Praia de Camburi, circa 1950. Acervo Arquivo Público do Espírito Santo. SUMÁRIO Introdução I — Área estudada II — Aspectos físic...
Expansão urbana da área norte de Vitória
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Praia de Camburi, circa 1950. Acervo Arquivo Público do Espírito Santo. |
SUMÁRIO
Introdução
I — Área estudada
II — Aspectos físicos: geologia-geomorfologia-solos
III — Urbanização existente no setor norte de Vitória, em 1970
IV — A situação da urbanização encontrada atualmente — ano de 1986/1987
V — Conclusões gerais
VI — Anexos cartográficos com base em fotografias aéreas:
1. Esquematização dos solos e dos aspectos geomorfológicos do Setor Norte de Vitória
2. Esquema geológico-geomorfológico do Setor Norte de Vitória
3. Área urbana associada à vegetação do Setor Norte de Vitória, em 1970
4. Área urbana associada à vegetação do Setor Norte de Vitória, atualmente (1986/1987)
[COSTA, Ricardo Brunow. Expansão urbana da área norte de Vitória. Vitória: Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo/Academia Espírito-santense de Letras/Cultural-ES, 1989. (Cadernos de História, Vol. III) - Reprodução autorizada pelo autor]
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Ricardo Brunow Costa é geógrafo formado pela UFRJ, tendo vários livros e artigos publicados. Para outras informações, consulte a listagem de pesquisadores. (Para obter mais informações sobre o autor, clique aqui)
Sucintamente, concluímos que o Setor Norte de Vitória passou, e passa ainda, por um grande crescimento urbano, com a ocupação maciça de tod...
V — Conclusões gerais
Sucintamente, concluímos que o Setor Norte de Vitória passou, e passa ainda, por um grande crescimento urbano, com a ocupação maciça de toda a restinga de Camburi, do platô terciário e de parte apreciável da área de manguezais, em toda extensão que estes mangues têm com os terrenos da restinga.
Somente a parte central do mencionado Setor estudado não recebeu urbanização por tratar-se de terrenos que pertencem à Infraero — Ministério da Aeronáutica — aeroporto Eurico Salles, ou então, constituem-se em áreas reservadas para a Feira dos Municípios e Kartódromo, ou ainda, várias construções de porte médio de propriedade da Infraero, ou então, a área de reserva de mata de restinga, referida linhas atrás.
Também observamos que o crescimento verificado foi bastante acelerado no período estudado, dando ensejo ao surgimento de concentração populacional de classes sócio-econômicas (média alta, média ou baixa), de acordo com o local considerado. Basta a constatação do notável aumento de população do bairro de Jardim da Penha e de Mata da Praia I, II e III, onde há apenas uma década e meia a vegetação arbórea e herbácea predominava e que hoje estão quase que completamente ocupados por casas e prédios residenciais e comerciais.
Esse crescimento, essa ocupação espacial do Setor Norte de nossa capital foi ocorrência natural do processo de ampliação e ocupação que a cidade de Vitória reservou após ter sido preenchido o espaço mais propício dentro da Ilha: áreas de relevo plano ou ondulado e algumas encostas de morros passíveis de serem habitados. É evidente que as encostas montanhosas características da Ilha sempre foram e ainda são procuradas pela população de baixa renda, para fixação de suas moradias. É por demais claro que o município da capital do Estado não tinha melhor local para se desenvolver senão aquele que oferecia a superfície mais livre de ocupação humana, de excelente topografia em sua maior parte, de solo (na ótica da engenharia civil) com boa capacidade para suportar construções de qualquer porte, ao contrário daqueles solos das encostas, dentro da área de Vitória que, além de exigirem altos custos a fim de serem evitados desabamentos, são quase sempre perigosos (rolamento de grandes blocos de rochas). Os solos da restinga levam vantagem sobre aquelas áreas dos solos hidromórficos, pois estes amiúde exigem precauções especiais nas construções de qualquer porte e, portanto, requerem despesas financeiras extras nas obras de engenharia.
O núcleo mais antigo de Goiabeiras foi substancialmente aumentado dando surgimento a verdadeiros sub-bairros como o da República e o de Maria Ortiz. Bairros novos surgiram como os de Mata da Praia I, II e III, além de Morada de Camburi e Conjunto Hélio Ferraz.
Os núcleos iniciais de Jardim da Penha e Jardim Camburi tiveram verdadeiramente um crescimento vertiginoso nesse curtíssimo lapso de tempo. Nestes bairros esse afã de construir ainda continua por existirem, aqui e acolá, áreas desocupadas. As imobiliárias estão atentas na corrida para o atingimento de seus objetivos: quanto mais construir, melhor; não importando as conseqüências, porventura existentes, na queda da qualidade de vida dos habitantes. Os prédios continuam ganhando as alturas. A presença do aeroporto Eurico Salles evitou que prédios altos fossem construídos junto aos terrenos circunvizinhos por questão de viabilidade operacional das manobras com aeronaves na rota de pouso e decolagem. O que ocorrerá quando o aeroporto sair do local onde se acha instalado, conforme pensamento e pretensão de alguns, a fim de atender ao crescente aumento de tráfego aéreo devido à industrialização do município da Serra? Cabe aos planejadores dar uma destinação nobre e correta àquele espaço, observando os aspectos que envolvem a saúde e o bem-estar da população local e, por que não dizer, de toda Vitória, para que sejam evitados os erros de implantação de indústrias em ambientes desaconselhados, como, infelizmente, já multas vezes ocorreu na Grande Vitória.
É fato sobejamente conhecido que a paisagem geográfica decorre das inter-relações dos aspectos físicos, biológicos e humanos; e, também, é certo que, nesse contato e nessas influências recíprocas, com o passar do tempo e com a ação conseqüente ou inconseqüente dos homens, essa mesma paisagem vai se transformando, evoluindo para melhor ou para pior — tendendo, portanto, para a degradação ambiental. O Setor Norte de Vitória, como vimos, teve suas feições geográficas mudadas e continuará a tê-las, graças a essa ação do homem. Levando-se em consideração as necessidades dos habitantes das cidades modernas sufocadas pela poluição, pela falta de espaço para o lazer, pelas dificuldades do tráfego, pela falta do verde e de tantas outras necessidades genuínas do ser humano, nada mais justo e natural à sobrevivência do homem que o espaço à superfície da Terra - e o espaço urbano em particular - seja bem-planejado e organizado, devendo ser administrado para dar à população uma cada vez melhor qualidade de vida. Vitória está se transformando, está crescendo aceleradamente, prestes a tornar-se uma metrópole. Urge, pois, que as autoridades passem incontinenti a debruçar-se nos estudos para o equacionamento de todo esse magno problema da organização do espaço urbano da Grande Vitória. Por isso mesmo nossos dirigentes devem ter visão larga e penetrante para que o nosso meio ambiente natural e social seja sempre pensado antes e durante as fases do planejamento urbano ou de qualquer empreendimento citadino, porque o Homem, afinal, tem que ter prioridade em tudo, pois ele é, em última análise, a medida de todas as coisas.
Observação final – Para a realização deste trabalho tivemos por base os levantamentos aerofotográficos realizados pelas entidades abaixo designadas:
Maplan Aerolevantamentos | esc. 1:8.000 vôo final de 1986 |
Força aérea Brasileira | esc. 1:60.000 vôo ano de 1976 |
A pedido do IBC–GERCA | esc. 1:25.000 vôo ano de 1970 |
Ricardo Brunow Costa é geógrafo formado pela UFRJ, tendo vários livros e artigos publicados. Para outras informações, consulte a listagem de pesquisadores. (Para obter mais informações sobre o autor, clique aqui)
No município de Vitória a área que mais sofreu verdadeiro processo de expansão horizontal acelerado de urbanização foi, sem dúvida, o que d...
IV — A situação da urbanização encontrada atualmente — ano de 1986/1987
No município de Vitória a área que mais sofreu verdadeiro processo de expansão horizontal acelerado de urbanização foi, sem dúvida, o que denominamos de Setor Norte de Vitória. Novos bairros surgiram e outros tiveram notável crescimento, e, conseqüentemente, tanto a área ocupada como o aumento populacional deste setor experimentaram grandes modificações (consultar quadro população, inserido neste estudo). Queremos lembrar mais uma vez que seguiremos, também aqui, o mesmo critério adotado nas observações relativas à urbanização do Setor Norte de Vitória, concernente ao ano de 1970. É imprescindível que o leitor siga as observações com o desenho cartográfico sob os olhos. Iremos deste modo constatar a abertura de ruas, avenidas, construções de grande porte, preparação de áreas para construção de prédios e casas etc., tudo isto sempre reportando-nos à presença da vegetação existente nos locais descritos. Entretanto, não nos cabe discriminar e delimitar espécies vegetais — uma vez que existe inserido neste trabalho um quadro próprio elaborado sobre espécies de vegetação que deve ser consultado pois fugiríamos aos nossos objetivos traçados, no momento. Assim sendo, apresentamos uma classificação própria, o mais geral possível, cujo critério é aquele do local onde a vegetação surge. Falamos, então, de vegetação de mangue, vegetação de platô, vegetação de restinga e de vegetação dos morros cristalinos. Dentro desta classificação simplista acrescentamos apenas mais um item, a densidade com que a vegetação se apresenta. Este foi o mesmo critério aplicado quando explicitamos o item III deste estudo. Com estes critérios e métodos vamos iniciar as considerações deste item IV.
