agrícola.
CAPÍTULO V – O labor agrícola e seus aspectos gerais
O labor agrícola e seus aspectos gerais: A cultura exaustiva; a monocultura; a pequena empresa; o mutirão; a capacidade de trabalho; a divisão de trabalho entre o homem e a mulher; o Comitê Econômico.
CAPÍTULO VI - A circulação
A circulação: Generalidades; venda e preços da terra; dívidas; a venda e o vendeiro; o comércio ambulante; a tropa; as casas comerciais de Vitória e Porto do Cachoeiro; o comércio do café; os artesãos; observações finais.
TERCEIRA PARTE – O MODO DE VIDA
CAPÍTULO VII - O nível de vida
O nível de vida: Orçamento doméstico; moradia; o vestuário; a alimentação; a boda; o enterro.
CAPÍTULO VIII - A salubridade
A salubridade: a situação sanitária, outrora e atualmente; a mortalidade segundo períodos de vida; as doenças; a higiene; a influência do clima; sexualidade e casamento.
CAPÍTULO IX - Educação e caráter
Educação e caráter: Generalidades; a igreja; a escola; o linguajar dos colonos; o inventário; a índole étnica, sua aclimatação.
BIBLIOGRAFIA
[Do original alemão Die deutschen kolonisten im brasilianischen staate Espírito Santo, Verlag von Duncker & Humblot — München und Leipzig, 1915. Tradução de Reginaldo Sant'Ana publicada em Separata dos nºs 68-70 do Boletim Geográfico, IBGE, correspondentes aos meses de novembro e dezembro de 1948 e janeiro de 1949, Rio de Janeiro, Serviço Gráfico do IBGE, 1949.]
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© 2001 A utilização / divulgação sem prévia autorização representa desrespeito aos serviços de preparação para publicação.
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Venda de Karl Bullerjahn, em Santa Maria de Jetibá. [In WERNICKE, Hugo. Viagem pelas colônias alemãs do Espírito Santo. Vitória: Arquivo P...
A colonização alemã no Espírito Santo - Sumário
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Venda de Karl Bullerjahn, em Santa Maria de Jetibá. [In WERNICKE, Hugo. Viagem pelas colônias alemãs do Espírito Santo. Vitória: Arquivo Público do Espírito Santo, 2013, p.107.] |
SUMÁRIO
PREFÁCIO
INTRODUÇÃO - Posição atual do problema de aclimatação
PRIMEIRA PARTE – A TERRA E A GENTE
CAPÍTULO I - O Espírito Santo
O Espírito Santo: A terra; o povoamento; produção e comércio; política e finanças; generalidades.
CAPÍTULO II - As colônias alemães
As colônias de alemães: O território; o clima da região; o clima da região baixa; a fundação da colônia de Santa Isabel; a fundação da colônia de Santa Leopoldina; a expansão do povoamento; a formação das comunidades; a topografia das áreas onde se situam as comunidades; lugarejos e sítios.
CAPÍTULO III - Número de colonos; crescimento demográfico
Número de colonos; crescimento demográfico: Número de colonos alemães; nascimentos e óbitos (números absolutos e números relativos).
SEGUNDA PARTE – O TRABALHO
CAPÍTULO IV - Os métodos de produção dos sitiantes alemães
Os métodos de produção dos sitiantes alemães: superfície, em média, cultivada; a derrubada; o café: plantação, trato cultural e colheita; o beneficiamento do café; o milho e a abóbora; os tubérculos; as outras culturas; a criação; a construção; o ano agrícola.
CAPÍTULO V – O labor agrícola e seus aspectos gerais
O labor agrícola e seus aspectos gerais: A cultura exaustiva; a monocultura; a pequena empresa; o mutirão; a capacidade de trabalho; a divisão de trabalho entre o homem e a mulher; o Comitê Econômico.
CAPÍTULO VI - A circulação
A circulação: Generalidades; venda e preços da terra; dívidas; a venda e o vendeiro; o comércio ambulante; a tropa; as casas comerciais de Vitória e Porto do Cachoeiro; o comércio do café; os artesãos; observações finais.
TERCEIRA PARTE – O MODO DE VIDA
CAPÍTULO VII - O nível de vida
O nível de vida: Orçamento doméstico; moradia; o vestuário; a alimentação; a boda; o enterro.
CAPÍTULO VIII - A salubridade
A salubridade: a situação sanitária, outrora e atualmente; a mortalidade segundo períodos de vida; as doenças; a higiene; a influência do clima; sexualidade e casamento.
CAPÍTULO IX - Educação e caráter
Educação e caráter: Generalidades; a igreja; a escola; o linguajar dos colonos; o inventário; a índole étnica, sua aclimatação.
BIBLIOGRAFIA
[Do original alemão Die deutschen kolonisten im brasilianischen staate Espírito Santo, Verlag von Duncker & Humblot — München und Leipzig, 1915. Tradução de Reginaldo Sant'Ana publicada em Separata dos nºs 68-70 do Boletim Geográfico, IBGE, correspondentes aos meses de novembro e dezembro de 1948 e janeiro de 1949, Rio de Janeiro, Serviço Gráfico do IBGE, 1949.]
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© 2001 A utilização / divulgação sem prévia autorização representa desrespeito aos serviços de preparação para publicação.
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Ernst Wagemann (autor) nasceu em 18 de Fevereiro de 1884, em Chañarcillo, Chile, faleceu em 20 de Março de 1956, em Bad Godesberg, Alemanha. Foi economista político e estatístico muito atuante na Alemanha a partir dos anos de 1920. Para mais informações, clique aqui.
1/08/2016
Annuaire du Brésil économique. 1913, págs. 666 e segs.
ARANHA, Graça. Canaã. 3. edição.
Bibliothèque coloniale internationale. Compte rendu de 1909, 1911, 1912. Institut Colonial International. Bruxelas.
Balanços do Banco Hipotecário e Agrícola do Estado do Espírito Santo.
BOLLE, Karl. Beitrag zum Thema der Akklimatisation in Tropenländern. Deutsche Kolonialzeitung. 3° volume, Berlim, 1886, págs. 620 e segs.
Mensagens e Relatórios dos presidentes do Espírito Santo: especialmente de 1847, 1848, 1861, 1863, 1865, 1896, 1900, 1904, 1908, 1912, 1913.
Constituição Política do Estado do Espírito Santo. Reforma promulgada aos 13 de maio de 1913. Vitória, 1913.
Dicionário prático ilustrado. Novo dicionário enciclopédico luso-brasileiro. Rio de Janeiro.
FESCA, Max. Der Pflanzenbau in den Tropen und Subtropen. 2 volumes. Berlim, 1904 e 1907.
EHRENREICH. Land und Leute am Rio Doce (Brasilien). Verh. d. Ges. für Erdkunde zu Berlin. Volume 13, Berlim, 1886, págs. 94 a 105.
FISCHER, Ansätze zur Bildung einer Pfarrkonferenz und eines Gemeindeverbandes in Espírito Santo in Mittel- Brasilien. Deutsch-Evangelisch im Auslande. Ano X: caderno 8°.
GRIMM, H. Deutsche Tüchtigkeit und Not in Espírito Santo. Süd-und Mittelamerika. Ano VI, n° 18 e 19, setembro e outubro de 1913.
___. Zur Geschichte der Pommerngemeinde Santa Leopoldina II, Jequitibá in Espírito Santo. Deutsch- Evangelisch im Auslande. Ano XII, 1° caderno. 1912. Págs. 1 e segs.
HANDELMANN, Heinrich. Geschichte von Brasilien. Berlim, 1860. Págs. 441 e segs.
HEMPEL. Artigo no jornal teuto-brasileiro Germânia.
KAERGER, Karl. Brasilianische Wirtschaftsbilder. 2. edição, Berlim, 1892.
LAMBERG, Moritz. Brasilien, Land und Leute. Leipzig, 1899.
Págs. 213 a 232: Der Staate Espírito Santo.
MARQUES, César Augusto. Dicionário histórico, geográfico e estatístico da província do Espírito Santo. Rio de Janeiro, 1873.
Mapa Topográfico da Província do Espírito Santo, organizado na Inspetoria Geral de Terras e Colonização... precedido de uma breve notícia sobre a mesma província, Rio de Janeiro, 1878.
MONTEIRO, Jerônimo. Exposição sobre os negócios do Estado no quatriênio de 1909 a 1912. Vitória, 1913.
PLASS, E. L. Die deutschen Kolonisten im tropischen Brasilien, Gartenlaube, n° 34, 1912.
Regulamento para a cobrança dos impostos municipais. Santa Isabel, Vitória, 1905.
Relatório da Diretoria Central de Terras e Colonização do Estado do Espírito Santo, de 1892 a 1896. Rio de Janeiro, 1897.
RIZZETTO, R. Lo Stato di Espírito Santo. Bollettino del Ministero degli Affari Esteri. N° geral 289, abril, 1904.
SIEVERS, Wilhelm. Süd- und Mittelamerika. 3. edição, Leipzig e Viena, 1914.
TSCHUDI, J. J. von. Reisen durch Südamerika. Leipzig, 1867, 3. volume, págs. 1 a 82.
URBAN. Santa Isabel, die erste deutsche evangelische Gemeinde im Staate Espirito Santo, Brasilien. Gut Deutsch und Evangelisch allewege, caderno 1.
Verhandlungen des Deutschen Kolonialkongresses 1910. Berlim, 1910.
WALLE, Paul. Au Brésil. Du Rio São Francisco à l'Amazone. Págs. 1 a 44.
WANDERJAHRE. Briefe eines Urwaldpfarrers. Bote für die christliche Frauenwelt. n° 28 a 35.
WAPPÄUS, J. C. Handbuch der Geographie und Statistik des Kaiserreichs Brasilien. Leipzig, 1871. Págs. 1711 e segs.
WELLMANN. Aller Anfang ist schwer. Erinnerungen aus der ersten Zeit meines Urwaldlebens. Gut Deutsch und Evangelisch allewege, caderno 11.
WERNICKE, Hugo. Deutsch-evangelisches Volkstum in Espirito Santo. Eine Reise zu deutschen Kaffeebauern in einem tropischen Staate Brasiliens. Potsdam, 1910.
(para visualizar o sumário completo do texto clique aqui ) Annuaire du Brésil économique . 1913, págs. 666 e segs. ARANHA, Graça. C...
A colonização alemã no Espírito Santo - Bibliografia
(para visualizar o sumário completo do texto clique aqui)
Annuaire du Brésil économique. 1913, págs. 666 e segs.
ARANHA, Graça. Canaã. 3. edição.
Bibliothèque coloniale internationale. Compte rendu de 1909, 1911, 1912. Institut Colonial International. Bruxelas.
Balanços do Banco Hipotecário e Agrícola do Estado do Espírito Santo.
BOLLE, Karl. Beitrag zum Thema der Akklimatisation in Tropenländern. Deutsche Kolonialzeitung. 3° volume, Berlim, 1886, págs. 620 e segs.
Mensagens e Relatórios dos presidentes do Espírito Santo: especialmente de 1847, 1848, 1861, 1863, 1865, 1896, 1900, 1904, 1908, 1912, 1913.
Constituição Política do Estado do Espírito Santo. Reforma promulgada aos 13 de maio de 1913. Vitória, 1913.
Dicionário prático ilustrado. Novo dicionário enciclopédico luso-brasileiro. Rio de Janeiro.
FESCA, Max. Der Pflanzenbau in den Tropen und Subtropen. 2 volumes. Berlim, 1904 e 1907.
EHRENREICH. Land und Leute am Rio Doce (Brasilien). Verh. d. Ges. für Erdkunde zu Berlin. Volume 13, Berlim, 1886, págs. 94 a 105.
FISCHER, Ansätze zur Bildung einer Pfarrkonferenz und eines Gemeindeverbandes in Espírito Santo in Mittel- Brasilien. Deutsch-Evangelisch im Auslande. Ano X: caderno 8°.
GRIMM, H. Deutsche Tüchtigkeit und Not in Espírito Santo. Süd-und Mittelamerika. Ano VI, n° 18 e 19, setembro e outubro de 1913.
___. Zur Geschichte der Pommerngemeinde Santa Leopoldina II, Jequitibá in Espírito Santo. Deutsch- Evangelisch im Auslande. Ano XII, 1° caderno. 1912. Págs. 1 e segs.
HANDELMANN, Heinrich. Geschichte von Brasilien. Berlim, 1860. Págs. 441 e segs.
HEMPEL. Artigo no jornal teuto-brasileiro Germânia.
KAERGER, Karl. Brasilianische Wirtschaftsbilder. 2. edição, Berlim, 1892.
LAMBERG, Moritz. Brasilien, Land und Leute. Leipzig, 1899.
Págs. 213 a 232: Der Staate Espírito Santo.
MARQUES, César Augusto. Dicionário histórico, geográfico e estatístico da província do Espírito Santo. Rio de Janeiro, 1873.
Mapa Topográfico da Província do Espírito Santo, organizado na Inspetoria Geral de Terras e Colonização... precedido de uma breve notícia sobre a mesma província, Rio de Janeiro, 1878.
MONTEIRO, Jerônimo. Exposição sobre os negócios do Estado no quatriênio de 1909 a 1912. Vitória, 1913.
PLASS, E. L. Die deutschen Kolonisten im tropischen Brasilien, Gartenlaube, n° 34, 1912.
Regulamento para a cobrança dos impostos municipais. Santa Isabel, Vitória, 1905.
Relatório da Diretoria Central de Terras e Colonização do Estado do Espírito Santo, de 1892 a 1896. Rio de Janeiro, 1897.
RIZZETTO, R. Lo Stato di Espírito Santo. Bollettino del Ministero degli Affari Esteri. N° geral 289, abril, 1904.
SIEVERS, Wilhelm. Süd- und Mittelamerika. 3. edição, Leipzig e Viena, 1914.
TSCHUDI, J. J. von. Reisen durch Südamerika. Leipzig, 1867, 3. volume, págs. 1 a 82.
URBAN. Santa Isabel, die erste deutsche evangelische Gemeinde im Staate Espirito Santo, Brasilien. Gut Deutsch und Evangelisch allewege, caderno 1.
Verhandlungen des Deutschen Kolonialkongresses 1910. Berlim, 1910.
WALLE, Paul. Au Brésil. Du Rio São Francisco à l'Amazone. Págs. 1 a 44.
WANDERJAHRE. Briefe eines Urwaldpfarrers. Bote für die christliche Frauenwelt. n° 28 a 35.
WAPPÄUS, J. C. Handbuch der Geographie und Statistik des Kaiserreichs Brasilien. Leipzig, 1871. Págs. 1711 e segs.
WELLMANN. Aller Anfang ist schwer. Erinnerungen aus der ersten Zeit meines Urwaldlebens. Gut Deutsch und Evangelisch allewege, caderno 11.
WERNICKE, Hugo. Deutsch-evangelisches Volkstum in Espirito Santo. Eine Reise zu deutschen Kaffeebauern in einem tropischen Staate Brasiliens. Potsdam, 1910.
Ernst Wagemann (autor) nasceu em 18 de Fevereiro de 1884, em Chañarcillo, Chile, faleceu em 20 de Março de 1956, em Bad Godesberg, Alemanha. Foi economista político e estatístico muito atuante na Alemanha a partir dos anos de 1920. Para mais informações sobre o autor clique aqui.
(para visualizar o sumário completo do texto clique aqui)
1/06/2016
O Espírito Santo é um dos menores estados brasileiros não só quanto à população, mas também quanto à superfície. Situado como está entre os grandes estados da Bahia, Rio de Janeiro e Minas Gerais, parece dever a existência mais a um capricho da história do que ao imperativo de uma necessidade.
Seu território tem 400 quilômetros de comprimento e pouco mais de 100 quilômetros de largura, formando uma faixa que se estende de 18º, 5' a 21º, 28' de latitude sul na borda oriental do grande planalto brasileiro, passando pelas encostas da serra dos Aimorés e de suas ramificações meridionais, pelas das serras do Espigão e da Chibata.
É uma região predominantemente montanhosa, cortada por numerosos cursos d'água, com florestas espessas. Ao norte, vai declinando, com certa regularidade, em direção à costa; e ao sul enruga-se em algumas serras que se alteiam até 1.400 metros. Só a orla marítima apresenta características acentuadas de uma planície que, entretanto, pouco se distende. Mas, acima de 20º, a planura se expande, penetrando mais no interior, especialmente no curso inferior do rio Doce, onde se espraia, coberta de lagos e pântanos.
O rio Doce se origina em Minas, irrompe, em cataratas, através da serra dos Aimorés, corta o Espírito Santo mais ou menos ao meio, sendo o maior rio desse estado. É navegável, embora com dificuldade, até as imediações da fronteira de Minas. São navegáveis, no curso inferior, por pequenas embarcações, o Santa Maria e o Itapemirim, que fluem ao sul, em direção à costa. A hidrografia é, assim, pouco favorável ao transporte.
A conformação da costa, ao contrário, favorece muito a navegação. O porto de Vitória, na baía do Espírito Santo, apesar da entrada um pouco difícil, é um dos melhores do Brasil.
No que diz respeito às condições pedológicas, existem duas zonas principais de cultura: uma formada pelas terras baixas, com aspecto tropical; outra, pelas terras altas, onde predomina o aspecto subtropical. A zona baixa que, estendendo-se ao longo da costa, ora se alarga e ora se encurta, avançando pelos vales dos afluentes do rio Doce presta-se bem para o cultivo do algodão, da cana de açúcar e da maior parte dos produtos tropicais. Na região alta, podem ser cultivados quase todos os produtos subtropicais e muitos da zona temperada. Em geral, a terra é muito fértil. As florestas contêm grandes reservas de madeiras de lei. Especial menção merece a riqueza em jacarandá, uma espécie de palissandro, e em peroba, madeira excelente para a feitura de móveis. Tanto quanto se sabe até hoje, não possui o Espírito Santo riquezas minerais em quantidades apreciáveis. A respeito nada se pode citar além da areia monazítica da costa.
Qualquer que seja, a situação com referência às riquezas naturais do estado, a extensão do território limita as perspectivas de desenvolvimento econômico. A superfície do Espírito Santo não vai além de 45.000 km²; é bem menor que a da Baviera e não muito maior que a de Hannover ou Silésia.
É de se levar em conta, entretanto, o estado vizinho de Minas Gerais, de subsolo muito rico. Está sendo concluída a construção do porto de Vitória, por onde se escoará o minério, a ser trazido pela Estrada de Ferro Vitória-Diamantina.
Os primeiros europeus que pisaram o Espírito Santo foram os portugueses, em 1535. Começaram a colonização fundando a cidadezinha de Espírito Santo — a atual Vila Velha. Só pouco mais tarde erigiram defronte, na ilha da baía do Espírito Santo, a atual capital do estado, Vitória.
A colonização progrediu pouco;[ 2 ] era dificultada, principalmente, pela animosidade dos íncolas que, apesar de todas as represálias, irrompiam, destruidores, dos esconderijos seguros da floresta, sobre as colônias dos brancos. Graças ao zelo evangelizador dos jesuítas, a civilização européia foi levada, pelo menos, a parte dos índios. Foram aldeados para a catequese,[ 3 ] e punha-se em prática um regime semelhante ao do Estado Jesuíta do Paraguai, mas sem o comunismo de lá. Os brancos eram, tanto quanto possível, afastados das aldeias da Companhia de Jesus. Os índios foram amoldados ao sedentarismo, foram-lhes ensinados artes e ofícios e agricultura. Os que se civilizavam, tornavam-se aliados na luta contra as tribos do interior. Com a expulsão dos jesuítas em 1758, perderam-se todos esses frutos. Os índios entregues a si mesmos, foram, em pouco, empurrados para as florestas, exterminados ou absorvidos pela população das colônias. Em 1750, contavam-se 40.000 índios civilizados, em 1856, somente 6.000.
A colonização lusitana, apesar do apoio nas aldeias jesuíticas, permaneceu, como se iniciara, na orla marítima, onde o terreno se prestava excelentemente ao cultivo da cana de açúcar e do algodão e onde era possível desenvolver-se a exploração agrícola baseada no trabalho escravo, como em Pernambuco. Já em 1662, chegavam ao Espírito Santo os primeiros negros.[ 4 ] Quanto às atividades açucareiras, as informações existentes permitem que se deduza ter havido 76 engenhos grandes e 68 menores.[ 5 ] Conforme censo da época,[ 6 ] o Espírito Santo possuía, em 1856, uma população de 49.000 almas, das quais 12.000 escravos e 37.000 livres. Todos os escravos eram, naturalmente, negros ou mestiços de negro. A população livre se distribuía, segundo a raça, como segue:
Na conformidade desses dados, 39% da população era branca; é provável, porém, que a porcentagem fosse menor, uma vez que, de acordo com a experiência dos recenseamentos, muitos mestiços procuram passar por brancos.
Das pessoas livres em atividade, eram:
Quase não existia, portanto, a divisão profissional do trabalho. Em 1854 e 1855, havia, apenas, 226 empresas comerciais e industriais. Predominava, assim, uma estrutura econômica fechada, que produzia algo para exportação.
Em 1859, Handelmann escrevia: "O Espírito Santo, juntamente com a região meridional da Bahia, forma aquela faixa costeira que ficou mais atrasada, após 300 anos de colonização".[ 7 ] Bem pouco se tinha alcançado até então. Mas, segundo parece, pôs em risco esse pouco, a libertação dos escravos, iniciada em 1831 com a proibição do tráfico negreiro, e concluída em 1889. Lançou por terra a antiga organização do trabalho, muitas explorações agrícolas decaíram. Os libertos, em sua maioria, abandonaram as fazendas, espalharam-se pelas florestas e passaram a viver na forma mais rudimentar de economia fechada.
Mas nova vida já ia despontando sobre as ruínas do velho sistema. Os imigrantes teutos que começaram a chegar na década dos 40, engrossando o número na dos 70, e os italianos que afluíram nos anos de 1877 a 1895,[ 8 ] lançaram-se, vigorosamente, à colonização das florestas serranas.
A população atual do Espírito Santo é, provavelmente, de 300.000 almas.[ 9 ] Toda a região ao norte do rio Doce, metade mais ou menos, do território do estado, é escassamente povoada. Aí, onde ainda vagueiam selvagens — os aimorés ou botocudos — há à margem do São Mateus, apenas, algumas povoações pequenas de aborígenes, hoje, na maioria, miscigenados. São poucos os negros ou índios, sem mestiçagem, que se encontram entre eles; e, pondo de lado os colonos alemães e italianos,[ 10 ] é também muito reduzido o número de brancos puros.
A maior parte da população vive dispersa em unidades familiares ou aldeias minúsculas. Segundo dados oficiais, há no Espírito Santo mais de 200 localidades, entre as quais 12 cidades.[ 11 ] A maior delas, porém, a capital do estado, Vitória, tem pouco mais de 25.000 habitantes. É a maior praça comercial do estado e a sede de algumas casas de negócio importantes. Está sendo modernizada; foi dotada de luz elétrica e de bondes e, conforme mencionamos, grandes instalações portuárias estão em construção. Cachoeiro do Itapemirim, situada à margem do Itapemirim, é a segunda cidade em importância. É o centro comercial do sul. A seguir, vem a cidade de Porto do Cachoeiro de Santa Leopoldina, com 1.200 habitantes; é banhada pelo Santa Maria, que desemboca na baía do Espírito Santo.
Com a supressão do tráfico negreiro e da escravatura a cultura da cana de açúcar e a do algodão foram sendo suplantadas pela exploração cafeeira.
Em 1863, o relatório do presidente Costa Pereira Júnior dá, sobre o retrocesso da produção açucareira, os seguintes números:[ 12 ]
Mas a plantação de café fez grandes progressos. Aliás, essa cultura desenvolveu-se muito noutras regiões brasileiras, no decênio de 1840. Seguem, abaixo, dados sobre a exportação cafeeira do Espírito Santo:
Esse fato parece confirmar a observação — assim se diz no relatório citado — que mais de um viajante fez na América, a de que a cultura do açúcar é, de todos os ramos da economia agrícola, aquela que melhor se ajusta ao trabalho escravo. Sua decadência, a partir da década de 1840, se explica, segundo o relatório, pela proibição, estabelecida anteriormente, do comércio de escravos, que, no momento, passara a ser reprimido com severa vigilância. São, também, apontados como causas a praga de lagarta, que os produtores de açúcar tiveram de enfrentar, e os preços correntes.
Com o povoamento da região alta pelos imigrantes alemães e italianos, a cultura do café passou a ter absoluto predomínio. Ficou demonstrado, nas terras altas, ser o produto de exportação mais lucrativo. Foram exportadas, do Espírito Santo,[ 13 ] em 1894, 1 milhão e 400 mil arrobas de café, ou seja 21 milhões de quilos; em 1912, 3 milhões de arrobas, isto é, 45 milhões de quilos[ 14 ] (só de Vitória, 1 milhão e 900 mil arrobas — 28 milhões de quilos). Uma quantidade minúscula em face da produção total do Brasil de mais de 10 milhões de sacos (600 milhões de quilos)! É de pouco valor a exportação espírito-santense de outros produtos; limita-se à madeira, areia monazítica etc.
Desenvolveu-se, assim, a monocultura, perigosa para o estado, os comerciantes e os grandes produtores, mas não tanto para os colonos, como veremos adiante.
Excetuados alguns reveses isolados, o comércio progrediu muito. Durante o ano de 1863, quando o mil réis valia 27 pence, a situação era a seguinte:
A soma da exportação com a importação, levantadas pela estatística, não alcançava, ainda, 3 milhões de marcos; todo o movimento comercial montaria, dificilmente, a mais de 5 milhões.
Segundo o levantamento estatístico de 1911, quando o câmbio estava a 16 pence, o intercâmbio com o exterior se apresentava assim:
Se for acrescentada a exportação para os estados vizinhos, a saída total de mercadorias ultrapassará 25 milhões de mil réis. Admitindo-se que a importação, em virtude de remessas de juros para o exterior etc., oscile entre 20 e 25 milhões de mil réis, poderemos estimar o atual comércio exterior em cerca de 50 milhões de mil réis, ou seja 65 a 70 milhões de marcos, o que representa, para a população, 200 a 250 marcos per capita.
Só no setor de exportação se observa a monocultura; ao lado da exploração cafeeira, há uma extensa produção para satisfazer o consumo interno. Os produtos mais importantes são: tubérculos, feijão, milho, carne, toucinho, queijo e manteiga. A bem dizer, não possuem mercado interno. São produzidos domesticamente. São consumidos pela mesma comunidade minúscula que os produz.
O Espírito Santo, portanto, ainda apresenta estrutura econômica idêntica à dos países novos; isto é, a produção doméstica se liga, estreitamente, àquela destinada à exportação, a economia familiar se entrelaça com a mundial. Observa-se a falta, quase absoluta, do estágio intermediário — a produção para o mercado local e, por conseguinte, do circuito econômico interno.
É o que se revela nos meios de transporte. Uma navegação fluvial e costeira inexpressiva, os muares e os carros de boi são os meios de transporte dentro do estado. Entretanto, o navio de vapor e a linha férrea põem-se em contato com o tráfico internacional. Desde 1910, a cidade de Vitória está ligada, por estrada de ferro, a Niterói, e, por intermédio desta ao Rio de Janeiro. A viagem leva 21 a 22 horas.[ 15 ] A estrada pertence a uma companhia inglesa, a Leopoldina Railway Co. Há pouco tempo, concluindo-se a via férrea que vai de Vitória a Diamantina, vinculando-se, assim, a capital com a rede ferroviária de Minas. O estado possui, ao todo, 550 quilômetros de trilhos. Os navios do Lóide Brasileiro, que navegam, regularmente, entre os portos brasileiros mais importantes, transportam passageiros de Vitória ao Rio, em 24 horas. Vitória, por sua vez, tem contato direto com empórios ultramarinos.
A organização do comércio corresponde a essas condições. Na capital existem apenas algumas casas comerciais importantes, em cujas mãos quase que se concentram exportação e importação; só os comerciantes de Porto do Cachoeiro e de Itapemirim fazem-lhe concorrência. No interior encontram-se inúmeros pequenos comerciantes, os vendeiros, que obtêm os artigos das firmas importadoras, para distribuí-los à população; além disso, compram dos seus fregueses pequenas partidas de café, para entregá-las, posteriormente, a essas firmas. Nota-se, ainda, um comércio ambulante, em decadência, oriundo de Minas, o qual provê o estado, principalmente, de gado, artigos de montaria e fumo.
O crédito desenvolveu-se pouco. Há em Vitória, uma filial do London and River Plate Bank, fundada em 1910. Seus depósitos elevaram-se a mais de 1 milhão de mil réis. Os juros cobrados oscilam entre 9 e 10%, em casos de risco maior, entre 13 e 14. Em 1911, surgiu o Banco Hipotecário e Agrícola Francês.[ 16 ] Do seu capital, cujo valor nominal é de 10 milhões de francos, só foi coberta a décima parte, um milhão, apesar de o estado se ter obrigado a uma garantia de juros de 5%. O Banco colocou em França obrigações de 5%, tipo 81 por 40 milhões de francos. Seus empréstimos se têm destinado, principalmente, a hipotecas e empreendimentos industriais.[ 17 ]
Parece, porém, não ter chegado, ainda, o momento propício ao desenvolvimento industrial, que o estado procura incentivar com isenção de Impostos, doação de terrenos etc. Necessariamente, uma indústria terá sempre de lutar contra os maiores obstáculos, numa economia como a do Espírito Santo, em que é quase nulo o mercado interno, seja de mercadorias ou de trabalho.
O Espírito Santo foi incorporado ao império colonial português como feudo, como capitania.[ 18 ] Foi vendido, várias vezes, pelos respectivos donos, sendo, por fim, comprado pelo próprio rei, em 1718. Este colocou o território sob a direção de funcionários (capitães-mores), subordinados ao governador geral da Bahia. Em 1803, esses funcionários foram substituídos por governadores que, de 1809 em diante, não mais se subordinavam à direção da Bahia de modo que o Espírito Santo se tornou província autônoma. Com a reforma administrativa do Império, foi dotado de ampla autonomia administrativa. Após a queda da monarquia, em 1889, o Brasil, seguindo o modelo estadunidense, transformou-se em federação. O Espírito Santo passou, assim, a ser um estado. É representado, no Congresso Federal, por três senadores e quatro deputados.
A organização do estado é a seguinte:[ 19 ] À frente está o presidente, eleito por um período de 4 anos, por voto direto. Tem extensos poderes. O direito de veto embora não seja absoluto, é bastante amplo. Incumbe-lhe, exclusivamente, a nomeação de funcionários públicos, e pertence-lhe o direito de veto. O presidente pode prorrogar a lei orçamentária, quando o Congresso, por qualquer motivo, não se tenha pronunciado sobre a matéria. O órgão legislativo é o Congresso, formado de uma só câmara; é constituído por 25 deputados; não há senado. O estado é dividido em municípios cujos negócios são geridos por uma câmara municipal, presidida pelo prefeito eleito por escrutínio direto.
No Espírito Santo, apesar de todos os princípios democráticos, governa-se oligarquicamente, como é regra na América do Sul. No fim, apenas algumas famílias dominam o estado. É significativo que os três irmãos do ex-presidente do estado, Jerônimo Monteiro, presidente atual do Congresso, exerçam as seguintes funções: um é o bispo do estado, outro, diretor fiscal do Banco Francês, e o terceiro, senador federal no Rio.
A vida pública não se diferencia do padrão vigorante na América do Sul. A Justiça é influenciável e insegura. Entretanto, se muitos crimes não se punem, uma das causas reside nas péssimas condições de transporte, que limitam, bastante, o poder das autoridades.
Não parece haver muito escrúpulo relativamente às finanças públicas. Lembrarei, a propósito, um trecho do relatório do presidente Monteiro,[ 20 ] em que se acusa o antecessor de ter apresentado, ao passar o governo, como valor da dívida pública, 426.000 mil réis, quando o montante real era de 1.170.000 mil mil réis. É interessante o que se diz no relatório sobre o hábito da gestão passada, de efetuar os pagamentos, com o máximo de impontualidade. Agora, acabou-se com esse sistema odioso e execrando, de submeter funcionários e empreiteiros de obras públicas ao arbítrio de mandantes, que ora os forçavam a deduzir de seus recebimentos, quantias apreciáveis, a favor de intermediários e ora os faziam esperar, indefinidamente, por pagamento, coagindo-os, assim, a se tornarem correligionários políticos ou tirando vinganças abomináveis.[ 21 ]
Quase toda a receita do estado decorre da exportação de café, como se verifica da proposta orçamentária de 1913.
Toda colheita malograda e toda queda dos preços do café significam prejuízo imediato para o fisco. Quando o preço do café de 13 a 20 mil réis, em 1896, baixou a 6 a 10, em 1900, e a 5 a 7, em 1904, as receitas do estado diminuíram da seguinte maneira:[ 22 ]
O Tesouro que, em 1894, contraíra dívidas volumosas, ficou em aperturas. Esteve sob ameaça de bancarrota. O crédito do estado evaporou-se. Todavia, um acordo com os credores complacentes evitou a catástrofe. A situação melhorou e as receitas ordinárias elevaram-se, conforme o quadro abaixo:[ 23 ]
As dívidas não diminuíram. Em 23 de maio de 1912 importavam em 39,2 milhões de francos, distribuindo-se da seguinte maneira:[ 24 ]
Além das rendas estaduais, devem ser levadas em conta as receitas municipais, que decorrem, principalmente, do imposto de indústria e profissões, cuja incidência mais importante é sobre as casas comerciais.[ 25 ] Em 1911, receitas dos municípios de maior destaque eram:
As condições políticas e sociais do Espírito Santo parecem demonstrar, em seu conjunto, a ação debilitante do clima tropical. Observa-se, por certo, pujante desenvolvimento em muitos setores da vida econômica. A grande massa da população nativa vive, como dantes, indolentemente, em meio às condições mais rudimentares. Produz pouco para o mercado e contenta-se com um nível de vida baixo; vegeta na anarquia quase completa, vítima da ignorância crassa, prisioneira de superstições infantis e afastada do circulo de influência das forças civilizadoras e, em particular, da autoridade política. Esta, dominada pela incúria e por todas as formas imagináveis de corrupção, embora revestida da pomposa aparência republicana, leva uma existência fantasmagórica e parasitária.