A paisagem que descrevemos do bairro de Fátima em 1970 apresenta-se bem distinta agora, no final de 1986. O que não passava de um loteamento vazio de no máximo 70 (setenta) construções, hoje não só configura um preenchimento de todos os vazios do antigo projeto de loteamento, como aumentou em muito a área de sua malha urbanizada. Enquanto em 1970 o bairro de Fátima guardava certa distância do bairro de Jardim Camburi, hoje eles estão praticamente ligados, o que vem provar o crescimento que tiveram durante este lapso não tão longo de tempo.
Hélio Ferraz, bairro que não existia em 1970, atualmente está unido ao bairro de Fátima, sem solução de continuidade. Em seguida ao Hélio Ferraz há uma descontinuidade na urbanização de apenas poucas centenas de metros, fato devido ao relevo sofrer um desnível de vários metros e possuir escarpa abrupta, o que dificulta a urbanização. Em seguida a este último bairro, já em território fora do distrito de Goiabeiras, mais precisamente, no distrito de Carapina, surge o conjunto residencial de Eurico Salles, que, em 1970, ainda não existia.
Sobre o platô, mais exatamente, na sua encosta, existe atualmente construído o conhecido Conjunto Residencial Atlântica Ville, cercado por todos os lados pelos terrenos da Cia. Vale do Rio Doce, exceto pelo lado sul que se comunica com Jardim Camburi.
Vamos agora deixar o platô e seguir por sobre a restinga, justaposta ao conjunto referenciado. Aí está o bairro Jardim Camburi que tem ao norte o bairro de Fátima. (Este, em 1970, na verdade apenas um embrião de bairro, pois poucas eram as casas existentes naquela época). O quadro da urbanização era precário: ruas projetadas, sem calçamento, com vegetação de restinga dispersa pela maioria dos lotes então existentes. Atualmente, a situação é totalmente diversa. O crescimento foi notável, tanto no sentido da ocupação do espaço horizontal como vertical, vez que além de casas, inúmeros são os edifícios de apartamentos, edifícios comerciais, etc. Houve mesmo o corte das encostas do platô, talhadas verticalmente, para a expansão do bairro.
Imaginando um grande polígono cujos lados seriam constituídos por parte da avenida Fernando Ferrari até o aeroporto e daí continuando pela rodovia federal até a linha divisória Vitória-Serra; os trilhos da CVRD; as avenidas Dante Michelini e Simão Nader, temos que dentro dessa superfície as únicas áreas que sofreram grande modificação em relação ao crescimento e urbanização foram justamente Jardim Camburi e Atlântica Ville. Outras alterações que pudemos observar devido à atividade humana neste polígono, depois de 1970, são representadas pela área destinada à realização da Feira dos Municípios, com a conseqüente construção de vias e ruas, além de imóveis e do Kartódromo, junto à Feira, bem assim como do complexo de galpões e outras edificações hoje em estado de abandono, pertencentes ao Ministério da Aeronáutica. Todas essas construções estão próximas à avenida Dante Michelini. Não podemos deixar de fazer menção à existência de lojas e galpões de material de construção às margens da Fernando Ferrari antes da passagem do aeroporto — sentido Vitória-Serra — assim como casas comerciais do mesmo ramo instaladas na Simão Nader.
O interior da superfície desse polígono descrito acima permaneceu sem modificação, devido, é claro, à própria presença do aeroporto Eurico Salles, o qual, devido às suas atividades específicas, necessita de espaço razoável para sua operacionalidade. Nesse polígono a vegetação de restinga cobre a superfície, ora se apresentando como vegetação rasteira de pouca densidade, ora com densidade média ou alta, havendo ainda disseminadas ao norte da área manchas pequenas de mata de restinga, próximas ao platô, repetindo sua presença nas cercanias da cabeceira sul da pista do aeroporto até as proximidades da avenida Simão Nader e — o que é mais importante — uma faixa razoável desse tipo vegetal entre a Feira dos Municípios (avenida Dante Michelini) e o cruzamento desta com a avenida Adalberto Simão Nader. Esta faixa de mata de restinga tem aproximadamente 13,4 ha e está atualmente protegida por cerca de arame. É um testemunho vivo da vegetação nativa.
Seguindo em direção sul, imediatamente após a avenida Adalberto Simão Nader, está o bairro Mata da Praia, não existente nos anos setenta. Naquela época tudo era coberto por mata densa de restinga. Nos dias atuais Mata da Praia se constitui num bairro com ruas bem-traçadas e largas, com destinação exclusivamente residencial. Interessante é frisar que também neste bairro existe uma área pequena onde a vegetação original de restinga oferece a oportunidade de ser apreciada, embora, infelizmente, venha sofrendo algumas depredações. Sua área total é de aproximadamente 2,8 ha.
Em seguida, após Mata da Praia, caminhando em direção oeste, está o que é chamado nos dias atuais de Bairro República, embutido no que se chama de Grande Goiabeiras. O seu aspecto arquitetônico e urbanístico, aliás, é igual ao deste grande bairro. Cercado por este último, pelo bairro Mata da Praia e pelo de Jardim da Penha, encontramos em franco processo de expansão um novo bairro: Morada de Camburi. Sua feição arquitetônica segue a do bairro de Mata da Praia, não existindo edifícios de apartamentos, apenas casas residenciais.
Marchando em direção sul desta última comunidade descrita, indo até o canal da Passagem, está aquele que é o mais conhecido de todos esses bairros dos tempos recentes: Jardim da Penha. Em 1970, como vimos anteriormente, predominava a vegetação de restinga na grande maioria dos seus lotes. Hoje, porém, verifica-se o notável desenvolvimento experimentado nos mais variados ângulos por este bairro. A febre de construções inclusive ainda continua nessas paragens características de classe média. A princípio, conjunto de casas residenciais, depois, conjunto de edifícios residenciais, em seguida, edifícios isolados de melhor acabamento e apresentação e casas de bonitas fachadas. Finalmente, bares, lojas, supermercados, enfim, tudo o que um bairro necessita para sua vida própria. Houve inclusive expansão do bairro na margem esquerda do canal da Passagem através de um grande aterro realizado em área de terreno de marinha, com a conseqüente perda de espaço dos mangues, tão importantes para a complementação da alimentação de população de baixa renda residente noutros locais.
Vamos agora passar a analisar a seção oeste da área de nosso estudo. Imediatamente a oeste de Jardim da Penha, depois de atravessarmos a Fernando Ferrari, encontramos o Campus Universitário. Este, além de ter também experimentado aterros para sua implantação, em detrimento do manguezal, teve sua superfície ampliada, permitindo a construção de muitos prédios bem-espaçados, atendendo à demanda cada vez mais crescente dos jovens à procura da Universidade. Muitas árvores e gramados foram plantados em extensas superfícies antes desnudas. Por todos os lados, exceto a leste, o Campus está cercado pelos manguezais.
Tomando a direção norte constatamos que houve uma grande ampliação do núcleo antigo do bairro de Goiabeiras, em ambos os lados da Fernando Ferrari. Muitas das árvores dos morros cristalinos foram derrubadas, cedendo lugar a casas, ruas e ruelas. Os mangues a oeste, como sempre, foram invadidos e casas de baixo padrão foram construídas em seu lugar.
Podemos anotar a presença de grande quantidade de palafitas seguindo as margens dos mangues a oeste do bairro Maria Ortiz I. Entre este e a comunidade de Maria Ortiz II está implantado o bairro Solon Borges. Maria Ortiz I e II, bairros pobres; Solon Borges, de nível sócio-econômico mais elevado, com ruas e casas melhor construídas. Nessas imediações encontra-se mais a leste, até atingir as margens da Fernando Ferrari, em frente ao aeroporto, o bairro Jabour. Ruas largas, bem-traçadas e casas de boa apresentação. Ao norte deste continua o manguezal, seguindo toda a margem esquerda da rodovia que vai até Carapina.
A seguir apresentamos três quadros, o primeiro deles obtido pelo método aerofotogramétrico, através da grade de pontos, no qual representamos em metros quadrados a área de cada bairro ocupada em dezembro de 1970 e o crescimento até dezembro de 1986. Os dados, é evidente, são aproximados, mas a partir deles pode-se ter uma boa noção do desenvolvimento e ocupação dos espaços considerados. É interessante que se observe na cartografia anexa o que apresentamos em números. O segundo quadro é o da população dos distritos de Goiabeiras desde a década de sessenta até os anos atuais, embora haja conflito de dados. Para comparação apresentamos também os mesmos dados para o distrito de Vitória. No terceiro quadro tentamos ousar um pouco mais e fizemos um resumo da vegetação com o seu gênero, espécie e nome vulgar, tanto em 1970 como em 1986. Cartograficamente, está figurada apenas a vegetação.