Este triste estado de cousas prefigura o sombrio destino que aguarda os imigrantes alemães, fortes e operosos? A exposição que se segue pretende responder à pergunta.
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(para visualizar o sumário completo do texto clique aqui ) Capítulo I – O Espírito Santo 1. A terra [ 1 ] O Espírito Santo é um...
A colonização alemã no Espírito Santo - Primeira parte: a terra e a gente (I)
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Capítulo I – O Espírito Santo
1. A terra[ 1 ]
O Espírito Santo é um dos menores estados brasileiros não só quanto à população, mas também quanto à superfície. Situado como está entre os grandes estados da Bahia, Rio de Janeiro e Minas Gerais, parece dever a existência mais a um capricho da história do que ao imperativo de uma necessidade.
Seu território tem 400 quilômetros de comprimento e pouco mais de 100 quilômetros de largura, formando uma faixa que se estende de 18º, 5' a 21º, 28' de latitude sul na borda oriental do grande planalto brasileiro, passando pelas encostas da serra dos Aimorés e de suas ramificações meridionais, pelas das serras do Espigão e da Chibata.
É uma região predominantemente montanhosa, cortada por numerosos cursos d'água, com florestas espessas. Ao norte, vai declinando, com certa regularidade, em direção à costa; e ao sul enruga-se em algumas serras que se alteiam até 1.400 metros. Só a orla marítima apresenta características acentuadas de uma planície que, entretanto, pouco se distende. Mas, acima de 20º, a planura se expande, penetrando mais no interior, especialmente no curso inferior do rio Doce, onde se espraia, coberta de lagos e pântanos.
O rio Doce se origina em Minas, irrompe, em cataratas, através da serra dos Aimorés, corta o Espírito Santo mais ou menos ao meio, sendo o maior rio desse estado. É navegável, embora com dificuldade, até as imediações da fronteira de Minas. São navegáveis, no curso inferior, por pequenas embarcações, o Santa Maria e o Itapemirim, que fluem ao sul, em direção à costa. A hidrografia é, assim, pouco favorável ao transporte.
A conformação da costa, ao contrário, favorece muito a navegação. O porto de Vitória, na baía do Espírito Santo, apesar da entrada um pouco difícil, é um dos melhores do Brasil.
No que diz respeito às condições pedológicas, existem duas zonas principais de cultura: uma formada pelas terras baixas, com aspecto tropical; outra, pelas terras altas, onde predomina o aspecto subtropical. A zona baixa que, estendendo-se ao longo da costa, ora se alarga e ora se encurta, avançando pelos vales dos afluentes do rio Doce presta-se bem para o cultivo do algodão, da cana de açúcar e da maior parte dos produtos tropicais. Na região alta, podem ser cultivados quase todos os produtos subtropicais e muitos da zona temperada. Em geral, a terra é muito fértil. As florestas contêm grandes reservas de madeiras de lei. Especial menção merece a riqueza em jacarandá, uma espécie de palissandro, e em peroba, madeira excelente para a feitura de móveis. Tanto quanto se sabe até hoje, não possui o Espírito Santo riquezas minerais em quantidades apreciáveis. A respeito nada se pode citar além da areia monazítica da costa.
Qualquer que seja, a situação com referência às riquezas naturais do estado, a extensão do território limita as perspectivas de desenvolvimento econômico. A superfície do Espírito Santo não vai além de 45.000 km²; é bem menor que a da Baviera e não muito maior que a de Hannover ou Silésia.
É de se levar em conta, entretanto, o estado vizinho de Minas Gerais, de subsolo muito rico. Está sendo concluída a construção do porto de Vitória, por onde se escoará o minério, a ser trazido pela Estrada de Ferro Vitória-Diamantina.
2. O povoamento
Os primeiros europeus que pisaram o Espírito Santo foram os portugueses, em 1535. Começaram a colonização fundando a cidadezinha de Espírito Santo — a atual Vila Velha. Só pouco mais tarde erigiram defronte, na ilha da baía do Espírito Santo, a atual capital do estado, Vitória.
A colonização progrediu pouco;[ 2 ] era dificultada, principalmente, pela animosidade dos íncolas que, apesar de todas as represálias, irrompiam, destruidores, dos esconderijos seguros da floresta, sobre as colônias dos brancos. Graças ao zelo evangelizador dos jesuítas, a civilização européia foi levada, pelo menos, a parte dos índios. Foram aldeados para a catequese,[ 3 ] e punha-se em prática um regime semelhante ao do Estado Jesuíta do Paraguai, mas sem o comunismo de lá. Os brancos eram, tanto quanto possível, afastados das aldeias da Companhia de Jesus. Os índios foram amoldados ao sedentarismo, foram-lhes ensinados artes e ofícios e agricultura. Os que se civilizavam, tornavam-se aliados na luta contra as tribos do interior. Com a expulsão dos jesuítas em 1758, perderam-se todos esses frutos. Os índios entregues a si mesmos, foram, em pouco, empurrados para as florestas, exterminados ou absorvidos pela população das colônias. Em 1750, contavam-se 40.000 índios civilizados, em 1856, somente 6.000.
A colonização lusitana, apesar do apoio nas aldeias jesuíticas, permaneceu, como se iniciara, na orla marítima, onde o terreno se prestava excelentemente ao cultivo da cana de açúcar e do algodão e onde era possível desenvolver-se a exploração agrícola baseada no trabalho escravo, como em Pernambuco. Já em 1662, chegavam ao Espírito Santo os primeiros negros.[ 4 ] Quanto às atividades açucareiras, as informações existentes permitem que se deduza ter havido 76 engenhos grandes e 68 menores.[ 5 ] Conforme censo da época,[ 6 ] o Espírito Santo possuía, em 1856, uma população de 49.000 almas, das quais 12.000 escravos e 37.000 livres. Todos os escravos eram, naturalmente, negros ou mestiços de negro. A população livre se distribuía, segundo a raça, como segue:
Brancos | 14.314 |
Índios | 6.051 |
Mestiços | 13.825 |
Pretos | 2.626 |
Total | 36.816 |
Das pessoas livres em atividade, eram:
Fazendeiros | 9.759 |
Comerciantes | 364 |
Artífices | 889 |
Funcionários públicos | 161 |
Sacerdotes | 22 |
Em 1859, Handelmann escrevia: "O Espírito Santo, juntamente com a região meridional da Bahia, forma aquela faixa costeira que ficou mais atrasada, após 300 anos de colonização".[ 7 ] Bem pouco se tinha alcançado até então. Mas, segundo parece, pôs em risco esse pouco, a libertação dos escravos, iniciada em 1831 com a proibição do tráfico negreiro, e concluída em 1889. Lançou por terra a antiga organização do trabalho, muitas explorações agrícolas decaíram. Os libertos, em sua maioria, abandonaram as fazendas, espalharam-se pelas florestas e passaram a viver na forma mais rudimentar de economia fechada.
Mas nova vida já ia despontando sobre as ruínas do velho sistema. Os imigrantes teutos que começaram a chegar na década dos 40, engrossando o número na dos 70, e os italianos que afluíram nos anos de 1877 a 1895,[ 8 ] lançaram-se, vigorosamente, à colonização das florestas serranas.
A população atual do Espírito Santo é, provavelmente, de 300.000 almas.[ 9 ] Toda a região ao norte do rio Doce, metade mais ou menos, do território do estado, é escassamente povoada. Aí, onde ainda vagueiam selvagens — os aimorés ou botocudos — há à margem do São Mateus, apenas, algumas povoações pequenas de aborígenes, hoje, na maioria, miscigenados. São poucos os negros ou índios, sem mestiçagem, que se encontram entre eles; e, pondo de lado os colonos alemães e italianos,[ 10 ] é também muito reduzido o número de brancos puros.
A maior parte da população vive dispersa em unidades familiares ou aldeias minúsculas. Segundo dados oficiais, há no Espírito Santo mais de 200 localidades, entre as quais 12 cidades.[ 11 ] A maior delas, porém, a capital do estado, Vitória, tem pouco mais de 25.000 habitantes. É a maior praça comercial do estado e a sede de algumas casas de negócio importantes. Está sendo modernizada; foi dotada de luz elétrica e de bondes e, conforme mencionamos, grandes instalações portuárias estão em construção. Cachoeiro do Itapemirim, situada à margem do Itapemirim, é a segunda cidade em importância. É o centro comercial do sul. A seguir, vem a cidade de Porto do Cachoeiro de Santa Leopoldina, com 1.200 habitantes; é banhada pelo Santa Maria, que desemboca na baía do Espírito Santo.
3. Produção e comércio
Com a supressão do tráfico negreiro e da escravatura a cultura da cana de açúcar e a do algodão foram sendo suplantadas pela exploração cafeeira.
Em 1863, o relatório do presidente Costa Pereira Júnior dá, sobre o retrocesso da produção açucareira, os seguintes números:[ 12 ]
Exportação de açúcar
1844 | 324.000 arrobas (15 quilos) |
1845 | 226.000 arrobas (15 quilos) |
1852 | 117.000 arrobas (15 quilos) |
1861 | 22.000 arrobas (15 quilos) |
Mas a plantação de café fez grandes progressos. Aliás, essa cultura desenvolveu-se muito noutras regiões brasileiras, no decênio de 1840. Seguem, abaixo, dados sobre a exportação cafeeira do Espírito Santo:
1845 | 32.000 arrobas |
1852 | 95.000 arrobas |
1861 | 224.000 arrobas |
Esse fato parece confirmar a observação — assim se diz no relatório citado — que mais de um viajante fez na América, a de que a cultura do açúcar é, de todos os ramos da economia agrícola, aquela que melhor se ajusta ao trabalho escravo. Sua decadência, a partir da década de 1840, se explica, segundo o relatório, pela proibição, estabelecida anteriormente, do comércio de escravos, que, no momento, passara a ser reprimido com severa vigilância. São, também, apontados como causas a praga de lagarta, que os produtores de açúcar tiveram de enfrentar, e os preços correntes.
Com o povoamento da região alta pelos imigrantes alemães e italianos, a cultura do café passou a ter absoluto predomínio. Ficou demonstrado, nas terras altas, ser o produto de exportação mais lucrativo. Foram exportadas, do Espírito Santo,[ 13 ] em 1894, 1 milhão e 400 mil arrobas de café, ou seja 21 milhões de quilos; em 1912, 3 milhões de arrobas, isto é, 45 milhões de quilos[ 14 ] (só de Vitória, 1 milhão e 900 mil arrobas — 28 milhões de quilos). Uma quantidade minúscula em face da produção total do Brasil de mais de 10 milhões de sacos (600 milhões de quilos)! É de pouco valor a exportação espírito-santense de outros produtos; limita-se à madeira, areia monazítica etc.
Desenvolveu-se, assim, a monocultura, perigosa para o estado, os comerciantes e os grandes produtores, mas não tanto para os colonos, como veremos adiante.
Excetuados alguns reveses isolados, o comércio progrediu muito. Durante o ano de 1863, quando o mil réis valia 27 pence, a situação era a seguinte:
Exterior | Cabotagem | Soma (mil réis) | |
Exportação | 87.000 | 431.000 | 518.000 |
2.000 | 694.000 | 696.000 | 1.214.000 |
A soma da exportação com a importação, levantadas pela estatística, não alcançava, ainda, 3 milhões de marcos; todo o movimento comercial montaria, dificilmente, a mais de 5 milhões.
Segundo o levantamento estatístico de 1911, quando o câmbio estava a 16 pence, o intercâmbio com o exterior se apresentava assim:
Exportação | 24,7 milhões de mil réis |
Importação | 4,8 milhões de mil réis |
Se for acrescentada a exportação para os estados vizinhos, a saída total de mercadorias ultrapassará 25 milhões de mil réis. Admitindo-se que a importação, em virtude de remessas de juros para o exterior etc., oscile entre 20 e 25 milhões de mil réis, poderemos estimar o atual comércio exterior em cerca de 50 milhões de mil réis, ou seja 65 a 70 milhões de marcos, o que representa, para a população, 200 a 250 marcos per capita.
Só no setor de exportação se observa a monocultura; ao lado da exploração cafeeira, há uma extensa produção para satisfazer o consumo interno. Os produtos mais importantes são: tubérculos, feijão, milho, carne, toucinho, queijo e manteiga. A bem dizer, não possuem mercado interno. São produzidos domesticamente. São consumidos pela mesma comunidade minúscula que os produz.
O Espírito Santo, portanto, ainda apresenta estrutura econômica idêntica à dos países novos; isto é, a produção doméstica se liga, estreitamente, àquela destinada à exportação, a economia familiar se entrelaça com a mundial. Observa-se a falta, quase absoluta, do estágio intermediário — a produção para o mercado local e, por conseguinte, do circuito econômico interno.
É o que se revela nos meios de transporte. Uma navegação fluvial e costeira inexpressiva, os muares e os carros de boi são os meios de transporte dentro do estado. Entretanto, o navio de vapor e a linha férrea põem-se em contato com o tráfico internacional. Desde 1910, a cidade de Vitória está ligada, por estrada de ferro, a Niterói, e, por intermédio desta ao Rio de Janeiro. A viagem leva 21 a 22 horas.[ 15 ] A estrada pertence a uma companhia inglesa, a Leopoldina Railway Co. Há pouco tempo, concluindo-se a via férrea que vai de Vitória a Diamantina, vinculando-se, assim, a capital com a rede ferroviária de Minas. O estado possui, ao todo, 550 quilômetros de trilhos. Os navios do Lóide Brasileiro, que navegam, regularmente, entre os portos brasileiros mais importantes, transportam passageiros de Vitória ao Rio, em 24 horas. Vitória, por sua vez, tem contato direto com empórios ultramarinos.
A organização do comércio corresponde a essas condições. Na capital existem apenas algumas casas comerciais importantes, em cujas mãos quase que se concentram exportação e importação; só os comerciantes de Porto do Cachoeiro e de Itapemirim fazem-lhe concorrência. No interior encontram-se inúmeros pequenos comerciantes, os vendeiros, que obtêm os artigos das firmas importadoras, para distribuí-los à população; além disso, compram dos seus fregueses pequenas partidas de café, para entregá-las, posteriormente, a essas firmas. Nota-se, ainda, um comércio ambulante, em decadência, oriundo de Minas, o qual provê o estado, principalmente, de gado, artigos de montaria e fumo.
O crédito desenvolveu-se pouco. Há em Vitória, uma filial do London and River Plate Bank, fundada em 1910. Seus depósitos elevaram-se a mais de 1 milhão de mil réis. Os juros cobrados oscilam entre 9 e 10%, em casos de risco maior, entre 13 e 14. Em 1911, surgiu o Banco Hipotecário e Agrícola Francês.[ 16 ] Do seu capital, cujo valor nominal é de 10 milhões de francos, só foi coberta a décima parte, um milhão, apesar de o estado se ter obrigado a uma garantia de juros de 5%. O Banco colocou em França obrigações de 5%, tipo 81 por 40 milhões de francos. Seus empréstimos se têm destinado, principalmente, a hipotecas e empreendimentos industriais.[ 17 ]
Parece, porém, não ter chegado, ainda, o momento propício ao desenvolvimento industrial, que o estado procura incentivar com isenção de Impostos, doação de terrenos etc. Necessariamente, uma indústria terá sempre de lutar contra os maiores obstáculos, numa economia como a do Espírito Santo, em que é quase nulo o mercado interno, seja de mercadorias ou de trabalho.
4. Política e finanças
O Espírito Santo foi incorporado ao império colonial português como feudo, como capitania.[ 18 ] Foi vendido, várias vezes, pelos respectivos donos, sendo, por fim, comprado pelo próprio rei, em 1718. Este colocou o território sob a direção de funcionários (capitães-mores), subordinados ao governador geral da Bahia. Em 1803, esses funcionários foram substituídos por governadores que, de 1809 em diante, não mais se subordinavam à direção da Bahia de modo que o Espírito Santo se tornou província autônoma. Com a reforma administrativa do Império, foi dotado de ampla autonomia administrativa. Após a queda da monarquia, em 1889, o Brasil, seguindo o modelo estadunidense, transformou-se em federação. O Espírito Santo passou, assim, a ser um estado. É representado, no Congresso Federal, por três senadores e quatro deputados.
A organização do estado é a seguinte:[ 19 ] À frente está o presidente, eleito por um período de 4 anos, por voto direto. Tem extensos poderes. O direito de veto embora não seja absoluto, é bastante amplo. Incumbe-lhe, exclusivamente, a nomeação de funcionários públicos, e pertence-lhe o direito de veto. O presidente pode prorrogar a lei orçamentária, quando o Congresso, por qualquer motivo, não se tenha pronunciado sobre a matéria. O órgão legislativo é o Congresso, formado de uma só câmara; é constituído por 25 deputados; não há senado. O estado é dividido em municípios cujos negócios são geridos por uma câmara municipal, presidida pelo prefeito eleito por escrutínio direto.
No Espírito Santo, apesar de todos os princípios democráticos, governa-se oligarquicamente, como é regra na América do Sul. No fim, apenas algumas famílias dominam o estado. É significativo que os três irmãos do ex-presidente do estado, Jerônimo Monteiro, presidente atual do Congresso, exerçam as seguintes funções: um é o bispo do estado, outro, diretor fiscal do Banco Francês, e o terceiro, senador federal no Rio.
A vida pública não se diferencia do padrão vigorante na América do Sul. A Justiça é influenciável e insegura. Entretanto, se muitos crimes não se punem, uma das causas reside nas péssimas condições de transporte, que limitam, bastante, o poder das autoridades.
Não parece haver muito escrúpulo relativamente às finanças públicas. Lembrarei, a propósito, um trecho do relatório do presidente Monteiro,[ 20 ] em que se acusa o antecessor de ter apresentado, ao passar o governo, como valor da dívida pública, 426.000 mil réis, quando o montante real era de 1.170.000 mil mil réis. É interessante o que se diz no relatório sobre o hábito da gestão passada, de efetuar os pagamentos, com o máximo de impontualidade. Agora, acabou-se com esse sistema odioso e execrando, de submeter funcionários e empreiteiros de obras públicas ao arbítrio de mandantes, que ora os forçavam a deduzir de seus recebimentos, quantias apreciáveis, a favor de intermediários e ora os faziam esperar, indefinidamente, por pagamento, coagindo-os, assim, a se tornarem correligionários políticos ou tirando vinganças abomináveis.[ 21 ]
Quase toda a receita do estado decorre da exportação de café, como se verifica da proposta orçamentária de 1913.
Imposto de exportação | 3,2 milhões de mil réis |
Imposto de selo | 0,6 milhões de mil réis |
Toda colheita malograda e toda queda dos preços do café significam prejuízo imediato para o fisco. Quando o preço do café de 13 a 20 mil réis, em 1896, baixou a 6 a 10, em 1900, e a 5 a 7, em 1904, as receitas do estado diminuíram da seguinte maneira:[ 22 ]
1896 | 5,4 milhões de mil réis |
1900 | 2,9 milhões de mil réis |
1904 | 2,3 milhões de mil réis |
O Tesouro que, em 1894, contraíra dívidas volumosas, ficou em aperturas. Esteve sob ameaça de bancarrota. O crédito do estado evaporou-se. Todavia, um acordo com os credores complacentes evitou a catástrofe. A situação melhorou e as receitas ordinárias elevaram-se, conforme o quadro abaixo:[ 23 ]
1908 | 2,7 milhões de mil réis |
1909 | 2,6 milhões de mil réis |
1910 | 3,1 milhões de mil réis |
1911 | 4,8 milhões de mil réis |
1912 | 5,3 milhões de mil réis |
As dívidas não diminuíram. Em 23 de maio de 1912 importavam em 39,2 milhões de francos, distribuindo-se da seguinte maneira:[ 24 ]
Dívida externa | 29,5 milhões de francos |
Dívida interna | 9,4 milhões de francos |
Dívida flutuante, etc | 0,3 milhões de francos |
Total | 39,2 milhões de francos |
Além das rendas estaduais, devem ser levadas em conta as receitas municipais, que decorrem, principalmente, do imposto de indústria e profissões, cuja incidência mais importante é sobre as casas comerciais.[ 25 ] Em 1911, receitas dos municípios de maior destaque eram:
Vitória | 257.000 mil réis |
Cachoeiro do Itapemirim | 90.000 mil réis |
Santa Leopoldina | 47.000 mil réis |
Santa Teresa | 28.000 mil réis |
Santa Isabel | 21.000 mil réis |
5. Generalidades
As condições políticas e sociais do Espírito Santo parecem demonstrar, em seu conjunto, a ação debilitante do clima tropical. Observa-se, por certo, pujante desenvolvimento em muitos setores da vida econômica. A grande massa da população nativa vive, como dantes, indolentemente, em meio às condições mais rudimentares. Produz pouco para o mercado e contenta-se com um nível de vida baixo; vegeta na anarquia quase completa, vítima da ignorância crassa, prisioneira de superstições infantis e afastada do circulo de influência das forças civilizadoras e, em particular, da autoridade política. Esta, dominada pela incúria e por todas as formas imagináveis de corrupção, embora revestida da pomposa aparência republicana, leva uma existência fantasmagórica e parasitária.
Este triste estado de cousas prefigura o sombrio destino que aguarda os imigrantes alemães, fortes e operosos? A exposição que se segue pretende responder à pergunta.
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NOTAS
[ 1 ] Mapa Topográfico da Província do Espírito Santo — Marques, págs. 59 e segs. — Annuaire du Brèsil, págs. 653 e segs. — Sievers, págs. 207 e segs. — Walle, págs. 1 e segs.
[ 2 ] Handelmann, pág. 441.
[ 3 ] Itapemirim, hoje a praça comercial mais importante do sul, originou-se desse aldeamento.
[ 4 ] Marques, pág. 58.
[ 5 ] Marques, pág. 83.
[ 6 ] Marques, pág. 83.
[ 7 ] Handelmann, pág. 441.
[ 8 ] Rizzelto, pág. 86.
[ 9 ] Annuaire du Brésil, pág. 667, dá 383.569. Não sabemos como foi possível chegar-se a esse número, sem o devido recenseamento.
[ 10 ] O cônsul italiano em Vitória estimou em 35 a 45 mil o número de italianos no Espírito Santo, em 1903. Rizzelto, pág. 89.
[ 11 ] Annuaire du Brésil, pág. 667.
[ 12 ] Págs. 43 e segs.
[ 13 ] Mensagem, de 1895, do presidente Moniz Freire, pág. 8.
[ 14 ] Segundo estimativa de fonte competente.
[ 15 ] Partida pela manhã, de Vitória, às 10 h 15, chegada a Niterói na manhã seguinte, às 7 h 25; ida e volta, três vezes por semana.
[ 16 ] Annuaire du Brésil, pág. 672.
[ 17 ] Balanços do Banco.
[ 18 ] Wappäus, pág. 1.711.
[ 19 ] Constituição Política do Estado do Espírito Santo, Vitória, 1913.
[ 20 ] Monteiro, pág. 22.
[ 21 ] Monteiro, pág. 497.
[ 22 ] Annuaire du Brésil, pág. 669.
[ 23 ] Apud um relatório não publicado do Banco Hipotecário e Agrícola.
[ 24 ] Annuaire du Brésil, pág. 672.
[ 25 ] Regulamento para a cobrança dos impostos municipais. Santa Isabel, Vitória.
Ernst Wagemann (autor) nasceu em 18 de Fevereiro de 1884, em Chañarcillo, Chile, faleceu em 20 de Março de 1956, em Bad Godesberg, Alemanha. Foi economista político e estatístico muito atuante na Alemanha a partir dos anos de 1920. Para mais informações sobre o autor clique aqui.
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1/01/2016
A vida econômica proporcionada pela exploração de sítios não permite considerável desenvolvimento da circulação.
O movimento, entre eles, de mão de obra e de mercadorias é muito pequeno. Conforme já se comprovou, o colono trabalha sem assalariados. O mutirão é quase o único meio pelo qual recebe mão de obra externa. Mesmo pagando-se bem, é difícil conseguir empregados domésticos: a queixa permanente das senhoras dos pastores.
Na planície, a economia monetária progrediu pouco mais que na região alta.
1) A casa é avaliada em 400 a 600 mil réis;
2) o cafezal é estimado de acordo com o preço do café no mercado;
3) por uma quadra (100 x 100 braças = 220 x 220 metros = 4,84 ha) desbravada, dão-se 250 a 300 mil réis. Pasto velho, terra velha, de milho, tem menos valor;
4) por fim, avalia-se a mata disponível e a criação existente. Pode-se, com aproximação, apreçar um sítio normal de 25 ha, com todas as instalações (casa, monjolo, etc.), em 2.500 mil réis, na planície, e em 8.000 mil réis, na região alta.
A título ilustrativo, apresento, abaixo, alguns casos, que chegaram ao meu conhecimento, de venda de terra na comunidade de Santa Joana, na zona baixa, portanto.
A compra da terra é a principal causa das dívidas. A maioria das que foram contraídas pela atual geração vem da última alta do café, que estimulou muito o comércio imobiliário. O vício da embriaguez e inventários têm também sido fatores de endividamento.
Os credores, em regra, são os parentes, os vizinhos, ou outros bons amigos, que fazem o empréstimo por mero favor, sendo raros os casos em que se exige garantia hipotecária. Costuma-se emitir, simplesmente, um título de dívida. Como conseqüência, é freqüente perder o credor o seu dinheiro, sobretudo quando o mutuário morre. Cobram-se juros de 5 a 6% embora sejam habituais, no Brasil, os de 8 a 12. Estipular quaisquer juros considera-se, quase, uma espécie de agiotagem.
Mais comerciais ou, se se quer usar a expressão, mais capitalistas, são as relações com os negociantes, os vendeiros, que naturalmente contam os juros consuetudinários no país. Eles tornam-se credores, em virtude de adiantamentos e, mais freqüentemente, por causa dos fiados, que ano parece terem levado o colono à sujeição, como no Sul.[ 1 ] Os bancos de Vitória não têm nenhum contato com os sitiantes alemães.
Não me é possível dizer com aproximação o total das dívidas dos colonos teutos. Esse montante é, sem dúvida, pequeno. É raro que uma pessoa deva mais de alguns milhares de mil réis; a quantia maior que chegou ao meu conhecimento, foi de 16.000 mil réis.
A venda domina quase todo o comércio na região das colônias. "Die Vende" (do português a venda), como dizem os colonos, é a casa de negócios, onde eles se provêm de todos os bens que o sítio não lhes pode fornecer, e onde eles entregam seus produtos, ou seja o café. As casas comerciais, do mesmo modo que os sítios, estão esparsas, instaladas em encruzilhadas ou caminhos de maior movimento, freqüentemente na proximidade de uma igreja ou capela.
O intercâmbio entre o vendeiro e o colono assume aspectos de troca em espécie: Em regra, o vendeiro não recebe pagamento à vista pela mercadoria que fornece, mas leva-a à conta do colono, que saldará o débito com o café de sua colheita. Mas, nem sempre a contraprestação do colono é bastante, de modo que ele se endivida, o que sucede quando a colheita é má ou os preços do café caem. Esse sistema de fiados é perigoso não só para o colono (vide a seção anterior), mas também para o vendeiro, que assume o risco de o sitiante não lhe trazer produção nenhuma, o qual pode vendê-la noutra parte, embolsando o dinheiro apurado. Dizem que meeiros italianos e brasileiros têm enganado desse modo a negociantes alemães.
Não raro, o vendeiro adianta dinheiro ao freguês, ou serve-lhe de intermediário num pagamento. Assim, torna-se o banqueiro dos colonos. Esporadicamente, colonos têm participado com capital nesse negócio de venda, havendo, nalguns casos, perdido o dinheiro empregado.
Os negociantes mais fortes organizam seu próprio transporte: dispõem de tropas de muares que mantêm, entre as praças, o transporte de mercadorias, sejam elas próprias ou de outros. O dono da venda faz também às vezes de taverneiro; a venda costuma ser o centro social de toda a vizinhança. É também utilizada como estalagem. O vendeiro é a pessoa com quem o colono se aconselha, quando está em dificuldades e apuros. Conforme o caso, tem de desempenhar o papel de intérprete, de conselheiro jurídico e econômico, ou de médico; tem de batizar os filhos dos fregueses e de assumir a tutela, quando morrem os pais. As decisões da comunidade dependem do que se assentou previamente na venda e, muitas vezes, o vendeiro exerce, então, influência decisiva. É freqüente valer sua palavra mais do que a do pastor, que, nas comunidades, corporifica a autoridade mais alta. Às vezes, a paz da comunidade se perturba por haver rivalidade entre os dois.
As vendas, em geral, são empresas minúsculas. O círculo de fregueses de um negociante atingirá, em média, 30 famílias. Já significa muito ter 40 fregueses ou "Fregesen", como dizem os colonos, germanizando a palavra. Mais porém, já conseguiram um pecúlio de 100.000 mil réis ou mais.
Os negociantes menores não têm empregados; além de darem contra de todo o trabalho da vinda, exercem, ainda, certa atividade agrícola; os maiores têm um a três caixeiros, o pessoal da tropa e alguns mensageiros.
As funções que ao vendeiro cabem explicam que se encontrem entre eles diversos alemães do Reich com boa instrução.
Depois dos vendeiros, vêm os negociantes ambulantes, oriundos do estado vizinho, de Minas Gerais, os mineiros. Uns trazem de lá gado de corte, outros, muares e cavalos; muitas vezes, são os próprios fazendeiros que se dedicam a esse negócio. Há os que oferecem fumo, ou selas e arreios, e, nesses casos, é comum ser o próprio produtor que faz o papel de negociante: conduz sua mercadoria em animais de carga, expondo-a e vendendo-a nos lugares de maior movimento.
Esse comércio ambulante, um resquício da antiga vida brasileira, lembra os tempos primitivos do tráfico. Decresce e irá desaparecendo à medida em que forem melhorando as condições de transporte, especialmente com a penetração do trem de ferro.
Por ora, é o muar o meio de transporte mais importante no território das colônias de alemães.
As caravanas ou comboios de bestas carregam as mercadorias. Os colonos chamam essa espécie de caravana de Truppe ou Troppe (do português "tropa"). Ela consiste de vários lotes (Lotts, na língua dos colonos", cada um com um guia, o tropeiro, e dez animais. O chefe de todo o comboio, o arrieiro, tem, entre as suas obrigações, a de ferrar as bestas. Em regra, também faz parte do pessoal um rapazola encarregado da cozinha.
Além das cangalhas e do saco de rações etc., o animal suporta 8 arrobas ou sejam 120 quilos, e em determinados casos, quando não se receia maior peso, 180 quilos, isto é, dois sacos de farinha, de 6 arrobas cada um.
A tropa desloca-se durante 4 a 5 horas por dia, no ritmo de um pedestre andando comodamente, dessa maneira percorrendo, no máximo, 15 a 20 quilômetros. As péssimas estradas e a região montanhosa dificultam a marcha. Com efeito, cada colono é obrigado a manter em ordem o trecho do caminho que passa por sua área. As chuvas copiosas, entretanto, impedem que ele sempre dê conta da tarefa. Indescritível é o estado dos caminhos sob os cuidados de brasileiros. Outro obstáculo ao movimento rápido são as cancelas, destinadas a separar os pastos, que têm de ser, sempre que passa a tropa, abertas e fechadas.
Os tropeiros desencilham as bestas quando chegam a um rancho, uma cobertura sustentada por quatro mourões, um telheiro, cercado por várias estacas onde se amarram os animais. Os ranchos são mantidos, naqueles pontos mais movimentados, por vendeiros ou colonos que os alugam juntamente com um pasto.
Depois de cuidar dos animais, isto é, de desatar as cobertas de couro, deitá-las abaixo, expô-las ao sol, de tirar as cangalhas e de pensar as feridas, o pessoal faz a refeição que um garoto prepara, no rancho, numa panela pendurada de uma armação, feita de improviso, com alguns paus.
Através de um exemplo concreto, podemos ver qual é o custo do transporte por muares:
Uma tropa gasta 9 a 10 dias no percurso de ida e volta entre Figueira à margem do Santa Joana e Porto Cachoeiro; sendo a distância entre os dois lugares, incluindo as voltas, de 80 quilômetros, a tropa faz por mês 6 x 80 quilômetros. Sua manutenção mensal importa nas seguintes despesas:
Deve-se considerar, ainda, que:
1. Geralmente, a remuneração mensal do arrieiro oscila entre 60 e 100 mil réis, a do tropeiro entre 60 a 70, e a do cozinheiro entre 20 e 30.
2. Um muar bem tratado recebe, quotidianamente, 6 a 8 litros de milho. Custando 7 a 10 mil réis um saco de 80 litros desse cereal, não é exagero calcular o consumo diário de milho, de 30 animais, em 16 a 17 mil réis.
3. 1 mil réis de despesa para a alimentação diária de um homem é uma avaliação baixa.
4. Em regra, o aluguel do pasto custa mais de 200 réis por dia e por animal. Por isso, 5 mil réis é pouco para as despesas diárias com esse item.
Vemos, assim, que 1.200 mil réis é o mínimo que uma tropa pode gastar mensalmente. Há, ainda, a amortização e os juros do que se despendeu com a aquisição dos 30 muares e dos respectivos arreios. Essa aquisição importa, pelo menos, em 10.000 mil réis, daí resultando um valor a ser computado mensalmente, de mais de 150 mil réis.