Bairros
|
Área aprox.
ano 1970 |
Área aprox.
acresc. 70/86 |
Goiabeiras | 957.600m² | 1.027.200m² |
Ufes | 249.200m² | 166.800m² |
Jardim da Penha | 896.800m² | 797.600m² |
Jardim Camburi | 452.400m² | 1.021.600m² |
Bairro de Fátima[=] | 207.200m² | 324.000m² |
Feira dos Municípios | (não existia) | 28.800m² |
Mata da Praia | (não existia) | 656.000m² |
Eurico Salles[x] | (não existia) | 116.400m² |
Totais | 2.763.200m² | 4.138.400m² |
Total geral aprox. áreas urbanizadas existentes em dez/86: 6.901.600m² | ||
[=] Incluído o bairro Hélio Ferraz. [x] Localizado no município da Serra. |
QUADRO II – Evolução da População dos Distritos de Goiabeiras e Vitória
Anos | Distrito Goiabeiras |
Distrito Vitória |
|
1960 | 1.402 | 83.840 | [x] |
1970 | 10.234 | 125.172 | [x] |
1980 | 65.089 | 149.984 | [x] |
1985 | 64.700 | 188.702 | [x] |
1986 | 68.500 | — | [=] [x] |
[x] Fonte FIBGE. [=] Fonte estimativa de dados populacionais para cidades, vilas e povoados do Espírito Santo. 1985/2010. Obs.: Para 1986 foi feita uma composição entre as duas fontes. |
QUADRO III – Quadro Resumido da Vegetação Natural Encontrada em 1970 e em 1986/1987
Divisão natural | Vegetação | Gênero/espécie | Nome vulgar |
ÁREA DO PLATÔ TERCIÁRIO | Vegetação de platô | Tabebuia obtusifolia | Ipê[x] |
Psidium sp | Araçá da mata[x] | ||
Nectrandra spp | Canelas[x] | ||
Hidrogaster trinerve | Barriga d'água[x] | ||
Sapium sp | Liteira[x] | ||
Cedrela fissilis | Cedro[x] | ||
Eugenia sp | Batinga | ||
Eucalyptus citriodora[p.e.] | Eucalipto[xx] | ||
Leucaena Leucoce plala[p.e.] | Eucalipto[xx] | ||
Eucalyptus grandis[p.e.] | Eucalipto[xx] | ||
Gramíneas variadas | Capins dos mais variados[x] | ||
ÁREA DA RESTINGA PROPRIAMENTE DITA E ÁREA INTERMEDIÁRIA | Vegetação da Restinga | Tabebuia spp | Pau-tamanco[x] |
Genipa americana | jenipapo[x] | ||
Clusia fluminensis | Abaneiro[x] | ||
Byrsonima sp | Murici[x] | ||
Cereus sp | Cactos[x] | ||
Psidium guayava | Goiabeira[x] | ||
Stylosanthes sp | Vassourinha[x] | ||
Panicum racemosum | Capim-da-areia[xx] | ||
Sporobulas virginicus | Grama-da-praia[xx] | ||
Ipomoea pescaprae | Salsa-da-praia[xx] | ||
Schinus terebenthifolius | Aroeira | ||
Brachiaria sp | Braquiária[xx] [x] | ||
Eugenia pedunculata | Pitangueira[x] | ||
Cynodon dactylon | Grama-de-burro[xx] | ||
Coccoloba sp | Baga-da-praia[xx] | ||
ÁREA DA RESTINGA PROPRIAMENTE DITA | Vegetação da restinga | Hyparrhemia rufaemwloba sp | Capim jaraguá[x] [xx] |
Mellinis minutiflora | Capim gordura[x] [xx] | ||
Brachiaria sp | Braquiárias de várias espécies[x] [xx] | ||
Ricinus communis | Carrapateira[x] | ||
Coccoloba sp | Baga da praia[x] [xx] | ||
Sporobulus virginicus | Grama-da-praia[x] [xx] | ||
Panicum racemosum | Capim-da-areia[x] [xx] | ||
Ipomoea pescaprae | Salsa-da-praia[x] [xx] | ||
ÁREA DOS MANGUEZAIS | Vegetação de mangue | Rhizophora mangle | Mangue vermelho[x] [xx] |
Laguncularia racemosa | Mangue branco[x] [xx] | ||
Avicennia tomentosa | Mangue siriúba[x] [xx] | ||
ÁREA DOS MORROS CRISTALINOS[xxx] | Vegetação dos morros cristalinos | Primitivamente existiam matas relativamente densas de espécies arbóreas de médio e pequeno porte, hoje devastadas. Constatamos, atualmente, gramíneas; poucas espécies de árvores naturais e árvores frutíferas plantadas: | |
Musa paradisíaca | Bananeira[xx] | ||
Mangifera indica | Mangueira[x] [xx] | ||
Persea americana | Abacateiro[x] [xx] | ||
— | Gramíneas diversas[x] [xx] | ||
[p.e.] Planta exótica.
[x] Plantas existentes em tempos recuados, porém às vezes ainda encontradas. [xx] Vegetação existente atualmente entre muitas outras espécies. [xxx] Na busca de uma melhor caracterização para o tipo de vegetação dos morros cristalinos, não obtivemos o necessário enquadramento para o tipo vegetacional desses morros, vez que, salvo melhor juízo, não podemos designar a vegetação natural que existia nesses morros nem de Floresta Perenifólia Latifoliada Higrófila Costeira, nem de Floresta Latifoliada Tropical Úmida de Encosta, nem de Formação de Encosta Atlântica (Geog. do Brasil — Reg. Sudeste, FIBGE) nem mesmo de Mata de Encosta (Augusto Ruschi, 1950). Cremos que a referida vegetação seria um meio-termo dentre todas essas denominações. |
[Reprodução autorizada pelo autor]
Ricardo Brunow Costa é geógrafo formado pela UFRJ, tendo vários livros e artigos publicados. Para outras informações, consulte a listagem de pesquisadores. (Para obter mais informações sobre o autor, clique aqui)
Foto 8 - Paisagem obtida da encosta norte do Mestre Álvaro, vendo-se loteamentos ainda incipientes no município da Serra. Ao fundo e à d...
A propósito do Mestre Álvaro - Anexo de fotografias II
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Foto 8 - Paisagem obtida da encosta norte do Mestre Álvaro, vendo-se loteamentos ainda incipientes no município da Serra. Ao fundo e à direita está Nova Almeida. Foto do autor, outubro de 1989. |
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Foto 12 - Aí está uma fonte de água límpida, correndo por entre as rochas do Mestre Álvaro. Foto do autor, outubro de 1989. |
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Foto 14 - Numa excursão ao Mestre Álvaro, uma parada para o merecido descanso do grupo. Foto do autor, 28 de outubro de 1989. |
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Foto 16 - Vista de parte da cidade da Serra, quando ainda estávamos em cotas mais baixas das encostas do Mestre Álvaro. Foto do autor, outubro de 1989. |
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Foto 17 - Aí vemos trecho considerável da área norte de Vitória. À esquerda e ao fundo aparece o mar. Foto do autor, outubro de 1989. |
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Foto 18 - Fatigados da caminhada exaustiva por trilhas íngremes e escorregadios, os integrantes do grupo fazem um curto descanso. Foto do autor, outubro de 1989. |
Foto 1 - Ao fundo, o imponente Mestre Álvaro visto do alto de um edifício na Praia de Camburi. No primeiro plano, edificações na á...
A propósito do Mestre Álvaro - Anexo de fotografias I
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Foto 7 - A silhueta do Mestre Álvaro vista a partir da BR-101 Norte. Foto do autor, junho de 1995. |
[Reprodução autorizada pelo autor] Ricardo Brunow Costa é geógrafo formado pela UFRJ, tendo vários livros e artigos publicado...
VI — Anexos cartográficos com base em fotografias aéreas
[Reprodução autorizada pelo autor]
Ricardo Brunow Costa é geógrafo formado pela UFRJ, tendo vários livros e artigos publicados. Para outras informações, consulte a listagem de pesquisadores. (Para obter mais informações sobre o autor, clique aqui)
Vista obtida a partir da meia-encosta norte do Mestre Álvaro, vendo-se em segundo plano loteamentos diversos e montes isolados. Pode-se ob...
A propósito do Mestre Álvaro - Parte II
PARTE II
6 - Uma escalada inesquecível ao Mestre Álvaro
O dia estava nublado, mas não escuro. O astro-rei se mantinha escondido. O tempo estava firme, não havia perspectiva de chuva. A temperatura estava agradável tendendo, presumivelmente, a elevar-se com o passar das horas, pois estávamos ainda não longe da aurora. Os ventos sopravam em baixas a moderadas velocidades. Nestas condições meteorológicas a nossa caminhada em direção ao Mestre Álvaro tinha tudo para ser agradável. Em assim sendo só nos restava tomar o ônibus em Goiabeiras e seguir até a Serra.