A capacidade de carga de um muar, como já vimos, é de 8 arrobas (120 quilos). As 30 bestas agüentam, por conseguinte, 240 arrobas (3.600 quilos). De acordo com os dados acima apresentados, gastar-se-iam, pelo menos, 1.350 mil réis, com a tropa que fizesse 6 vezes o percurso de 80 quilômetros. Portanto, o transporte de 1.000 quilos a uma distância de 480 quilômetros custaria 375 mil réis, e a uma distância de 1 quilômetro, 0,8 mil réis, ou sejam 1 a 1,5 marcos. A título comparativo, lembremos o que Schmoller (Grundriss II, págs. 13-4) diz sobre o custo de transporte terrestre, por tonelada e quilômetro: "Em 1780 a 1750, podemos avaliá-lo, para as estradas de ferro da Europa Central, em 20 a 80 pfennings. Foville calcula o frete médio das vias férreas francesas, em 1831, em 12,8 pfennings; em 1865, 4,8; em 1877, 4,7. Segundo Engel, o frete médio, na Alemanha, seria, em 1844, 15 pfennings, e em 1860, 7,3; e conforme Cohn, 5,9 pfennings, em 1872, e 4,9 em 1877. Presentemente (1898-1900), na Europa Ocidental, o valor médio está entre 3,6 e 2,4, e, para transporte de grandes quantidades, longas distâncias, com tarifas excepcionais, entre 2,2 a 1,2 pfennings."
Para o transporte de Figueira a Porto do Cachoeiro costuma-se pagar 1 mil réis por arroba (6 2/3 mil réis por quintal métrico).[ 2 ] Com o pleno emprego da tropa conseguir-se-ia uma receita bruta de 240 x 6, isto é, 1.440 mil réis por mês. É difícil atingir esse total, porque, na volta, em geral, é menor a importância que se apura com a carga. Pode-se, portanto afirmar, esposando um princípio assentado na experiência dos vendeiros: a tropa não paga a pena. Só se aufere um ganho maior, em virtude de serem menores as despesas, quando o transporte é uma atividade independente, quando, por conseguinte, o arrieiro é, ao mesmo tempo, o empresário (o que sucede multas vezes, sendo, na maioria, mineiros os que se dedicam a esse negócio).
É raro que se estabeleçam relações diretas entre vendeiros e o mercado internacional, e quando tal sucede, esse contato é de importância limitada. Em regra, adquirem suas mercadorias de uma firma que as recebe do estrangeiro ou de outra casa comercial importadora. Os vendeiros também não colocam diretamente no mercado externo o café exportado.
Vitória e Porto do Cachoeiro são os pórticos, através dos quais o território das colônias de alemães põe-se em contato com o tráfico mundial.
As casas comerciais importantes de Vitória são as seguintes:
Está concentrado em mãos dessas firmas todo o comércio de café da região setentrional do Estado, de modo que elas também dominam toda a exportação do café produzido pelos colonos teutos. Elas se ocupam, simultaneamente, de todos os ramos da importação. Relacionam-se, diretamente, com alguns dos vendeiros mais fortes do interior, mas, na maioria dos casos, utilizam como intermediários os comerciantes de Porto do Cachoeiro. Estes são, por assim dizer, comerciantes de segunda classe, embora haja, entre eles, violações a essa categoria com freqüentes importações diretas do estrangeiro. Alguns deles operam com um capital de várias centenas de contos. Na maior parte, são de origem alemã. Com os seus negócios, estão colocados entre a venda e a casa comercial de primeira classe, exercendo intenso varejo e mantendo tropas para o transporte no interior.
O rio Santa Maria, exclusivamente, leva as mercadorias a Vitória; está fora de cogitações a estrada de ferro que percorre, apenas, metade do caminho. O transporte de um saco de 60 quilos, de Porto do Cachoeiro a Vitória, custa:
Se o frete de 60 quilos importa em 800 réis, o de uma tonelada é de 13 ½ mil réis. Sendo de, aproximadamente, 30 quilômetros, a distância coberta pelo frete, deduziremos para a tonelada-quilômetro, a tarifa de 444 réis, pouco mais de meio marco, portanto.
O café segue de Vitória, sem passar pelo Rio de Janeiro, diretamente para os grandes empórios internacionais. As 469.000 sacas de café, embarcadas em 1912, em Vitória, vão discriminadas, abaixo, segundo o porto de destino:
O lugar influencia a cotação do café. Assim, em 6 de outubro de 1913, para quinze quilos, verificou-se, em Vitória, o preço de 7s 6d; no Rio de Janeiro, 8s 8d. A diferença vai, portanto, a mais de 1s.
Geralmente, o preço da arroba, em Porto do Cachoeiro, é 300 réis menos do que em Vitória; essa divergência corresponde ao frete, que, como já verificamos, é cerca de 250 réis, por arroba. O preço do café, no sítio, desce, em média, 500 réis mais.
No mercado mundial, o café de Santos alcança, em geral, maiores preços que o de Vitória: aproximadamente, 5% mais, nos Estados Unidos, e 10%, em Hamburgo, o que se explica, facilmente, por ser o café, no Espírito Santo, explorado em pequenas empresas, e beneficiado por processos primitivos, enquanto em São Paulo domina a grande empresa, tecnicamente melhor aparelhada, de modo que lá se obtém um produto mais uniforme.
O café em Vitória é classificado em claro e escuro. O claro usufrui preços um pouco mais altos, em virtude do sabor agradável e suave.
Como já vimos, recai na exportação do café um imposto ad valorem (vide "Introdução"). Semanalmente, determina-se, no Rio de Janeiro, a importância do tributo a pagar, e telegrafa-se para Vitória, informando o valor.
Os preços dos artigos importados do estrangeiro e dos estados meridionais do Brasil são muito altos, em virtude das condições desfavoráveis de transporte e da organização primitiva do comércio; também atuam, nesse sentido, os elevados direitos de importação e o sistema monetário. As mercadorias produzidas no Espírito Santo e em Minas Gerais, para o mercado interno, não são tão baratas, quanto se podia esperar numa região de economia predominantemente fechada.
Uma causa desse fenômeno me parece ser o fato de o dinheiro servir, essencialmente, para comprar bens de importação, de ter, como papel principal, o de funcionar como uma ordem de pagamento a mercadorias de fora; uma vez que os preços dessas são muito altos, que o poder aquisitivo da moeda é bem reduzido relativamente aos produtos importados, explica-se, de um ângulo puramente psicológico, é claro, que o poder de compra da moeda seja também pequeno para as mercadorias produzidas na região.
A tabela, abaixo, apresenta uma relação dos preços mais importantes que se verificaram, em 1913:
A atividade dos artífices representa uma violação à economia fechada, os quais, entretanto, exploram, simultaneamente, um sítio, daí obtendo algo para suas necessidades vitais. São poucos os ofícios exercidos.
Em primeiro lugar vem a selaria, de especial importância numa região onde o mais pobre agricultor tem o seu cavalo e se fazem todas as viagens no lombo dos animais. A profissão de sapateiro se associa, geralmente, à do seleiro; a necessidade de calçados é pequena, porque os garotos andam descalços, e os adultos não se calçam para trabalhar, usando calçados, apenas, nas festas, ou quando muito, ainda, para cavalgar. As outras profissões exercidas são as de ferreiro e funileiro.
Procurar-se-iam, inutilmente, o alfaiate, o padeiro, o carniceiro e o moleiro. A farinha é importada, e as atividades de açougueiro, padeiro e alfaiate pertencem à economia doméstica. O marceneiro é dispensável, pois os móveis são feitos em casa ou importados. Há alguns marceneiros, assalariados, isto é, que trabalham em casa dos fregueses.
Cabe aqui lembrar as indústrias de cervejaria e de aguardente. Naturalmente, trata-se de empresas minúsculas. Na zona baixa, encontram-se mesmo farmácias, o que se explica pela necessidade de remédios, da população nativa, altamente acessível às superstições e curanderias.
A circulação das riquezas, no Espírito Santo, está tão pouco desenvolvida que só de leve toca a vida dos colonos.
Uma queda dos preços do café que pode ser funesta para o estado e para a população citadina, tem, como já se assinalou, pouca repercussão sobre o colono. No máximo, obrigá-lo-ia a restringir a satisfação do que para ele representa luxo.
Uma parte, e só uma pequena parte, dos mantimentos que adquire fora pode ser considerada imprescindível. A roupa exige pequenas despesas, embora os preços das fazendas compradas para a sua confecção sejam proporcionalmente altos. É o que nos mostra o orçamento doméstico, que passaremos a examinar.
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(para visualizar o sumário completo do texto clique aqui ) Capítulo VI — A circulação 1. Generalidades A vida econômica propor...
A colonização alemã no Espírito Santo - Segunda parte: O trabalho (VI)
(para visualizar o sumário completo do texto clique aqui)
Capítulo VI — A circulação
1. Generalidades
A vida econômica proporcionada pela exploração de sítios não permite considerável desenvolvimento da circulação.
O movimento, entre eles, de mão de obra e de mercadorias é muito pequeno. Conforme já se comprovou, o colono trabalha sem assalariados. O mutirão é quase o único meio pelo qual recebe mão de obra externa. Mesmo pagando-se bem, é difícil conseguir empregados domésticos: a queixa permanente das senhoras dos pastores.
Na planície, a economia monetária progrediu pouco mais que na região alta.
1) A casa é avaliada em 400 a 600 mil réis;
2) o cafezal é estimado de acordo com o preço do café no mercado;
3) por uma quadra (100 x 100 braças = 220 x 220 metros = 4,84 ha) desbravada, dão-se 250 a 300 mil réis. Pasto velho, terra velha, de milho, tem menos valor;
4) por fim, avalia-se a mata disponível e a criação existente. Pode-se, com aproximação, apreçar um sítio normal de 25 ha, com todas as instalações (casa, monjolo, etc.), em 2.500 mil réis, na planície, e em 8.000 mil réis, na região alta.
A título ilustrativo, apresento, abaixo, alguns casos, que chegaram ao meu conhecimento, de venda de terra na comunidade de Santa Joana, na zona baixa, portanto.
Ano | Tamanho do sítio (ha) | Colheita anual do café em arrobas | Preço (mil réis) | Particularidades |
1911 | 50 | 300 | 5.000 | — |
1912 | 50 | 30 | 5.600 | Boa mata, bom pasto, cultura de arroz e cana de açúcar. |
1912 | 100 | 250 | 16.000 | Com 40 cabeças de gado e 40 porcos. |
1912 | 100 | pequena | 4.400 | Com construções insuficientes, porém mata muito boa. |
1913 | 50 | 70 | 3.800 | — |
3. Dívidas
A compra da terra é a principal causa das dívidas. A maioria das que foram contraídas pela atual geração vem da última alta do café, que estimulou muito o comércio imobiliário. O vício da embriaguez e inventários têm também sido fatores de endividamento.
Os credores, em regra, são os parentes, os vizinhos, ou outros bons amigos, que fazem o empréstimo por mero favor, sendo raros os casos em que se exige garantia hipotecária. Costuma-se emitir, simplesmente, um título de dívida. Como conseqüência, é freqüente perder o credor o seu dinheiro, sobretudo quando o mutuário morre. Cobram-se juros de 5 a 6% embora sejam habituais, no Brasil, os de 8 a 12. Estipular quaisquer juros considera-se, quase, uma espécie de agiotagem.
Mais comerciais ou, se se quer usar a expressão, mais capitalistas, são as relações com os negociantes, os vendeiros, que naturalmente contam os juros consuetudinários no país. Eles tornam-se credores, em virtude de adiantamentos e, mais freqüentemente, por causa dos fiados, que ano parece terem levado o colono à sujeição, como no Sul.[ 1 ] Os bancos de Vitória não têm nenhum contato com os sitiantes alemães.
Não me é possível dizer com aproximação o total das dívidas dos colonos teutos. Esse montante é, sem dúvida, pequeno. É raro que uma pessoa deva mais de alguns milhares de mil réis; a quantia maior que chegou ao meu conhecimento, foi de 16.000 mil réis.
4. A venda e o vendeiro
A venda domina quase todo o comércio na região das colônias. "Die Vende" (do português a venda), como dizem os colonos, é a casa de negócios, onde eles se provêm de todos os bens que o sítio não lhes pode fornecer, e onde eles entregam seus produtos, ou seja o café. As casas comerciais, do mesmo modo que os sítios, estão esparsas, instaladas em encruzilhadas ou caminhos de maior movimento, freqüentemente na proximidade de uma igreja ou capela.
O intercâmbio entre o vendeiro e o colono assume aspectos de troca em espécie: Em regra, o vendeiro não recebe pagamento à vista pela mercadoria que fornece, mas leva-a à conta do colono, que saldará o débito com o café de sua colheita. Mas, nem sempre a contraprestação do colono é bastante, de modo que ele se endivida, o que sucede quando a colheita é má ou os preços do café caem. Esse sistema de fiados é perigoso não só para o colono (vide a seção anterior), mas também para o vendeiro, que assume o risco de o sitiante não lhe trazer produção nenhuma, o qual pode vendê-la noutra parte, embolsando o dinheiro apurado. Dizem que meeiros italianos e brasileiros têm enganado desse modo a negociantes alemães.
Não raro, o vendeiro adianta dinheiro ao freguês, ou serve-lhe de intermediário num pagamento. Assim, torna-se o banqueiro dos colonos. Esporadicamente, colonos têm participado com capital nesse negócio de venda, havendo, nalguns casos, perdido o dinheiro empregado.
Os negociantes mais fortes organizam seu próprio transporte: dispõem de tropas de muares que mantêm, entre as praças, o transporte de mercadorias, sejam elas próprias ou de outros. O dono da venda faz também às vezes de taverneiro; a venda costuma ser o centro social de toda a vizinhança. É também utilizada como estalagem. O vendeiro é a pessoa com quem o colono se aconselha, quando está em dificuldades e apuros. Conforme o caso, tem de desempenhar o papel de intérprete, de conselheiro jurídico e econômico, ou de médico; tem de batizar os filhos dos fregueses e de assumir a tutela, quando morrem os pais. As decisões da comunidade dependem do que se assentou previamente na venda e, muitas vezes, o vendeiro exerce, então, influência decisiva. É freqüente valer sua palavra mais do que a do pastor, que, nas comunidades, corporifica a autoridade mais alta. Às vezes, a paz da comunidade se perturba por haver rivalidade entre os dois.
As vendas, em geral, são empresas minúsculas. O círculo de fregueses de um negociante atingirá, em média, 30 famílias. Já significa muito ter 40 fregueses ou "Fregesen", como dizem os colonos, germanizando a palavra. Mais porém, já conseguiram um pecúlio de 100.000 mil réis ou mais.
Os negociantes menores não têm empregados; além de darem contra de todo o trabalho da vinda, exercem, ainda, certa atividade agrícola; os maiores têm um a três caixeiros, o pessoal da tropa e alguns mensageiros.
As funções que ao vendeiro cabem explicam que se encontrem entre eles diversos alemães do Reich com boa instrução.
5. O comércio ambulante
Depois dos vendeiros, vêm os negociantes ambulantes, oriundos do estado vizinho, de Minas Gerais, os mineiros. Uns trazem de lá gado de corte, outros, muares e cavalos; muitas vezes, são os próprios fazendeiros que se dedicam a esse negócio. Há os que oferecem fumo, ou selas e arreios, e, nesses casos, é comum ser o próprio produtor que faz o papel de negociante: conduz sua mercadoria em animais de carga, expondo-a e vendendo-a nos lugares de maior movimento.
Esse comércio ambulante, um resquício da antiga vida brasileira, lembra os tempos primitivos do tráfico. Decresce e irá desaparecendo à medida em que forem melhorando as condições de transporte, especialmente com a penetração do trem de ferro.
6. A tropa
Por ora, é o muar o meio de transporte mais importante no território das colônias de alemães.
As caravanas ou comboios de bestas carregam as mercadorias. Os colonos chamam essa espécie de caravana de Truppe ou Troppe (do português "tropa"). Ela consiste de vários lotes (Lotts, na língua dos colonos", cada um com um guia, o tropeiro, e dez animais. O chefe de todo o comboio, o arrieiro, tem, entre as suas obrigações, a de ferrar as bestas. Em regra, também faz parte do pessoal um rapazola encarregado da cozinha.
Além das cangalhas e do saco de rações etc., o animal suporta 8 arrobas ou sejam 120 quilos, e em determinados casos, quando não se receia maior peso, 180 quilos, isto é, dois sacos de farinha, de 6 arrobas cada um.
A tropa desloca-se durante 4 a 5 horas por dia, no ritmo de um pedestre andando comodamente, dessa maneira percorrendo, no máximo, 15 a 20 quilômetros. As péssimas estradas e a região montanhosa dificultam a marcha. Com efeito, cada colono é obrigado a manter em ordem o trecho do caminho que passa por sua área. As chuvas copiosas, entretanto, impedem que ele sempre dê conta da tarefa. Indescritível é o estado dos caminhos sob os cuidados de brasileiros. Outro obstáculo ao movimento rápido são as cancelas, destinadas a separar os pastos, que têm de ser, sempre que passa a tropa, abertas e fechadas.