Uma vez lá chegados, olhei o relógio para verificar a hora certa do início da nossa caminhada: precisamente 8:30h. O dia era vinte e oito de outubro, um belo sábado, ano de 1989. Saímos da praça da Igreja de São Benedito, da muitas vezes centenária cidade da Serra. Os companheiros da aventura que ora se iniciava eram em torno de umas duas dezenas.
A oeste, à nossa frente, a nos desafiar pela sua imponência, estava o altaneiro maciço do Mestre Álvaro que pretendíamos alcançar e, se possível, pisar no seu ponto culminante a 833 metros de altitude, a mais alta cota de toda a Grande Vitória. Particularmente este pretenso andarilho desejava há muito atingir o cume daquele maciço. Quantas vezes olhei-o demoradamente e disse para mim mesmo: "Ainda vou alcançá-lo..."
Era assim um dia todo especial para a maioria dos participantes do grupo, à exceção de alguns poucos que já tendo intimidade suficiente com aquela montanha, nos serviram como guias. Deixei que os meus pensamentos se soltassem e me surpreendi imaginando fatos relatados pelos grandes escaladores de montanhas espalhadas pelo globo com seus picos ou cumes desafiadores: Everest (8.848m), Aconcágua (6.960m), Kilimanjaro (5.895m), Branco (4.808m) e tantos outros. Principalmente naquelas montanhas localizadas em regiões temperadas, as dificuldades são enormes devido ao clima impiedoso aliado às porcentagens baixas de oxigênio presentes na composição do ar rarefeito das altas camadas atmosféricas.
Deixando de lado o sonho e a imaginação que por momentos me conduziam, não tinha com o que me preocupar, pois que o caminho a ser trilhado e vencido naquele instante não oferecia as dificuldades das grandes escaladas como nevascas, gelos, ventos fortes, apetrechos pesados para serem transportados, barracas, suprimentos de alimentação para muitos dias, roupas especiais para suportar o frio, planos de escalada e tantos outros detalhes.
Novamente consulto o meu relógio: 9:00h. Até então havíamos caminhado quarenta minutos por um percurso de topografia plana sem nenhum obstáculo, apenas uma leve aclividade. Nesse momento o guia, rapaz experimentado naquelas escaladas, resolveu fazer a primeira parada para descanso, que durou quatro minutos, lapso de tempo estritamente necessário para evitar gastos excessivos de energia logo no início da caminhada. A partir desse descanso começamos a entrar em contato com um tipo de vegetação distinta, não mais herbácea exclusivamente, como até aqui vínhamos observando; agora, indivíduos arbóreos davam o ar de sua graça. A topografia foi-se modificando, e passamos a pisar em terreno de leve aclive. A senda que íamos seguindo exigia um pouco mais de esforço para ser vencida, e à medida que caminhávamos tornava-se mais estreita e sinuosa. Estava na hora de obedecermos ao que nosso fôlego começava a pedir: um pequeno descanso. O relógio nos informava que eram 9:20h. Só havíamos andado 12 minutos a partir da última parada e já necessitávamos de novo descanso. Que falta de preparo físico!... O cansaço começava a se manifestar na maioria dos elementos do grupo. Mas os guias não foram complacentes, deram-nos apenas dois minutos para refazermos as nossas forças. Após esses minutinhos, novamente prosseguimos montanha acima.
Às 9:20h, após caminhada forçada, numa subida excessivamente íngreme, segurando numa árvore aqui e noutra ali ou tropeçando nas raízes de outras tantas que bloqueavam nosso caminho, o guia principal resolveu dar uma trégua à nossa fadiga, própria, aliás, de gente despreparada para esse mister, e, para satisfação geral, uma pausa para o descanso foi feita. O alívio foi grande, pois que todos estavam ofegantes e com os pulsos acelerados. Mas o bem-bom logo acabou quando, ao sinal do guia, todos se levantaram (não com presteza, é claro) e reiniciaram a marcha com lentidão até que compreensível.
Os caminhantes, após mais alguns minutos, quando o relógio marcava 9:36h, receberam a alvissareira notícia de que seria feita a quarta parada para descanso. Foi com alegria que todos procuraram se sentar (no chão, nas raízes expostas de algumas árvores, em alguma rocha) para aproveitar o máximo daquele conforto tão simples que é o ato de sentar. Nessa momentânea tranquilidade pudemos nos deleitar com o panorama mais bonito que até então foi-nos possível apreciar. Nossos olhos puderam contemplar uma larga área que abrangia desde a Serra até os confins deste município, já na vila de Nova Almeida e mesmo um trecho do município de Fundão. Era deslumbrante ver o mar, a planície, as montanhas, as estradas, as áreas urbanizadas e não menos interessante era apreciar as parcelas de uso agrícola, tudo isto sendo abarcado por nossa visão a um só tempo. Aproveitamos o ensejo para fotografar em série.
Acima das nossas cabeças começava o colchão de nuvens que, na verdade, cobria todo o maciço e se prolongava por todo o espaço horizontal até onde a vista podia alcançar. A luminosidade de toda essa área observada naquele momento não ofuscava nem prejudicava a nitidez dos elementos paisagísticos. Essa luminosidade não agredia a retina de quem contemplasse os componentes do espaço geográfico. Não havia excessos de reflexão luminosa nas várias tonalidades e cores do espectro, dando-nos, assim, uma sensação de iluminação branda e doce porém nítida.
Aproveitamos essa pausa curta para saciar a nossa fome e sede. Não demoramos mais do que alguns minutos para dar continuidade à nossa subida, agora num percurso sob a mata tropical de encosta, em parte devastada mas que, ainda assim, oferecia um belo espetáculo natural para ser apreciado e desfrutado. O que mais nos impressionou entretanto, nessa parte do trajeto, foi, sem dúvida, a constatação de que tínhamos penetrado inteiramente no interior das nuvens espessas que cobriam toda a área do maciço e suas adjacências. Naquele instante estávamos literalmente envolvidos ou, melhor dizendo, mergulhados no vapor d'água daquele espesso e enorme aglomerado de nuvens. A temperatura ali era de alguns graus Celsius abaixo daquela que tínhamos experimentado poucos minutos antes.
A subida tornara-se cada vez mais difícil. A visibilidade diminuíra extraordinariamente, ficando, depois que fomos envolvidos pelas nuvens, dificultoso distinguir quem era quem entre os caminhantes a cinco metros de distância. Na verdade, os contornos das pessoas não eram precisos, percebiam-se, apenas, figuras escuras que faziam contrastes com a brancura da massa densa da nuvem. Que visão estranha aquela de seres que se moviam com dificuldade, às apalpadelas, tropeçando aqui e acolá nas raízes superficiais das árvores e arbustos, escorregando na lama, topando com os blocos de pedras ou seixos de tamanhos variados, ouvindo murmúrios que vinham de companheiros que não podiam ser identificados, pois que se deslocavam qual duendes à nossa frente e na retaguarda. Assim, essa umidade em ponto de saturação contribuía para impregnar de certo suspense aquele ambiente fantasmagórico. De pronto, o limite de saturação do ar chegou ao máximo e começou a chover.
Nós, a princípio com os corpos quentes em conseqüência do esforço físico despendido pela caminhada, não sentíamos naqueles momentos o desconforto das roupas encharcadas. Ao contrário, serviam para refrescar a pele. Mas depois de algum tempo começamos a ser fustigados pelo frio, ensopados como estávamos desde os sapatos até o boné.
O deslocamento do ar levando consigo toda aquela massa úmida e fria nos impedia de distinguir claramente as coisas e nos obrigava a levar aos pulmões excesso de umidade. Cair, escorregar e tropeçar eram atos freqüentes de quem estava literalmente à mercê dos elementos da natureza; entretanto, paradoxalmente, ela nos oferecia um belo espetáculo visual. Parecia que um imenso bloco de algodão estava sendo rasgado, dilacerado e esgarçado pelas árvores à medida que a névoa se movia impulsionada pelo vento.
De repente ouvimos um estranho ruído proveniente do lado esquerdo, bem abaixo da trilha. Ouvimos gritos que eram destinados a chamar a nossa atenção. Nosso grupo prontamente responde, sabendo por antecipação tratar-se de um pedido de ajuda ou socorro. Em tom de voz no mais alto grau possível, o nosso guia responde ao SOS, identificando o nosso grupo como sendo da Ufes. Logo em seguida nos certificamos que os escaladores perdidos eram em número de quatro. Bem, pensamos nós, com todas essas nossas condições físicas precárias conseguimos praticar, como dizem os escoteiros, uma boa ação. Esse local de encontro fraterno e acolhedor que evitou maiores transtornos ao outro grupo aventureiro ficou valendo como parada de descanso, e resumiu-se em apenas dois minutos. Faltavam três minutos para as 10:00h quando reiniciamos a caminhada e, pouco além, nos deparamos com uma frondosa jaqueira que nos presenteou com uma bela oportunidade de podermos saborear um de seus frutos. Indo um pouco mais adiante encontramos uma miniatura de represa natural de água límpida e habitada por pequeninos peixes. A água provém de um pequeno córrego que desce o maciço.