Os tropeiros desencilham as bestas quando chegam a um rancho, uma cobertura sustentada por quatro mourões, um telheiro, cercado por várias estacas onde se amarram os animais. Os ranchos são mantidos, naqueles pontos mais movimentados, por vendeiros ou colonos que os alugam juntamente com um pasto.
Depois de cuidar dos animais, isto é, de desatar as cobertas de couro, deitá-las abaixo, expô-las ao sol, de tirar as cangalhas e de pensar as feridas, o pessoal faz a refeição que um garoto prepara, no rancho, numa panela pendurada de uma armação, feita de improviso, com alguns paus.
Através de um exemplo concreto, podemos ver qual é o custo do transporte por muares:
Uma tropa gasta 9 a 10 dias no percurso de ida e volta entre Figueira à margem do Santa Joana e Porto Cachoeiro; sendo a distância entre os dois lugares, incluindo as voltas, de 80 quilômetros, a tropa faz por mês 6 x 80 quilômetros. Sua manutenção mensal importa nas seguintes despesas:
Ordenado do arrieiro | 80 mil réis |
Ordenado dos três tropeiros | 200 mil réis |
Ordenado do cozinheiro | 20 mil réis |
Alimentação do pessoal | 150 mil réis |
Milho para os muares | 500 mil réis |
Aluguel de pastos | 150 mil réis |
Ferraduras | 100 mil réis |
Total | 1.200 mil réis |
Deve-se considerar, ainda, que:
1. Geralmente, a remuneração mensal do arrieiro oscila entre 60 e 100 mil réis, a do tropeiro entre 60 a 70, e a do cozinheiro entre 20 e 30.
2. Um muar bem tratado recebe, quotidianamente, 6 a 8 litros de milho. Custando 7 a 10 mil réis um saco de 80 litros desse cereal, não é exagero calcular o consumo diário de milho, de 30 animais, em 16 a 17 mil réis.
3. 1 mil réis de despesa para a alimentação diária de um homem é uma avaliação baixa.
4. Em regra, o aluguel do pasto custa mais de 200 réis por dia e por animal. Por isso, 5 mil réis é pouco para as despesas diárias com esse item.
Vemos, assim, que 1.200 mil réis é o mínimo que uma tropa pode gastar mensalmente. Há, ainda, a amortização e os juros do que se despendeu com a aquisição dos 30 muares e dos respectivos arreios. Essa aquisição importa, pelo menos, em 10.000 mil réis, daí resultando um valor a ser computado mensalmente, de mais de 150 mil réis.
A capacidade de carga de um muar, como já vimos, é de 8 arrobas (120 quilos). As 30 bestas agüentam, por conseguinte, 240 arrobas (3.600 quilos). De acordo com os dados acima apresentados, gastar-se-iam, pelo menos, 1.350 mil réis, com a tropa que fizesse 6 vezes o percurso de 80 quilômetros. Portanto, o transporte de 1.000 quilos a uma distância de 480 quilômetros custaria 375 mil réis, e a uma distância de 1 quilômetro, 0,8 mil réis, ou sejam 1 a 1,5 marcos. A título comparativo, lembremos o que Schmoller (Grundriss II, págs. 13-4) diz sobre o custo de transporte terrestre, por tonelada e quilômetro: "Em 1780 a 1750, podemos avaliá-lo, para as estradas de ferro da Europa Central, em 20 a 80 pfennings. Foville calcula o frete médio das vias férreas francesas, em 1831, em 12,8 pfennings; em 1865, 4,8; em 1877, 4,7. Segundo Engel, o frete médio, na Alemanha, seria, em 1844, 15 pfennings, e em 1860, 7,3; e conforme Cohn, 5,9 pfennings, em 1872, e 4,9 em 1877. Presentemente (1898-1900), na Europa Ocidental, o valor médio está entre 3,6 e 2,4, e, para transporte de grandes quantidades, longas distâncias, com tarifas excepcionais, entre 2,2 a 1,2 pfennings."
Para o transporte de Figueira a Porto do Cachoeiro costuma-se pagar 1 mil réis por arroba (6 2/3 mil réis por quintal métrico).[ 2 ] Com o pleno emprego da tropa conseguir-se-ia uma receita bruta de 240 x 6, isto é, 1.440 mil réis por mês. É difícil atingir esse total, porque, na volta, em geral, é menor a importância que se apura com a carga. Pode-se, portanto afirmar, esposando um princípio assentado na experiência dos vendeiros: a tropa não paga a pena. Só se aufere um ganho maior, em virtude de serem menores as despesas, quando o transporte é uma atividade independente, quando, por conseguinte, o arrieiro é, ao mesmo tempo, o empresário (o que sucede multas vezes, sendo, na maioria, mineiros os que se dedicam a esse negócio).
7. As casas comerciais de Vitória e Porto do Cachoeiro
É raro que se estabeleçam relações diretas entre vendeiros e o mercado internacional, e quando tal sucede, esse contato é de importância limitada. Em regra, adquirem suas mercadorias de uma firma que as recebe do estrangeiro ou de outra casa comercial importadora. Os vendeiros também não colocam diretamente no mercado externo o café exportado.
Vitória e Porto do Cachoeiro são os pórticos, através dos quais o território das colônias de alemães põe-se em contato com o tráfico mundial.
As casas comerciais importantes de Vitória são as seguintes:
Nome | Nacionalidade | Exportação de café em 1912 (saco de 60 quilos) |
Companhia Comercial | belgo-alemã | 117.726 |
Hard Rand & Cia. | americana | 116.925 |
Arbuckle & Cia. | americana | 20.500 |
Cruz Duarte & Cia. | luso-brasileira | 152.189 |
A. Prado & Cia. | brasileira | 28.060 |
Cooperativas | atualmente em quebra | 33.459 |
Total | — | 468.859 |
Está concentrado em mãos dessas firmas todo o comércio de café da região setentrional do Estado, de modo que elas também dominam toda a exportação do café produzido pelos colonos teutos. Elas se ocupam, simultaneamente, de todos os ramos da importação. Relacionam-se, diretamente, com alguns dos vendeiros mais fortes do interior, mas, na maioria dos casos, utilizam como intermediários os comerciantes de Porto do Cachoeiro. Estes são, por assim dizer, comerciantes de segunda classe, embora haja, entre eles, violações a essa categoria com freqüentes importações diretas do estrangeiro. Alguns deles operam com um capital de várias centenas de contos. Na maior parte, são de origem alemã. Com os seus negócios, estão colocados entre a venda e a casa comercial de primeira classe, exercendo intenso varejo e mantendo tropas para o transporte no interior.
O rio Santa Maria, exclusivamente, leva as mercadorias a Vitória; está fora de cogitações a estrada de ferro que percorre, apenas, metade do caminho. O transporte de um saco de 60 quilos, de Porto do Cachoeiro a Vitória, custa:
Frete | 800 réis |
Tributo | 100 réis |
Pequenas despesas | 100 réis |
Total | 1.000 réis |
Se o frete de 60 quilos importa em 800 réis, o de uma tonelada é de 13 ½ mil réis. Sendo de, aproximadamente, 30 quilômetros, a distância coberta pelo frete, deduziremos para a tonelada-quilômetro, a tarifa de 444 réis, pouco mais de meio marco, portanto.
8. O comércio de café
O café segue de Vitória, sem passar pelo Rio de Janeiro, diretamente para os grandes empórios internacionais. As 469.000 sacas de café, embarcadas em 1912, em Vitória, vão discriminadas, abaixo, segundo o porto de destino:
Nova Orleans | 301.725 |
Nova York | 102.589 |
Hamburgo | 12.176 |
Trieste | 8.500 |
Antuérpia | 5.150 |
Rio de Janeiro | 35.659 |
O lugar influencia a cotação do café. Assim, em 6 de outubro de 1913, para quinze quilos, verificou-se, em Vitória, o preço de 7s 6d; no Rio de Janeiro, 8s 8d. A diferença vai, portanto, a mais de 1s.
Geralmente, o preço da arroba, em Porto do Cachoeiro, é 300 réis menos do que em Vitória; essa divergência corresponde ao frete, que, como já verificamos, é cerca de 250 réis, por arroba. O preço do café, no sítio, desce, em média, 500 réis mais.
No mercado mundial, o café de Santos alcança, em geral, maiores preços que o de Vitória: aproximadamente, 5% mais, nos Estados Unidos, e 10%, em Hamburgo, o que se explica, facilmente, por ser o café, no Espírito Santo, explorado em pequenas empresas, e beneficiado por processos primitivos, enquanto em São Paulo domina a grande empresa, tecnicamente melhor aparelhada, de modo que lá se obtém um produto mais uniforme.
O café em Vitória é classificado em claro e escuro. O claro usufrui preços um pouco mais altos, em virtude do sabor agradável e suave.
Como já vimos, recai na exportação do café um imposto ad valorem (vide "Introdução"). Semanalmente, determina-se, no Rio de Janeiro, a importância do tributo a pagar, e telegrafa-se para Vitória, informando o valor.
9. Os preços das mercadorias importadas e das produzidas no Estado
Os preços dos artigos importados do estrangeiro e dos estados meridionais do Brasil são muito altos, em virtude das condições desfavoráveis de transporte e da organização primitiva do comércio; também atuam, nesse sentido, os elevados direitos de importação e o sistema monetário. As mercadorias produzidas no Espírito Santo e em Minas Gerais, para o mercado interno, não são tão baratas, quanto se podia esperar numa região de economia predominantemente fechada.
Uma causa desse fenômeno me parece ser o fato de o dinheiro servir, essencialmente, para comprar bens de importação, de ter, como papel principal, o de funcionar como uma ordem de pagamento a mercadorias de fora; uma vez que os preços dessas são muito altos, que o poder aquisitivo da moeda é bem reduzido relativamente aos produtos importados, explica-se, de um ângulo puramente psicológico, é claro, que o poder de compra da moeda seja também pequeno para as mercadorias produzidas na região.
A tabela, abaixo, apresenta uma relação dos preços mais importantes que se verificaram, em 1913:
Víveres | Quantum | Porto do Cachoeiro | Preços em mil réis | |
Campinho | Jequitibá | |||
Artigos de importação | ||||
Carne seca | 1 kg | 1,2 | 1,3 | 1,4 |
Farinha de trigo | 45 kg | 13 | 13,5 | 14-14,5 |
Arroz | 10 l | 4 | 4,5 | 5 |
Açúcar refinado | 1 arroba | 9 | — | 11,050 |
Sal grosso | 1 kg | 0,1 | — | — |
Cevadinha | 1 kg | — | — | 2,5 |
Sagu | 1 kg | — | — | 1,8 |
Cerveja | 1 garrafa | 43 | — | 47 |
Vinho (vinho tinto português) | 50 l | 43 | — | 47 |
Produtos do Estado | ||||
Ovos | 2 dúzias | — | — | 1 |
Manteiga | 1 kg | — | — | 2,5 |
Banha | 1 kg | — | — | 1,2 |
Feijão | 10 l | — | — | 3 |
Batatas | 1 arroba | — | — | 5 |
Carne de vaca | 1 arroba | — | — | 7 |
Carne de porco | 1 arroba | — | — | 12 |
Milho | 80 l | 7-9 | — | 8-10 |
Outras mercadorias importadas | Quantum | Porto do Cachoeiro | Preços em mil réis | |
Campinho | Jequitibá | |||
Querosene | 40 l | 18 | 20 | 2,1 |
Fósforos | 10 caixas | — | — | 0,6 |
Sabão | 1 kg | 0,7 | — | — |
Morim | 20 m | — | — | 16 |
Chita | 1 m | — | — | 0,9 |
1 cafeteira simples | — | — | — | 5 |
1 balde pequeno, branco esmaltado | — | — | — | 6 |
1 candeeiro de cozinha | — | — | — | 5 |
Ferraduras | 60 | 16 | — | — |
6 cadeiras simples | — | — | — | 75 |
Cimento | 60 kg | 8,5 | — | — |
1 enxada | — | 2-3 | — | — |
10. Os artesãos
A atividade dos artífices representa uma violação à economia fechada, os quais, entretanto, exploram, simultaneamente, um sítio, daí obtendo algo para suas necessidades vitais. São poucos os ofícios exercidos.
Em primeiro lugar vem a selaria, de especial importância numa região onde o mais pobre agricultor tem o seu cavalo e se fazem todas as viagens no lombo dos animais. A profissão de sapateiro se associa, geralmente, à do seleiro; a necessidade de calçados é pequena, porque os garotos andam descalços, e os adultos não se calçam para trabalhar, usando calçados, apenas, nas festas, ou quando muito, ainda, para cavalgar. As outras profissões exercidas são as de ferreiro e funileiro.
Procurar-se-iam, inutilmente, o alfaiate, o padeiro, o carniceiro e o moleiro. A farinha é importada, e as atividades de açougueiro, padeiro e alfaiate pertencem à economia doméstica. O marceneiro é dispensável, pois os móveis são feitos em casa ou importados. Há alguns marceneiros, assalariados, isto é, que trabalham em casa dos fregueses.
Cabe aqui lembrar as indústrias de cervejaria e de aguardente. Naturalmente, trata-se de empresas minúsculas. Na zona baixa, encontram-se mesmo farmácias, o que se explica pela necessidade de remédios, da população nativa, altamente acessível às superstições e curanderias.
11. Observações finais
A circulação das riquezas, no Espírito Santo, está tão pouco desenvolvida que só de leve toca a vida dos colonos.
Uma queda dos preços do café que pode ser funesta para o estado e para a população citadina, tem, como já se assinalou, pouca repercussão sobre o colono. No máximo, obrigá-lo-ia a restringir a satisfação do que para ele representa luxo.
Uma parte, e só uma pequena parte, dos mantimentos que adquire fora pode ser considerada imprescindível. A roupa exige pequenas despesas, embora os preços das fazendas compradas para a sua confecção sejam proporcionalmente altos. É o que nos mostra o orçamento doméstico, que passaremos a examinar.
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NOTAS
[ 1 ] Lacmann, págs. 71 e seguintes.
[ 2 ] O frete de 8 arrobas (a carga de um burro), de Santa Teresa a Porto do Cachoeiro (20 quilômetros), é de 4 a 6 mil réis; o frete de volta é mais barato. Calculam-se, com freqüência, 3 mil réis por dia e por burro, pelo menos em viagens mais curtas.
Ernst Wagemann (autor) nasceu em 18 de Fevereiro de 1884, em Chañarcillo, Chile, faleceu em 20 de Março de 1956, em Bad Godesberg, Alemanha. Foi economista político e estatístico muito atuante na Alemanha a partir dos anos de 1920. Para mais informações sobre o autor clique aqui.
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1/01/2016
Acoima-se de cultura exaustiva o sistema de exploração agrícola dos colonos teutos. Julgado por um critério europeu, é um sistema condenável. Não se aduba o terreno, que se exaure, em virtude da lavoura de longos anos, dos elementos nutritivos; as colheitas diminuem, e chega o momento em que não vale mais a pena cultivá-lo. É o que sucede, depois de decorrer um período que oscila entre 15 a 40 anos, dependendo da natureza do terreno e dos processos de cultura. Chegando ao termo da fecundidade útil da terra, o colono é obrigado a abandonar a casa e o sítio, indo estabelecer-se noutro lugar.
Na Europa, o valor do terreno forçaria o investimento de mais capital (adubos etc.) e maior emprego de mão de obra. No Espírito Santo, porém, encontram-se áreas para a lavoura, em quantidade quase ilimitada, e o desbravamento será, talvez, mais rendoso que o amanho intensivo de velho sítio. De qualquer modo, é um simples problema aritmético, verificar, em cada caso, se é e quando é conveniente abandonar uma velha roça e organizar uma nova. Naturalmente, o colono nem sempre estará habilitado a agir de acordo com o princípio hedonístico. A escassez de capital, a falta de conhecimento e de formação técnica dificultam-lhe passar a uma cultura intensiva, mesmo na hipótese de esta convir.
O sistema de cultura exaustiva corresponde, de modo geral, às condições atuais da circulação, da técnica e do crédito. Justifica-se em face do axioma que afirma não existir emprego de capital e de trabalho onde se oferecem gratuitamente os recursos naturais; esse princípio, cuja evidência dispensa demonstração, fundamenta, do ângulo puramente econômico, esse processo de exploração agrícola. Mas tal processo reduz o colono a semi-nômade, condenando-o a um nível de vida primitivo e à retrogradação cultural.
O mais grave é a influência desagregadora que exerce sobre a vida interna da comunidade, que assenta sobre uma base territorial. Em Santa Leopoldina, os efeitos já se mostraram claros. Há trinta anos, tinha Santa Leopoldina 300 famílias; desde então, foi perdendo tantos membros, por emigrarem, que, atualmente só possui 150, apesar do intenso crescimento natural da população. Que perdas em valores culturais significa a decadência de um organismo social, morrendo aos poucos, cuja criação custou várias décadas de trabalho! Com a dissolução de uma comunidade, não se destroem, apenas, inumeráveis valores sentimentais; também valores sociais, os mais tangíveis, como o ensino, são prejudicados.