Até esse ponto da escalada, apesar dos pesares, o percurso foi bem sucedido, mas logo após essa pequena represa a nossa senda seguiu para a direita e, de maneira abrupta, tomamos uma trilha extremamente íngreme, cheia de seixos pequenos e médios.
A chuva caía insistentemente e precipitava-se incontinenti da copa das árvores como num chuveiro doméstico e, então, transformada em água, espalhava-se pelo chão ou seguia obediente aos sulcos, rugas, fendas e cortes do terreno. As raízes arbóreas, vez por outra, tentavam nos enredar, o cansaço queria tomar conta de nós. Os músculos das pernas doíam e eis que, então, ouvimos um brado geral de lamentações de grande parte do grupo. Alguns tinham se atrasado bastante, ficando muito à retaguarda, quebrando a continuidade da coluna humana — como uma cobra que tivesse sido cortada pelo rabo — mas que resfolegando ia lentamente aos trancos e barrancos vencendo com garra a empáfia do maciço. Galhos de árvores que porventura estivessem ao alcance de nossas mãos serviam com auxílio para que continuássemos em frente; as rochas expostas e as plantas rasteiras também foram de grande valia para a continuidade desta odisseia.
O relógio, ainda bem que à prova d'água, marcava 10:48h. "Continuo ou não a escalada", pensei comigo. Mesmo sem condições de luminosidade e outras tantas mais, resolvi bater duas fotos. Tento e consigo escrever no meu papel molhado algumas anotações com muito esforço, pois o desconforto me parecia grande demais devido ao peso da minha sacola (na verdade leve, mas que devido às circunstâncias do momento, tornava-se pesada). As parcas anotações que tínhamos delineado estavam quase indecifráveis quando fomos lê-las mais tarde. Que decepção! Todavia esta desilusão foi logo abrandada por uma desculpa que me pareceu razoável: estava em pé, cansado, tomando chuva, sem apoio para escrever no papel e sobretudo preocupado com o distanciamento dos colegas que caminhavam dentro da nuvem e, um após outro, iam desaparecendo do meu campo de visão; então, ora bolas, como eu poderia querer escrever legivelmente?
Feitas as anotações, tento aglutinar o que restava de forças para andar mais rápido, pois já estava sendo o último caminhante da coluna indiana que serpenteava a montanha; e era o último pelo fato de ter parado para fazer aquelas breves anotações. Com redobrado esforço retomei a posição anterior, próximo aos guias.
Depois de mais algumas centenas de passadas atingimos determinada área em que já não havia mais o adensamento vegetal que vínhamos notando por algumas horas. Era um lugar desbastado da antiga mata conservando um lençol de gramíneas. No meio delas lobrigamos a trilha que devíamos seguir. Local perigoso, pois que, do lado esquerdo havia um precipício que devido ao intenso nevoeiro não se podia aferir a sua profundidade exata, ficando, portanto, escondido das nossas vistas. Não há dúvida de que esse foi o ponto mais crucial da caminhada onde chegamos a ficar temerosos. Para complicar ainda mais, tínhamos que passar por uma rocha nua de forte inclinação, talvez de uns 60°. Acreditamos que passou pela cabeça de muitos se deveriam seguir viagem. Seria de bom alvitre enfrentar aquele trecho? Fiquei receoso, confesso. Três companheiros desistiram de continuar e ficou combinado que nos esperariam quando voltássemos. Era realmente um local perigoso. Tivemos necessidade do auxílio dos guias para podermos ultrapassar aquela rocha escorregadia, encoberta pelo intenso nevoeiro, com o precipício a nos ameaçar às costas e, o que era pior, sem termos o devido apoio para nos equilibrar e reencetar a escalada. O auxílio nos foi dado prontamente: varinhas adrede arranjadas que os guias seguravam numa das pontas e que cada um de nós agarrava firmemente na outra extremidade. Com esta providência nós podíamos ser alçados por alguns metros.
Não sei se teríamos tido coragem de passar por esse mesmo trecho se o dia estivesse claro, o que nos permitiria ter uma visão real do despenhadeiro à nossa retaguarda. A nebulosidade intensa camuflava, na verdade, o perigo, confirmando o adágio popular: "O que os olhos não vêem o coração não sente".
Passado esse perigoso trecho — o relógio já marcava 11:10h — atingíamos um dos pontos mais altos do Mestre Álvaro. As nuvens não nos deixavam ver quase nada. Persistia uma leve precipitação pluviométrica que nos incomodava. A visibilidade estava num índice baixíssimo, uns cinco metros tão somente. A ordem foi descansar. E como foi bom podermos sentar. Apesar de exaustos, resfolegantes, roupas ensopadas.[ * ] O local era constituído de uma rocha nua, sem solo e sem vegetação. Havia mesmo perigo de alguém, por um descuido qualquer, despencar-se daquelas alturas pois que não se percebia os limites da área da plataforma rochosa em que nos encontrávamos. Mesmo próximos uns dos outros não podíamos distinguir os contornos dos corpos dos nossos colegas.
A pausa nessa plataforma durou não mais que cinco minutos, ao fim dos quais a ordem foi prosseguir em direção ao ponto culminante do maciço que, evidentemente, não podia ser avistado naquele momento.
Para alcançarmos nossa meta final teríamos que transpor estreita passagem em declive relativamente suave, porém com despenhadeiros em ambos os lados, escondidos pela forte nebulosidade. Caminhando sempre em fila indiana só conseguíamos enxergar até, no máximo, o terceiro caminhante à frente e o terceiro à retaguarda. Para todos os lados, em cima e embaixo, todo o espaço a nossa volta era ocupado por uma só e única brancura. Sensação desagradável aquela!
Consulto o relógio pela enésima vez: 11:20h. Depois de havermos andado pelo caminho declivoso, eis que começamos a enfrentar uma senda em aclive. Estávamos agora ante o último lance para atingir, finalmente, o ponto culminante do maciço. Entretanto, algo de novo aconteceu. Uma parte do grupo de escaladores, considerando as condições meteorológicas reinantes, argumentou que não havia sentido prosseguirmos até o cume, vez que este estava totalmente encoberto e que não havia a mínima visibilidade para uma observação do panorama da Grande Vitória. Outros, mais inconformados, resolveram prosseguir até o ponto mais alto do maciço aonde, diziam eles, deveria haver uma cabana.
Naquele momento, enquanto havia o diálogo entre os integrantes, a chuva ainda continuava copiosa em nossas cabeças, o frio era intenso, a umidade muito alta e, somando-se a tudo isso, estávamos famintos e o cansaço e a fadiga já se faziam presentes há várias horas.
Lá pelas 12:10h, conforme o meu fiel marcador de tempo, tínhamos já terminado a nossa refeição principal quando o grupo que havia decidido ir ao cume veio ao nosso encontro. Naquele instante houve uma gritaria geral e irrestrita de intensa satisfação, pois o grupo estava novamente completo para continuar na sua trajetória um tanto quanto acidentada, mas feliz.
A luminosidade às 12:10h era como a do anoitecer, em conseqüência não só da nuvem que envolvia todo o maciço, como também devido à presença marcante da vegetação arbórea de certa exuberância que dominava o ambiente. Então resolvemos, sem pestanejar, começar o retorno da excursão. O guia anunciou que o caminho a ser palmilhado seria o mesmo da vinda, o que nos preocupou, pois pensávamos evitar determinada passagem difícil que havíamos anteriormente percorrido.
Esse regresso foi mais rápido (como sói acontecer com todos os regressos) apesar da fatigante subida que consumiu muita energia, exigindo bastante dos músculos destreinados da maioria. Foi assim que, sempre debaixo da caudal pluvial, da persistente umidade e da visão obscurecida pela névoa, atingimos o ponto onde tínhamos feito a segunda parada pela manhã, às 9:12h. Confiro a hora: 13:40h.
Tiramos algumas fotografias, apesar das condições desfavoráveis do tempo, pois nossa intenção era apenas documentar aqueles momentos, sem levar em consideração qualquer preocupação de ordem artística ou estética, coisa que, aliás, não temos engenho nem habilidade mínima para fazer.
Por mais alguns minutos, sempre descendo, fomos deixando paulatinamente o colchão de nuvens no qual estávamos por tantas e tantas horas e, finalmente, para alegria de todos, fomos presenteados com a vista que se descortinava a leste e a norte do Maciço do Mestre Álvaro. Que bom podermos mais uma vez ver a variegada tonalidade de cores e luzes irradiadas pelas obras da natureza e das mãos do homem, graças à presença do sol!
Daí em diante só nos restava seguir em direção ao sopé da montanha e, uma vez lá, dar seguimento à caminhada para atingirmos o ponto inicial, o marco zero da nossa aventura. E assim procedemos — mesmo cansados e sujos de lama, mas alegres e satisfeitos — marchando pelo caminho plano e seguro, chegando na praça da Igreja de São Benedito, na Serra. Já no marco zero, com a missão cumprida, consulto o digital: 15:25h. Despedimo-nos e tomamos a condução que nos levaria às nossas respectivas casas. Valeu a pena o nosso esforço. Apesar das condições adversas do tempo, vencemos o Mestre Álvaro.
NOTA
[ * ] Tínhamos pelo menos alcançado, naquele momento, uma das cotas mais altas.
[COSTA, Ricardo Brunow. A propósito do Mestre Álvaro. Vitória: Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo/Prefeitura Municipal de Vitória, 1995. 92p. (Cadernos, vol.VI)]
Ricardo Brunow Costa é geógrafo formado pela UFRJ, tendo vários livros e artigos publicados. Para outras informações, consulte a listagem de pesquisadores. (Para obter mais informações sobre o autor, clique aqui)
A silhueta do famoso maciço do Mestre Álvaro, visto do lado Sul. É comum apresentar-se com o cume coberto de nuvens. Aqui, entretanto, ...
A propósito do Mestre Álvaro - Parte I
PARTE I
1 - Palavras iniciais
O Mestre Álvaro, produto de fenômenos naturais endógenos e exógenos, é um acidente geográfico que divisamos frequentemente e que nos chama a atenção pela sua silhueta majestosa quer nas horas matutinas como no entardecer. Sempre nos deliciamos com a observação desse maciço altaneiro que domina toda a região da Grande Vitória. Mesmo em dias nevoentos podemos perceber o vulto do histórico Mestre Álvaro. É comum também ele nos oferecer o espetáculo do seu cume envolvido por nuvens brancas ou acinzentadas como se o morro estivesse de chapéu para proteger-se do sol escaldante dos dias muito quentes e claros, nuvens que parecem ancoradas firmemente no maciço deixando as suas cotas mais altas totalmente invisíveis.
Pelo fato dos alinhamentos rochosos da montanha seguirem a direção aproximada de norte-sul, em dias ensolarados as sombras das encostas mais altas, verdadeiras garupas da sua superfície, vão-se projetando nos vales e gargantas apertados e o verde da vegetação e de todo o conjunto vai cambiando de tonalidades à medida que o astro-rei vai-se deslocando do mar, ao nascer, até desaparecer por trás das montanhas a oeste, ao entardecer, Este espetáculo pode ser apreciado diariamente quando o dia se apresenta claro. Mas o importante é que com as mudanças do tempo meteorológico esta cena tem múltiplas variações — conforme o céu esteja mais ou menos encoberto — com cúmulos-nimbos, cúmulos ou estratos passeando pelas proximidades do velho morro ou, então, pela condensação provocada pela diferença de temperatura existente entre as cotas mais altas e o ar adjacente, dando-nos, desta forma, a sensação de estarmos assistindo a um doce filme colorido em câmara lenta para o nosso deleite e encantamento.
A verdade é que nós, seres humanos, que estamos vivendo hodiernamente no meio urbano onde nos afastamos cada vez mais do convívio saudável da natureza, sentimos a necessidade desse contato mais estreito com ela. Daí, talvez, o porquê de tantas pessoas, à primeira oportunidade, buscarem no mar, nos rios, nas montanhas, na vida interiorana, um lenitivo para conseguirem suportar as pressões adversas que lhes são infligidas pelo ambiente citadino carregado de tensões, poluições das mais variadas, da presença da excessiva densidade de construções em geral como da elevada concentração populacional, gerando tudo isto um ambiente onde o concreto armado não dá a mínima chance para o verde que é, sem dúvida, um bálsamo para os nossos olhos.
Na nossa cidade, Vitória, temos a vantagem de poder apreciar o mar e sentir o ar marinho que nos refresca nos dias de canícula. Os morros com a vegetação que os encobre, apesar de toda a poluição a que estamos sendo submetidos, amenizam a monotonia dos prédios, dos conjuntos residenciais e outras edificações.
Foi assim, dentro desse quadro ambiental que a presença do compacto Mestre Álvaro veio a nos despertar cada dia mais, provocando nosso interesse em estudá-lo, mesmo superficialmente, e, assim, compreendê-lo um pouco mais em suas peculiaridades.
Buscamos, baseados numa bibliografia constando de textos e cartografia de várias épocas, apresentar o maciço em suas facetas mais variadas e teria sido interessante se tivéssemos a possibilidade de juntar neste trabalho cópias de alguns documentos cartográficos antigos, porém, como isso não foi possível, limitamo-nos a comentá-los de modo sucinto e colocá-los na relação bibliográfica.
Finalmente, bom teria sido se pudéssemos ter manuseado os documentos originais — tanto cartográficos como as obras escritas — uma vez que as traduções e cópias vão perdendo algumas características que só os originais possuem. E notamos isto, principalmente, quando vamos encetar uma análise mais profunda de cópias de documentos antigos que acabam nos deixando muitas dúvidas, incertezas várias e interrogações que ficam sem resposta adequada e definitiva. Este trabalho, desta forma, representa apenas uma singela contribuição despretensiosa que oferecemos para o conhecimento de uma pequena, porém importante, área da Grande Vitória.
2 - Os textos sobre o maciço
O maciço do Mestre Álvaro — como é hoje comumente chamado — foi, desde os primeiros tempos do séc. XVI, observado e utilizado por navegadores que por aqui passaram, servindo de notável sinalização para a navegação quer por aqueles que demandavam para a entrada da barra do porto do "Sprito Santo" quer para os que seguiam em direção a outros locais do litoral sul do Brasil.
É do conhecimento dos historiadores que Vasco Fernandes Coutinho quando chegou à sua capitania, desembarcando próximo ao morro Moreno, em Vila Velha de hoje, avistou o Mestre Álvaro, tanto que escreveu sobre isto, acrescentando ter-se orientado pelo mesmo desde quando vinha navegando ainda longe do nosso litoral.
Em seu Tratato descritivo do Brasil Gabriel Soares de Souza faz referência precisa de toda a área da então Vila de Nossa Senhora da Vitória, da ponta de Tubarão, da serra do Mestre Álvaro, de Vila Velha, do morro Moreno, do Penedo (embora este ainda não tivesse dito nome). Enganou-se o autor quando pensou tratar-se de um rio a baía de Vitória, fato aliás, de ocorrência freqüente nos escritos dos nossos primeiros viajantes estrangeiros, tendo o mesmo engano ocorrido com outros autores em diversas baías pelo Brasil afora. A razão deste engano é até natural se considerarmos que a "ria" tem configuração ou aspecto realmente, em muitos casos, ao de um curso d'água doce. Sugere ainda o autor a possibilidade de ser construída uma fortaleza sobre nosso conhecido Penedo, com poucos recursos financeiros, permitindo, assim, ótima defesa contra os ataques estrangeiros.
Outro importante livro clássico dos primórdios da história brasileira Viagem à terra do Brasil, de Jean de Lery, infelizmente não traz detalhamento sobre o nosso Estado do Espírito Santo, apresentando um mapa tosco onde aparecem consignados os rios Doce e o Cricaré.
Compulsamos também Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, de Jean Baptiste Debret e Duas viagens ao Brasil, de Hans Staden, porém, embora preciosos trabalhos sobre o nosso país, não nos serviram para o que nos propúnhamos pesquisar. O mesmo se deu com Tratado da terra e gente do Brasil, do padre Fernão Cardim e Cultura e opulência do Brasil, de André João Antonil. Nada consta neles do que precisávamos para avançar nos nossos objetivos.
Recorremos também à notável e preciosa obra dos eminentes naturalistas Johann Baptist von Spix e Carl Friedrich von Martius, que visitaram e estudaram nosso país no primeiro quartel do século passado, porém não encontramos em sua famosa obra — Viagem ao Brasil — nada que pudéssemos aproveitar para o nosso trabalho.
De sua permanência no Brasil, entre 1815-1817, o príncipe Maximiliano de Wied-Neuwied escreveu Viagem ao Brasil, com notáveis descrições sobre tudo o que pôde observar. Engana-se também o príncipe quando chama de rio Espírito Santo à baía de Vitoria. Ele faz menção nos seus escritos à presença do monte Mestre Álvaro. Não sabemos como está grafado no original alemão.
Dom Pedro II, quando visitou o Espírito Santo na segunda metade do século passado (1860), fez referência ao Mestre Álvaro, escrevendo que a montanha podia ser vista até 60 milhas mar adentro com tempo bom, de acordo com o que consta de suas anotações pessoais, conforme escreve Levy Rocha no seu livro Viagem de Dom Pedro II ao Espírito Santo.
Em 1833 é publicado em Paris o resultado da viagem que outro eminente viajante, Auguste de Saint-Hilaire, tinha feito ao Brasil. No que diz respeito à nossa terra espírito-santense a Editora Universidade de São Paulo faz publicar Viagem ao Espírito Santo e rio Doce. Pudemos constatar nesta obra que o famoso naturalista conheceu e descreveu bem a nossa região de Vitória. Faz referência à montanha de Mestre Álvaro e cercanias de modo preciso e informando que, apesar de ser coberta por matas virgens, no meio delas já existiam plantações de mandioca, algodão e milho e constatou a presença de muitos animais silvestres. Diz usar a grafia que lhe pareceu concordar com a empregada pelos moradores locais: Mestre Alvo. Corria o ano de 1818 e Vitória tinha 4.245 habitantes (cf. Revista Você, agosto 1993).