A gravidade dessas perdas amplia-se com o deslocamento crescente dos novos sítios para a zona baixa, dotada de bons terrenos, é verdade, mas onde o clima é menos favorável e se faz sentir mais poderosa a influência brasileira.
Estabelece-se, assim, uma cadeia inexorável: A cultura exaustiva leva à emigração, à dissolvência das velhas comunidades, ao enfraquecimento do espirito germânico e, talvez, ao declínio cultural e econômico do colono.
Além da cultura exaustiva, há outra peculiaridade da economia agrícola dos colonos, que pesa desfavoravelmente — a monocultura, aliás, como já vimos, fator marcante de toda a estrutura econômica do estado. O Espírito Santo quase só exporta café e a produção para o mercado interno se limita a poucas mercadorias; daí podermos falar em monocultura, mas sem tomar a palavra em seu sentido exato. Essa situação geral não cria muitos embaraços ao colono, cujas atividades se desenrolam numa economia predominantemente fechada. Quando minguam os resultados da cultura do café em virtude de más colheitas ou de queda de preços, ele tem, apenas, de reduzir a satisfação do que para ele representa superfluidades. Compreende-se que não se tenha esforçado em achar outras culturas de exportação; demais, a cultura do café é um ramo de produção muito cômodo. Com efeito, a plantação de um cafezal requer trabalho árduo e cuidados, mas o trato cultural posterior, a colheita e o beneficiamento exigem pouco labor. Não há dúvida de que essa unilateralidade paralisa o progresso econômico e aprisiona o colono no círculo de uma economia doméstica, submetendo-o a condições de pobre, embora com bem-estar. É ainda questão a discutir, saber quais as culturas que deveriam ser desenvolvidas no Espírito Santo. De qualquer modo, elevar a produção para o consumo interno poderia ser o primeiro passo; fumo, arroz, gado, etc. não precisava serem importados. Mas, o principal seria achar novos produtos para exportação.
Parece existirem, no Espírito Santo, vários lugares que oferecem condições favoráveis ao desenvolvimento do cacau. Fazendeiros brasileiros já tentaram introduzi-lo. Entretanto, não houve, até o momento, resultados comerciais apreciáveis. Os únicos mercados, atualmente, são Bahia e Rio de Janeiro; os custos de transporte para ambas as praças são postos na conta do produtor, mesmo que o cacau seja despachado em Vitória para a Europa.
No Espírito Santo, talvez que à cultura de fibras esteja reservado um futuro promissor. A agave medra, excelentemente, na floresta; o algodoeiro desenvolve-se otimamente, aparecendo em terrenos rochosos, onde quase nada germina. Outra fibra, o carrapicho, cresce espontaneamente em qualquer pasto.
As explorações rurais dos colonos teutos realizam-se sob a forma de pequenas empresas. O colono é um sitiante que tem de executar todos os trabalhos, contando, apenas, com o auxílio das pessoas da família; quando esta não pode levar a cabo a tarefa, recorre ele à ajuda dos vizinhos. Quase nunca lança mão de braços assalariados.
É de admirar que predomine a pequena empresa nas colônias de alemães, quando o café, cultivado em grandes estabelecimentos agrícolas, proporcionalmente, rende, pelo menos, tanto quanto nos pequenos, e aqueles, na fase de beneficiamento, dão rendimentos bem maiores. Em São Paulo, a cultura do café se faz em grandes propriedades, as fazendas.
Compreende-se que os imigrantes alemães tenham começado como sitiantes, pois em sua pátria nada mais eram do que chacareiros ou jornaleiros. De inicio, faltam-lhes os meios materiais e as forças espirituais para se abalançarem a organizar e dirigir empreendimentos de monta. Entretanto, que é que os mantém aferrados à exploração agrícola modesta?
Na resposta, alinham-se, em primeiro lugar, os motivos psicológicos. Em virtude de seus medíocres conhecimentos, o colono alemão, ainda hoje, não está bastante preparado para ir além dos empreendimentos de costume, e dificilmente se tornaria um fazendeiro. Por outro lado, não achará jornaleiros entre os compatriotas, porque nenhum deles tem necessidade de prestar serviços, e todos são muito ciosos de sua independência. Até hoje, muitos pomeranos se lembram, com horror, do tempo em que eram jornaleiros, na terra natal, submetidos à dura jeira. Só se poderiam arranjar assalariados entre os nativos, os brasileiros. Entre esses, porém, poucos estariam dispostos a se obrigar por longo prazo. E, mesmo que conseguisse os braços nativos necessários, o colono, em virtude de seus parcos conhecimentos da língua portuguesa, dificilmente se aviria com eles.
Outro fator que o prende à pequena empresa, é a sua fraca disposição de conquistar algo melhor. Sente-se muito bem nas condições que o sítio lhe proporciona, as quais lhe permitem uma vida, sem fausto, mas cômoda. Com maiores receitas não saberia bem como gastá-las. Ao contrário do português e do italiano, não tem grande necessidade de dinheiro. O italiano, a fim de voltar à terra natal, emprega seu afã em juntar dinheiro; os portugueses e brasileiros, quando atingem a determinado nível cultural, lutam por conseguir recursos que lhes permitam levar uma vida agradável na cidade. O alemão, porém, ama a gleba onde se fixou, e não deseja abandoná-la. Esse traço de caráter, além de outros, afasta-o de tendências capitalistas que o levariam à grande empresa.
A topografia também favorece à pequena empresa. A região das colônias, no Espírito Santo, é muito acidentada. Não se pode contar, nas terras altas, com extensas áreas planas. Aí, a configuração do terreno estorva supervisionar extensões consideráveis e alcançar pontos mais afastados. Assim, seria difícil a uma exploração agrícola de grande porte, proteger a colheita contra furtos, o milharal e o mandiocal contra a invasão dos porcos do mato e dos macacos, impedir o roubo de gado e o rompimento da cerca pelos animais, e controlar os trabalhadores.[ 1 ]
Em meio à região por onde se espraiam as colônias teutas, há algumas grandes propriedades rurais, como a Fazenda Milagres, que pertence a um brasileiro e produz, anualmente, 16.000 arrobas de café; a Botelho, de um português, com uma produção de 6.000 arrobas, e a do italiano Venturini, com 5.000 a 8.000. Em todos os casos, porém, a maior parte da fazenda é cultivada por meeiros, fracionariamente. Esses recebem uma área e uma moradia, com a obrigação de fornecer a metade da colheita. Dispõem livremente da outra metade, que, em regra, vendem ao próprio fazendeiro. Este se encarrega do beneficiamento, entregando o café, posteriormente, ao mercado. Entrega-se, ainda, ao meeiro, uma nesga de terra, onde poderá realizar outras culturas, cujos frutos lhe pertencerão. Os meeiros são brasileiros e italianos; às vezes, encontram-se alemães cujos recursos não bastam para explorar um sitio próprio. O sistema de meação se originou, principalmente, da dificuldade, que apareceu com a libertação dos escravos, de conseguir mão de obra, estando generalizado na região alta e na planície.
No Espírito Santo, por conseguinte, não existe a exploração agrícola em larga escala. A grande empresa só funciona com relação ao beneficiamento dos produtos, especialmente do café. Essa atividade, na zona baixa, tende a se concentrar, em virtude das condições hidrográficas. Aí rareiam os regatos. Encontram-se maiores volumes d'água, de cuja utilização o fazendeiro se assegura. Quando não existe a hulha branca, são indispensáveis máquinas custosas para a produção de força motriz, empregando-se, principalmente o motor a gás Deutz. O sitiante não dispõe de recursos para adquirir máquinas desse tipo. Por isso, o vendeiro, na zona baixa, é, muitas vezes, o proprietário das máquinas destinadas ao beneficiamento de café, e o colono lhe vende a colheita bruta. Há, ainda, as empresas que se dedicam exclusivamente ao beneficiamento.
Por ora, outros obstáculos importantes à grande empresa são os precários meios de transporte, as condições insatisfatórias para a venda da produção e o escasso abastecimento de mercadorias.
O mutirão é o complemento necessário à produção agrícola em economia fechada, num sítio. Na linguagem dos colonos, é chamado de Juntament, palavra derivada de ajuntamento, que, de modo geral, significa reunião, agrupamento ou multidão de pessoas (Vereinigung, Zusammenkunft, Versammlung) e, particularmente, denomina o que Buecher designa de Bittarbeit, vocábulo que empregou tendo em vista a expressão usada pelos eslavos meridionais para nomear diversas atividades em grupo. (Die Entstehung der Volkswirtschaft. 9.a edição, página 278). Buecher inclui a Bittarbeit entre as formas de comunidade de trabalho, classificando-a como aglomeração de braços.
O ajuntamento, no Espírito Santo, corresponde exatamente ao que Buecher nomeia de Bittarbeit (mutirão):
Não subsiste nenhuma dúvida de que os colonos, antes de chegarem ao Brasil, já conheciam o ajuntamento, um velho uso de sua pátria. Mas as oportunidades de aplicação variaram, em parte. Convoca-se um ajuntamento, particularmente nos seguintes casos:
1. Para foiçar — Vinte a trinta pessoas juntam-se para esse fim. Cada uma se responsabiliza pelo desbastamento de uma faixa de terreno de 2 a 3 metros de largura. Vão, assim, subindo a encosta, andando paralelamente. Os retardatários são chasqueados, e considera-se vergonhoso atrasar-se. O mutirão tem um efeito educativo evidente; entretanto, conduz facilmente ao trabalho apressado. Por isso, ouve-se dizer com relação a áreas mal foiçadas: "É terreno de ajuntamento". (Juntamentsland). Quando se foiça e, ao mesmo tempo, se limpa o terreno, este trabalho fica a cargo das moças. Não se faz mutirão para a derrubada, em virtude, segundo me informaram, dos perigos ligados a essa atividade.
2. Para limpar os cafezais e para colher café — Reúnem-se homens e moças.
3. Para construir a casa — Só homens concorrem.
4. Quando há doenças numa família.
Qual a intensidade e a quantidade de trabalho realizado pelo colono? O clima tropical limita sua capacidade? A essas questões é possível dar uma resposta de ordem geral. As diferenças individuais são menores do que se poderia supor numa região em que cada um é senhor de si mesmo, e em que a fecundidade da terra e os espaços livres permitem a todos viverem colhendo e comendo bananas.
De início, verifica-se que todos os colonos alemães, trabalham além do que é necessário para a conquista do mínimo vital, e não se exagera, dizendo-se que o mais preguiçoso, excetuados alguns beberrões notórios, é, ainda, mais ativo e enérgico do que a média da população nativa. A capacidade de trabalho é muito grande; o colono realiza imensas tarefas, muitas vezes em pouco tempo: em trabalhos, como derrubada, construção de casa e de caminhos, abertura de picadas, não lhe iguala facilmente um camponês recém-chegado da Alemanha. Por certo, faz o colono, de vez em quando, uso amplo do direito de autodeterminação. Quando lhe dá na telha, em lugar de às 6, termina seu labor às 5 da tarde. Ou, em vez de ir para o trabalho, dirige-se à venda, onde, em virtude de uma pequena compra, permanece várias horas. Tal só acontece raramente e essas ocorrências se limitam, em geral, aos sábados.
O tempo de trabalho, em média, não é demasiadamente longo. O colono levanta-se quando alvorece; pelas 6, no inverno, ou pelas 5, no verão. Por volta das sete horas inicia a sua faina. Excetuada uma pequena pausa para uma refeição, trabalha-se até 11½, mais ou menos, ora enérgica, ora calmamente. Ao meio dia, almoça-se. O trabalho recomeça, na zona alta, às 2 horas; na baixa, às 3; dura até o escurecer; até às 6 da tarde, no inverno, prolongando-se um pouco mais, no verão. Às vezes, trabalha-se, ainda, à noite, à luz de candeeiros, tecendo-se cestos e peneiras, fazendo-se reparos, amontoando-se espigas de milho, etc. O colono deita-se cedo, às 8 ou 9 horas, em média. Uma vez que se levanta por volta das 5 ou 6, dorme suas boas nove horas, o que serve para conservar sua capacidade de trabalho em meio ao calor e à luminosidade exaustivos.
Excluídas as atividades eventuais à noite, a faina diária, no inverno, dura costumeiramente, oito horas. No verão, trabalha-se, em regra, menos, uma vez que há menos tarefas a executar; em certas ocasiões, entretanto, mais, como, por exemplo, na colheita de café, quando a labuta diária atinge a 10 ou 11 horas. Quando a pausa de meio dia é suprimida, no inverno, atinge-se a 10 ou 11 horas.
Temos a impressão de que os colonos, no Espírito Santo, empregam menos tempo no trabalho do que os jornaleiros na Alemanha, mas que, em compensação, labutam com mais intensidade. A verdade é que conservaram a capacidade de trabalho, se não a aumentaram.
Os trabalhos domésticos cabem, naturalmente, às mulheres. Cozinham, costuram e cortam as roupas para toda a família, inclusive as de homem. Entretanto, há muitos homens que sabem cozinhar e coser.
Também no sítio, as mulheres labutam muito; é-lhes vedado participar de uma derrubada, mas tomam parte em quase todos os outros trabalhos. Muitas tarefas, como a colheita de café, realizam-se mediante o concurso simultâneo de todos os membros da família.
Na criação dos animais, nota-se uma tendência acentuada para a divisão do trabalho. As galinhas e porcos são alimentados pelas mulheres e meninos, que também ordenham as vacas. Os homens cuidam dos eqüinos.
A posição da mulher, em face da economia, é, de modo geral, tão importante quanto a do homem.
Como já vimos, caracterizam o sistema de exploração dos colonos, três fatores: a cultura exaustiva, a monocultura e a pequena empresa. Não seria, entretanto, acertado, descobrir nisso um sinal de inaptidão e incapacidade econômicas. Como creio ter demonstrado, essa forma de exploração é mais uma conseqüência da natureza das condições externas. A pequena empresa tem mais aspectos vantajosos que desvantajosos. Mas, a cultura exaustiva e a monocultura, especialmente esta, representam um perigo econômico e cultural.
Reconhecendo esse fato, os pastores das comunidades filiadas ao Consistório Evangélico, no Espírito Santo, organizaram uma entidade, o Comitê Econômico, e interessaram firmas e sociedades teutas,[ 2 ] no Rio e na Alemanha, pelos problemas ocorrentes. O Comitê impôs-se a tarefa de orientar os colonos para uma atividade agrícola mais racional, a fim de que as colônias se estabilizem. É um cometimento difícil e complexo, e, para ter êxito, necessita da proteção poderosa do comércio e da indústria alemães, e, enfim, dos círculos que têm interesses ultramarinos. Mas, tem de ser levado a termo, se é a medida adequada para salvar, nacional e culturalmente, os alemães, no Espírito Santo.
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(para visualizar o sumário completo do texto clique aqui ) Capítulo V – O labor agrícola e seus aspectos gerais 1. A cultura exau...
A colonização alemã no Espírito Santo - Segunda parte: O trabalho (V)
(para visualizar o sumário completo do texto clique aqui)
Capítulo V – O labor agrícola e seus aspectos gerais
1. A cultura exaustiva
Acoima-se de cultura exaustiva o sistema de exploração agrícola dos colonos teutos. Julgado por um critério europeu, é um sistema condenável. Não se aduba o terreno, que se exaure, em virtude da lavoura de longos anos, dos elementos nutritivos; as colheitas diminuem, e chega o momento em que não vale mais a pena cultivá-lo. É o que sucede, depois de decorrer um período que oscila entre 15 a 40 anos, dependendo da natureza do terreno e dos processos de cultura. Chegando ao termo da fecundidade útil da terra, o colono é obrigado a abandonar a casa e o sítio, indo estabelecer-se noutro lugar.
Na Europa, o valor do terreno forçaria o investimento de mais capital (adubos etc.) e maior emprego de mão de obra. No Espírito Santo, porém, encontram-se áreas para a lavoura, em quantidade quase ilimitada, e o desbravamento será, talvez, mais rendoso que o amanho intensivo de velho sítio. De qualquer modo, é um simples problema aritmético, verificar, em cada caso, se é e quando é conveniente abandonar uma velha roça e organizar uma nova. Naturalmente, o colono nem sempre estará habilitado a agir de acordo com o princípio hedonístico. A escassez de capital, a falta de conhecimento e de formação técnica dificultam-lhe passar a uma cultura intensiva, mesmo na hipótese de esta convir.
O sistema de cultura exaustiva corresponde, de modo geral, às condições atuais da circulação, da técnica e do crédito. Justifica-se em face do axioma que afirma não existir emprego de capital e de trabalho onde se oferecem gratuitamente os recursos naturais; esse princípio, cuja evidência dispensa demonstração, fundamenta, do ângulo puramente econômico, esse processo de exploração agrícola. Mas tal processo reduz o colono a semi-nômade, condenando-o a um nível de vida primitivo e à retrogradação cultural.