Grande estudioso da nossa gente e nossa terra, Basílio Carvalho Daemon, na sua História e estatística da província do Espírito Santo discorreu detalhadamente sobre a chegada de Vasco Fernandes Coutinho, informando que o donatário teria tomado o pico do Mestre Álvaro como ponto de referência para sua navegação por aqui aportou nos primórdios da nossa história.
Em 1870 o renomado geólogo canadense, Charles Frederick Hartt, publica nos Estados Unidos importante trabalho, resultado de suas pesquisas no Brasil, com o título de Geologia e geografia física do Brasil. Esteve estudando parte do nosso Estado, escrevendo de maneira clara e acessível, explicando e descrevendo a paisagem física por ele observada. Menciona o Penedo, a baía de Vitória, e como não podia deixar de ser, também faz referência ao Mestre Álvaro ou morro da Serra, considerando-o uma montanha de gnaisse. Exagerou na sua altitude quando fala de 3.500 pés, ou seja, mais de 1.000 metros. Confirmou o que outros haviam dito: a montanha era coberta de florestas e nas suas encostas existiam plantações de café.
Num livro singelo, demonstrando muito carinho pelo município serrano, Naly E. Miranda em Reminiscências da Serra cita o historiador e professor padre Alves de Siqueira que, em versos publicados em 1884, assim se expressa:
Assoma, ingente alta montanha
Mestre Alvo, aos nautas conhecido
É a natural, linda peanha,
Onde se propõe enobrecido
Um povo, que jamais se acanha
No labor da lavoura enriquecida
Se não tem do engenho, alta agudeza
Sobram-lhe brios, honras e nobreza.
Reminiscências da Serra alude que muitos sustentam a denominação "Mestre Alvo", uma vez que o acidente geográfico em tela teria servido de guia aos navegantes do passado. Também nesse livro citado está expresso de maneira vaga e imprecisa que há quem diga que o nome da montanha é Mestre Alves, pelo fato de ter existido, num passado longínquo, um professor que morava na encosta conhecido por esse nome. Prossegue N.E. Miranda, sem muita precisão, que outros acreditam ter existido um professor, conforme a história anterior, porém, com o nome de Mestre Álvares. Finalmente, alude a uma história de que outros ainda admitem que o nome é Mestre Álvaro, advindo do fato de que este era o nome de um mestre de embarcação que se servia desse monte para orientar-se a fim de aportar o seu barco (ainda voltaremos a tratar do problema dos nomes do maciço mais adiante).
Mário Aristides Freire em Capitania do Espírito Santo escreve que Saint-Hilaire subiu no Mestre Álvaro quando esteve por nossas paragens, acrescentando que tal denominação já era registrada em 1587, tendo o governador Rubim pretendido transformá-la para Alvo. Entretanto, na Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, em seu artigo publicado em 1817, constatamos que Francisco Alberto Rubim não emprega o topônimo Mestre Alvo, mas Mestre Álvaro.
O ilustrado escritor Luiz Serafim Derenzi, em Biografia de uma Ilha, discorrendo sobre o desembarque de Vasco Fernandes Coutinho em nossas plagas, emprega o topônimo Mestre Alvo, acrescentando, porém, que os antigos também usavam o substantivo próprio Álvaro.
A festejada escritora e historiadora capixaba Maria Stella de Novaes, na sua magnífica História do Espírito Santo, mostra que o colonizador se serve do Mestre Álvaro para a penetração na baía do Espírito Santo.
Em seu livro didático Corografia do Brasil, Mário Vasconcelos da Veiga Cabral, muito conhecido das antigas gerações brasileiras, numa geografia de enfoque fortemente descritivo e por isso mesmo muito criticado, dissertando sobre nossa terra emprega o topônimo monte do Mestre Álvaro fazendo alusão ao padre Aires de Casal, que teria escrito: "O Monte de Mestre Álvaro, que he huma montanha quasi circular vistoso, e a mais alta da costa, perto de três leguas afastada da praia, em partes escalvada e de rochedo, n'outras povoada de matas, etc. teve um vulcão na antiguidade."
O historiador Francisco Eugênio de Assis, estudioso da terra, em seu Dicionário geográfico e histórico do Espírito Santo teve oportunidade de grafar por várias vezes, quando descreve as divisas intermunicipais e interdistritais do município da Serra, o morro Mestre Alvo e não Álvaro.
Há vinte anos a Fundação Cultural do Espírito Santo publicou trabalho do professor e geógrafo Cícero Moraes, saudosa figura expressiva na nossa cultura, sob o título Geografia do Espírito Santo, em que há referência ao Mestre Álvaro sendo este considerado como um maciço gnáissico com aparência de vulcão havaiano extinto, para quem olha do norte e do mar. Embora aqui esteja gravado Mestre Álvaro, em outros trabalhos de sua autoria ele usa Mestre Alvo.
Na sua Proposta de ordenamento urbano do município da Serra, a Fundação, hoje Instituto, Jones Santos Neves grafa o nome Mestre Alvo no referida trabalho, mas noutros não procede da mesma forma, adotando a denominação Mestre Álvaro.
Na verdade as denominações dadas ao maciço são várias e apenas a título de ilustração queremos apresentar todas as que pudemos catalogar. Algumas delas são simples aglutinações da linguagem popular: Mestralvo, Mestrialve, Mestre Alvarez, Mestre Álvares, Mestre Álvaro, Mestre Alves e Mestre Alvo. Nos dias de hoje predomina a denominação Mestre Álvaro.
Antes de adentrarmos nesta questão queremos, com todo respeito, discordar daqueles que imaginam ter existido, em épocas recuadas da nossa história, uma pessoa encarregada de acender fogueira no cume do maciço (como se fosse um faroleiro), para orientar os navegantes que por aqui vinham aportar. Parece-nos hipótese inconsistente se imaginarmos as dificuldades que tal indivíduo teria naqueles tempos para realizar o seu mister num local de difícil acesso, de altitude considerável, coberto de mata densa e habitado por animais peçonhentos. Quanto tempo despenderia tal indivíduo para realizar uma tarefa dessa?
Bem, quanto ao topônimo, admitir que tenha sido originado do nome de um professor que habitava as encostas, e ao qual os habitantes das proximidades chamavam Álvares ou Alves, também não deve corresponder à verdade, pois esse pretenso professor teria existido séculos depois de se ter conhecimento do maciço, quer na cartografia primitiva, quer nos textos muito antigos.
O mesmo pensamos da hipótese alegada por alguns de que Mestre Álvaro originou-se do nome de um mestre de embarcação que se orientava pelo maciço para chegar ao local próprio para ancoragem do seu barco. Se existiu esse mestre foi, com certeza, muito depois da chegada dos navegadores e colonizadores à nossa terra.
Sem querermos dar como palavra final, achamos mais convincente que tenha sido Mestre Alvo o nome que, naturalmente, tenha surgido para cognominar esse acidente geográfico. Ora, mestre porque — como já comprovado historicamente em documentos escritos pelos primeiros navegadores e colonizadores desde o século XVI — a montanha servia de guia à navegação e de sinalização para a entrada da baía do Espírito Santo.
E Alvo, por quê? Porque, dizemos nós, a culminância do morro, sendo constituída por encostas muito abruptas, não permitindo que a vegetação ali se desenvolva, expõe à vista a rocha nua com tonalidade mais clara, contrastando com o verde escuro das matas. Imaginemos no século XVI como não deveria ser a cobertura vegetal ali reinante! A própria decomposição da rocha, graças à meteorização dos seus elementos constitutivos (seja granito ou gnaisse) solta muitas vezes resíduos mais claros (quartzo, feldspato e mica branca). Pensemos agora num dia de pleno sol à distância de muitas milhas mar afora: o que poderia ver o navegante senão um belo monte todo verde com o cume esbranquiçado? Daí, concluímos, a razão do topônimo Mestre Alvo. Daí, também, Alvo significaria mira, ponto que serviria para marear determinada direção a ser tornada pelo navegador.
Não é de admirar o fato de ter sido mudado o nome original, pois isto é fenômeno não tão extraordinário assim, visto que são muitos os exemplos pelos quatro cantos do Brasil em que, seja por mal entendimento da pronúncia, do linguajar simples da gente do povo ou por acontecimentos ocorridos na história local, os topônimos podem sofrer grandes transformações, quando não são totalmente desfigurados, ficando completamente irreconhecíveis.
3 - Algo sobre a cartografia
Deixando um pouco à parte estas considerações que dizem respeito aos textos, vamos examinar algo da cartografia que tivemos oportunidade de analisar sobre o Mestre Álvaro. Se houve certa dificuldade em obtermos textos sobre o assunto enfocado e se há tanta multiplicidade de nomenclaturas para a famosa montanha serrana, o mesmo observamos quando analisamos a cartografia existente.