O mais grave é a influência desagregadora que exerce sobre a vida interna da comunidade, que assenta sobre uma base territorial. Em Santa Leopoldina, os efeitos já se mostraram claros. Há trinta anos, tinha Santa Leopoldina 300 famílias; desde então, foi perdendo tantos membros, por emigrarem, que, atualmente só possui 150, apesar do intenso crescimento natural da população. Que perdas em valores culturais significa a decadência de um organismo social, morrendo aos poucos, cuja criação custou várias décadas de trabalho! Com a dissolução de uma comunidade, não se destroem, apenas, inumeráveis valores sentimentais; também valores sociais, os mais tangíveis, como o ensino, são prejudicados.
A gravidade dessas perdas amplia-se com o deslocamento crescente dos novos sítios para a zona baixa, dotada de bons terrenos, é verdade, mas onde o clima é menos favorável e se faz sentir mais poderosa a influência brasileira.
Estabelece-se, assim, uma cadeia inexorável: A cultura exaustiva leva à emigração, à dissolvência das velhas comunidades, ao enfraquecimento do espirito germânico e, talvez, ao declínio cultural e econômico do colono.
2. A monocultura
Além da cultura exaustiva, há outra peculiaridade da economia agrícola dos colonos, que pesa desfavoravelmente — a monocultura, aliás, como já vimos, fator marcante de toda a estrutura econômica do estado. O Espírito Santo quase só exporta café e a produção para o mercado interno se limita a poucas mercadorias; daí podermos falar em monocultura, mas sem tomar a palavra em seu sentido exato. Essa situação geral não cria muitos embaraços ao colono, cujas atividades se desenrolam numa economia predominantemente fechada. Quando minguam os resultados da cultura do café em virtude de más colheitas ou de queda de preços, ele tem, apenas, de reduzir a satisfação do que para ele representa superfluidades. Compreende-se que não se tenha esforçado em achar outras culturas de exportação; demais, a cultura do café é um ramo de produção muito cômodo. Com efeito, a plantação de um cafezal requer trabalho árduo e cuidados, mas o trato cultural posterior, a colheita e o beneficiamento exigem pouco labor. Não há dúvida de que essa unilateralidade paralisa o progresso econômico e aprisiona o colono no círculo de uma economia doméstica, submetendo-o a condições de pobre, embora com bem-estar. É ainda questão a discutir, saber quais as culturas que deveriam ser desenvolvidas no Espírito Santo. De qualquer modo, elevar a produção para o consumo interno poderia ser o primeiro passo; fumo, arroz, gado, etc. não precisava serem importados. Mas, o principal seria achar novos produtos para exportação.
Parece existirem, no Espírito Santo, vários lugares que oferecem condições favoráveis ao desenvolvimento do cacau. Fazendeiros brasileiros já tentaram introduzi-lo. Entretanto, não houve, até o momento, resultados comerciais apreciáveis. Os únicos mercados, atualmente, são Bahia e Rio de Janeiro; os custos de transporte para ambas as praças são postos na conta do produtor, mesmo que o cacau seja despachado em Vitória para a Europa.
No Espírito Santo, talvez que à cultura de fibras esteja reservado um futuro promissor. A agave medra, excelentemente, na floresta; o algodoeiro desenvolve-se otimamente, aparecendo em terrenos rochosos, onde quase nada germina. Outra fibra, o carrapicho, cresce espontaneamente em qualquer pasto.
3. A pequena empresa
As explorações rurais dos colonos teutos realizam-se sob a forma de pequenas empresas. O colono é um sitiante que tem de executar todos os trabalhos, contando, apenas, com o auxílio das pessoas da família; quando esta não pode levar a cabo a tarefa, recorre ele à ajuda dos vizinhos. Quase nunca lança mão de braços assalariados.
É de admirar que predomine a pequena empresa nas colônias de alemães, quando o café, cultivado em grandes estabelecimentos agrícolas, proporcionalmente, rende, pelo menos, tanto quanto nos pequenos, e aqueles, na fase de beneficiamento, dão rendimentos bem maiores. Em São Paulo, a cultura do café se faz em grandes propriedades, as fazendas.
Compreende-se que os imigrantes alemães tenham começado como sitiantes, pois em sua pátria nada mais eram do que chacareiros ou jornaleiros. De inicio, faltam-lhes os meios materiais e as forças espirituais para se abalançarem a organizar e dirigir empreendimentos de monta. Entretanto, que é que os mantém aferrados à exploração agrícola modesta?
Na resposta, alinham-se, em primeiro lugar, os motivos psicológicos. Em virtude de seus medíocres conhecimentos, o colono alemão, ainda hoje, não está bastante preparado para ir além dos empreendimentos de costume, e dificilmente se tornaria um fazendeiro. Por outro lado, não achará jornaleiros entre os compatriotas, porque nenhum deles tem necessidade de prestar serviços, e todos são muito ciosos de sua independência. Até hoje, muitos pomeranos se lembram, com horror, do tempo em que eram jornaleiros, na terra natal, submetidos à dura jeira. Só se poderiam arranjar assalariados entre os nativos, os brasileiros. Entre esses, porém, poucos estariam dispostos a se obrigar por longo prazo. E, mesmo que conseguisse os braços nativos necessários, o colono, em virtude de seus parcos conhecimentos da língua portuguesa, dificilmente se aviria com eles.
Outro fator que o prende à pequena empresa, é a sua fraca disposição de conquistar algo melhor. Sente-se muito bem nas condições que o sítio lhe proporciona, as quais lhe permitem uma vida, sem fausto, mas cômoda. Com maiores receitas não saberia bem como gastá-las. Ao contrário do português e do italiano, não tem grande necessidade de dinheiro. O italiano, a fim de voltar à terra natal, emprega seu afã em juntar dinheiro; os portugueses e brasileiros, quando atingem a determinado nível cultural, lutam por conseguir recursos que lhes permitam levar uma vida agradável na cidade. O alemão, porém, ama a gleba onde se fixou, e não deseja abandoná-la. Esse traço de caráter, além de outros, afasta-o de tendências capitalistas que o levariam à grande empresa.
A topografia também favorece à pequena empresa. A região das colônias, no Espírito Santo, é muito acidentada. Não se pode contar, nas terras altas, com extensas áreas planas. Aí, a configuração do terreno estorva supervisionar extensões consideráveis e alcançar pontos mais afastados. Assim, seria difícil a uma exploração agrícola de grande porte, proteger a colheita contra furtos, o milharal e o mandiocal contra a invasão dos porcos do mato e dos macacos, impedir o roubo de gado e o rompimento da cerca pelos animais, e controlar os trabalhadores.[ 1 ]
Em meio à região por onde se espraiam as colônias teutas, há algumas grandes propriedades rurais, como a Fazenda Milagres, que pertence a um brasileiro e produz, anualmente, 16.000 arrobas de café; a Botelho, de um português, com uma produção de 6.000 arrobas, e a do italiano Venturini, com 5.000 a 8.000. Em todos os casos, porém, a maior parte da fazenda é cultivada por meeiros, fracionariamente. Esses recebem uma área e uma moradia, com a obrigação de fornecer a metade da colheita. Dispõem livremente da outra metade, que, em regra, vendem ao próprio fazendeiro. Este se encarrega do beneficiamento, entregando o café, posteriormente, ao mercado. Entrega-se, ainda, ao meeiro, uma nesga de terra, onde poderá realizar outras culturas, cujos frutos lhe pertencerão. Os meeiros são brasileiros e italianos; às vezes, encontram-se alemães cujos recursos não bastam para explorar um sitio próprio. O sistema de meação se originou, principalmente, da dificuldade, que apareceu com a libertação dos escravos, de conseguir mão de obra, estando generalizado na região alta e na planície.
No Espírito Santo, por conseguinte, não existe a exploração agrícola em larga escala. A grande empresa só funciona com relação ao beneficiamento dos produtos, especialmente do café. Essa atividade, na zona baixa, tende a se concentrar, em virtude das condições hidrográficas. Aí rareiam os regatos. Encontram-se maiores volumes d'água, de cuja utilização o fazendeiro se assegura. Quando não existe a hulha branca, são indispensáveis máquinas custosas para a produção de força motriz, empregando-se, principalmente o motor a gás Deutz. O sitiante não dispõe de recursos para adquirir máquinas desse tipo. Por isso, o vendeiro, na zona baixa, é, muitas vezes, o proprietário das máquinas destinadas ao beneficiamento de café, e o colono lhe vende a colheita bruta. Há, ainda, as empresas que se dedicam exclusivamente ao beneficiamento.
Por ora, outros obstáculos importantes à grande empresa são os precários meios de transporte, as condições insatisfatórias para a venda da produção e o escasso abastecimento de mercadorias.
4. O mutirão (ajuntamento)
O mutirão é o complemento necessário à produção agrícola em economia fechada, num sítio. Na linguagem dos colonos, é chamado de Juntament, palavra derivada de ajuntamento, que, de modo geral, significa reunião, agrupamento ou multidão de pessoas (Vereinigung, Zusammenkunft, Versammlung) e, particularmente, denomina o que Buecher designa de Bittarbeit, vocábulo que empregou tendo em vista a expressão usada pelos eslavos meridionais para nomear diversas atividades em grupo. (Die Entstehung der Volkswirtschaft. 9.a edição, página 278). Buecher inclui a Bittarbeit entre as formas de comunidade de trabalho, classificando-a como aglomeração de braços.
Sob aglomeração de braços compreendemos o emprego de mão de obra da mesma natureza para realizar uma tarefa única por exemplo, para transportar uma pesada carga, para puxar vigas, foiçar, perseguir a caça. Há vantagem de congregar muitos trabalhadores, desde que não seja possível, individualmente, realizar o trabalho no tempo devido, não sendo necessário que a tarefa a executar seja superior às forças de cada um. Estão nesse caso as atividades ligadas às estações do ano ou que dependem de condições meteorológicas. Também razões de ordem social podem determinar o apressamento de certos trabalhos.
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O ajuntamento, no Espírito Santo, corresponde exatamente ao que Buecher nomeia de Bittarbeit (mutirão):
Todas as vezes que se tem de realizar uma tarefa que não possa ser levada a cabo pela mão de obra doméstica, pede-se a ajuda dos vizinhos. Estes concluem-na no tempo fixado, sem outra remuneração que o acolhimento proporcionado pelo dono da casa, na forma tradicional, e a esperança de, em caso de necessidade, ser socorrido do mesmo modo pelos vizinhos. Trabalham sob alegre emulação, gracejando e cantando; segue-se à noite, uma dança ou uma diversão de gênero semelhante.
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Não subsiste nenhuma dúvida de que os colonos, antes de chegarem ao Brasil, já conheciam o ajuntamento, um velho uso de sua pátria. Mas as oportunidades de aplicação variaram, em parte. Convoca-se um ajuntamento, particularmente nos seguintes casos:
1. Para foiçar — Vinte a trinta pessoas juntam-se para esse fim. Cada uma se responsabiliza pelo desbastamento de uma faixa de terreno de 2 a 3 metros de largura. Vão, assim, subindo a encosta, andando paralelamente. Os retardatários são chasqueados, e considera-se vergonhoso atrasar-se. O mutirão tem um efeito educativo evidente; entretanto, conduz facilmente ao trabalho apressado. Por isso, ouve-se dizer com relação a áreas mal foiçadas: "É terreno de ajuntamento". (Juntamentsland). Quando se foiça e, ao mesmo tempo, se limpa o terreno, este trabalho fica a cargo das moças. Não se faz mutirão para a derrubada, em virtude, segundo me informaram, dos perigos ligados a essa atividade.
2. Para limpar os cafezais e para colher café — Reúnem-se homens e moças.
3. Para construir a casa — Só homens concorrem.
4. Quando há doenças numa família.
5. A capacidade de trabalho
Qual a intensidade e a quantidade de trabalho realizado pelo colono? O clima tropical limita sua capacidade? A essas questões é possível dar uma resposta de ordem geral. As diferenças individuais são menores do que se poderia supor numa região em que cada um é senhor de si mesmo, e em que a fecundidade da terra e os espaços livres permitem a todos viverem colhendo e comendo bananas.
De início, verifica-se que todos os colonos alemães, trabalham além do que é necessário para a conquista do mínimo vital, e não se exagera, dizendo-se que o mais preguiçoso, excetuados alguns beberrões notórios, é, ainda, mais ativo e enérgico do que a média da população nativa. A capacidade de trabalho é muito grande; o colono realiza imensas tarefas, muitas vezes em pouco tempo: em trabalhos, como derrubada, construção de casa e de caminhos, abertura de picadas, não lhe iguala facilmente um camponês recém-chegado da Alemanha. Por certo, faz o colono, de vez em quando, uso amplo do direito de autodeterminação. Quando lhe dá na telha, em lugar de às 6, termina seu labor às 5 da tarde. Ou, em vez de ir para o trabalho, dirige-se à venda, onde, em virtude de uma pequena compra, permanece várias horas. Tal só acontece raramente e essas ocorrências se limitam, em geral, aos sábados.
O tempo de trabalho, em média, não é demasiadamente longo. O colono levanta-se quando alvorece; pelas 6, no inverno, ou pelas 5, no verão. Por volta das sete horas inicia a sua faina. Excetuada uma pequena pausa para uma refeição, trabalha-se até 11½, mais ou menos, ora enérgica, ora calmamente. Ao meio dia, almoça-se. O trabalho recomeça, na zona alta, às 2 horas; na baixa, às 3; dura até o escurecer; até às 6 da tarde, no inverno, prolongando-se um pouco mais, no verão. Às vezes, trabalha-se, ainda, à noite, à luz de candeeiros, tecendo-se cestos e peneiras, fazendo-se reparos, amontoando-se espigas de milho, etc. O colono deita-se cedo, às 8 ou 9 horas, em média. Uma vez que se levanta por volta das 5 ou 6, dorme suas boas nove horas, o que serve para conservar sua capacidade de trabalho em meio ao calor e à luminosidade exaustivos.
Excluídas as atividades eventuais à noite, a faina diária, no inverno, dura costumeiramente, oito horas. No verão, trabalha-se, em regra, menos, uma vez que há menos tarefas a executar; em certas ocasiões, entretanto, mais, como, por exemplo, na colheita de café, quando a labuta diária atinge a 10 ou 11 horas. Quando a pausa de meio dia é suprimida, no inverno, atinge-se a 10 ou 11 horas.
Temos a impressão de que os colonos, no Espírito Santo, empregam menos tempo no trabalho do que os jornaleiros na Alemanha, mas que, em compensação, labutam com mais intensidade. A verdade é que conservaram a capacidade de trabalho, se não a aumentaram.
6. A divisão do trabalho entre o homem e a mulher
Os trabalhos domésticos cabem, naturalmente, às mulheres. Cozinham, costuram e cortam as roupas para toda a família, inclusive as de homem. Entretanto, há muitos homens que sabem cozinhar e coser.
Também no sítio, as mulheres labutam muito; é-lhes vedado participar de uma derrubada, mas tomam parte em quase todos os outros trabalhos. Muitas tarefas, como a colheita de café, realizam-se mediante o concurso simultâneo de todos os membros da família.
Na criação dos animais, nota-se uma tendência acentuada para a divisão do trabalho. As galinhas e porcos são alimentados pelas mulheres e meninos, que também ordenham as vacas. Os homens cuidam dos eqüinos.
A posição da mulher, em face da economia, é, de modo geral, tão importante quanto a do homem.
7. O Comitê Econômico
Como já vimos, caracterizam o sistema de exploração dos colonos, três fatores: a cultura exaustiva, a monocultura e a pequena empresa. Não seria, entretanto, acertado, descobrir nisso um sinal de inaptidão e incapacidade econômicas. Como creio ter demonstrado, essa forma de exploração é mais uma conseqüência da natureza das condições externas. A pequena empresa tem mais aspectos vantajosos que desvantajosos. Mas, a cultura exaustiva e a monocultura, especialmente esta, representam um perigo econômico e cultural.
Reconhecendo esse fato, os pastores das comunidades filiadas ao Consistório Evangélico, no Espírito Santo, organizaram uma entidade, o Comitê Econômico, e interessaram firmas e sociedades teutas,[ 2 ] no Rio e na Alemanha, pelos problemas ocorrentes. O Comitê impôs-se a tarefa de orientar os colonos para uma atividade agrícola mais racional, a fim de que as colônias se estabilizem. É um cometimento difícil e complexo, e, para ter êxito, necessita da proteção poderosa do comércio e da indústria alemães, e, enfim, dos círculos que têm interesses ultramarinos. Mas, tem de ser levado a termo, se é a medida adequada para salvar, nacional e culturalmente, os alemães, no Espírito Santo.
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NOTAS
[ 1 ] Nas terras altas, as atividades se superpõem, o que representa outro obstáculo à grande empresa.
[ 2 ] O Sindicato de Potassa alemão tem prestado grandes serviços à causa.
Ernst Wagemann (autor) nasceu em 18 de Fevereiro de 1884, em Chañarcillo, Chile, faleceu em 20 de Março de 1956, em Bad Godesberg, Alemanha. Foi economista político e estatístico muito atuante na Alemanha a partir dos anos de 1920. Para mais informações sobre o autor clique aqui.
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