Até hoje somos um Estado carente, dentre outros itens, no que concerne às impressões cartográficas de boa qualidade; tanto isto é verdade que as referidas impressões são confeccionadas fora das nossas fronteiras. Como é sabido, antes de se chegar à impressão da própria carta geográfica há que se ter um bom e cuidadoso levantamento de campo e de gabinete. Os erros são, mesmo assim, ainda hoje, comuns. Imaginem então nas cartas antigas, quando o próprio território representado era quase desconhecido... É claro, aqui não existiam nem empresas privadas nem órgão público que se dedicasse a tais labores.
À cata de cartografia antiga e nova do nosso Estado tivemos oportunidade de manusear alguns exemplares dignos de nota. Tal é o esboço de representação cartográfica — e dizemos esboço porque não poderíamos de mapa, no sentido moderno do termo, tendo em vista que nem escala possui — que tem importância histórico-geográfica, datado de 1666, constituindo um trabalho de grande envergadura para a época, vez que abarca toda a costa brasileira. Nesse trabalho, a parte que nos interessa focalizar denomina-se "Demostração do Sprito Santo", que está reproduzida no livro de José Teixeira de Oliveira, sob o título História do Estado do Espírito Santo. O trabalho cartográfico total é constituído de trinta e um mapas sendo que o Espírito Santo representa, naturalmente, uma pequena parcela desse conjunto. Vários topônimos estão ali representados e que são nossos conhecidos hoje: Ponta de Tubarão, Forte de São João, baía do porto do Sprito Santo, bem como as Serras do Mestre Alauro (sic), nosso Mestre Álvaro. Estranhamente, o Mestre Alauro está representado como se fosse constituído de montes isolados e, além disso, plotados muito mais próximos do litoral do que na verdade se encontra o referido maciço. Foi, claro, um erro grosseiro cometido, o que bem demonstra ainda o desconhecimento do nosso território naquela época.
Em outro mapa, Demonstração do Sprito Santo muito semelhante ao anterior, porém ampliado, com orientação, sem escala, encontram-se entre tantos nomes conhecidos de hoje: Nossa Senhora da Penha, morro de João Moreno, Pão dasucar (Penedo) e Serras do Meitre Aluaurro (sic). Ainda, ampliado fotograficamente, existe outro mapa com as mesmas características do anterior, com escala gráfica em léguas, em que está firmado Serra de Meitre Aluauro (sic). Por serem bem semelhantes, tais mapas devem corresponder a uma mesma época, século XVII. Por que apresentam tanta variação de nomes no que diz respeito ao monte que nos interessa? Talvez descuido dos desenhistas-copistas ou dos cartógrafos ou das incertezas do nome da montanha já naquela época.
Na metade exata do século passado veio a lume a Carta Topográfica e Administrativa da Província do Espírito Santo, impressa por famosa gráfica da época, Garnier Irmãos, do Rio de Janeiro. Apesar dessa referência não há menção ao Mestre Álvaro. Por aí se pode sentir a precariedade da cartografia e dos levantamentos topográficos aqui realizados.
Ainda no século passado, ano de 1876, na escala 1:500.000, é impressa a Carta da Província do Espírito Santo pela Litografia Impressora de Rensburg, do Rio de Janeiro, onde estão consignados nomes locais tradicionais: Ponta de Tubarão e é claro, o Mestre Álvaro.
Um exemplo interessante é o da Planta da Província do Espírito Santo, datada de 1878, impressa na litografia do Rio de Janeiro. Nela consta a representação do Mestre Álvaro com um erro de cota máxima apreciável, 980 metros, quando sabemos hoje ser de 833 metros. Teria sido interessante se pudéssemos Ter incluído neste trabalho cópias reduzidas das cartas que analisamos, mas como isto não foi possível, como já frisamos, temos de nos contentar com essas pequenas observações.
No Mapa do Sul e do Centro da Província do Espírito Santo, publicado em dezembro de 1870, sem especificação da casa impressora, estão assinalados tanto o Mestre Álvaro como o Muchoua (Mochuara) sem citação de cotas. Devido ao despovoamento e à existência de matas virgens que havia no norte do nosso Estado àquela época, deixou-se de representá-lo cartograficamente.
Ainda dessa década de setenta do século passado tivemos oportunidade de analisar o mapa Província do Espírito Santo, de 1873, mandado litografar pelo conselheiro e ministro do Império João Alfredo de Oliveira. Trata-se de projeto de uma nova divisão do Império proposta pelo Deputado Cruz Machado. Como não podia deixar de ser, pela sua época recuada, é um documento cartográfico pobre de dados, nele não figurando o Mestre Álvaro.
Da década anterior compulsamos o documento cartográfico "Província do Espírito Santo" que fazia parte do Atlas do Império do Brasil, onde está assinalado o Mestre Álvaro com um erro de posição, uma vez que aparece junto ao Rio Reis Magos.
Da década de 50 do século XIX tivemos em mãos a Carta da Província do Espírito Santo, em que também é representada parte da Província de Minas, onde está figurado o Mestre Álvaro sem registro de cotas. Noutra carta da Província do Espírito Santo, obra de execução militar datada de 1854, está impresso o Mestre Álvaro em posição aparentemente correta, porém com a cota absurda de 4.500 pés, o que, evidentemente, dobraria a altitude do maciço.
Outro mapa da Província do Espírito Santo, cópia de outro mais antigo, datado de 1932, brinda-nos com um esboço da planta de Vitória do ano de 1764. O norte do Estado está representado como sertão desconhecido, não havendo também os limites precisos entre Minas Gerais e Espírito Santo. Encontra-se gravado o M. Mestre Álvaro.
Corria o ano de 1944, sendo interventor no Estado Jones dos Santos Neves, quando é organizado pelo saudoso professor Cícero de Moraes, um mapa do nosso território estadual, contendo a rede hidrográfica e cidades, além das vilas existentes àquela época. Mesmo pobre em dados nele está plotado o morro Mestre Alvo. A impressão ficou a cargo do IBGE, hoje FIBGE.
Na década de sessenta (1967), o Estado, em convênio com o IBGE, imprime um novo mapa geográfico, com curvas de nível, divisão político-administrativa, hidrografia, onde novamente está plotado e grafado o Mestre Alvo.
De bom nível técnico, a FIBGE publica em 1978 a Carta do Brasil, na escala 1:50.000, em várias folhas: naquela em que figura a área que nos interessa está grafado Mestre Alvo, com curvas de nível, na sua posição correta, com seu ponto culminante assinalado em 833 metros.
Para finalizar este item sobre cartografia queremos apenas lembrar que não só os parâmetros sócio-econômicos medem o desenvolvimento de um país ou de uma unidade federada como o PIB, a renda per capita, a produção industrial e agrícola, o número de telefones por habitantes, o número de automóveis por habitantes, a escolaridade da população etc., etc. A lista é longa. Não se pode ignorar que um país ou mesmo uma unidade federada, para planejar melhor e administrar convenientemente o seu território, precisa conhecer sua realidade, e isto é facilitado, sensivelmente, se existe uma boa e atualizada base cartográfica geral, aliada a uma segura cartografia temática e especial.
Hoje, e cada vez mais, empregam-se satélites artificiais que proporcionam meios rápidos e eficazes que permitem atualização constante das imagens por eles transmitidas, as quais posteriormente são transformadas em excelente material cartográfico. A partir da Segunda Guerra Mundial começaram a ser cada vez mais utilizados os levantamentos aerofotogramétricos, a princípio com finalidade militar, hoje, porém, com largo uso na esfera civil, levantamentos estes que se traduzem em indispensáveis trabalhos cartográficos de aplicação prática imediata.
4 - A situação do Maciço, hoje
O maciço do Mestre Álvaro está localizado no município da Serra, estando enquadrado nas coordenadas geográficas seguintes: Lat 20° 08' 32" e 20° 11' 28" S / Long 40° 07' 42" e 40° 19' 44" W
Está, portanto, dentro da região tropical litorânea brasileira, sendo sua cobertura vegetal pertencente à Mata Atlântica de Altitude, com grande variedade florística, hoje, infelizmente, bastante degradada pela ação do homem.
Quanto à fauna, estudos preliminares realizados por estudantes de Biologia da Ufes dão conta que havia em 1982, em suas matas, sagui da cara branca (Calithryx geofrogi), pacas, preás, caxinguelês — mamíferos; gambás, morcegos — marsupiais; japus, colibris, sanhaços, bem-te-vis, gaviões, corujas — aves; sapos, rãs, pererecas — anfíbios; cobras e lagartos — répteis; caranguejos, camarões, goiamuns — crustáceos; aranhas, escorpiões — aracnídeos.
Dezenove cursos d'água foram identificados, uns permanentes outros temporários e, sendo assim, não é de admirar que existam peixes, conforme permitam os riachos que descem as encostas, ora mais ora menos íngremes, havendo adaptações das várias espécies ictiológicas, conforme as condições das correntezas. Registrado está, por exemplo, a presença do bagrinho. Aliás, existe uma pequena pesquisa apresentada por professores da área de biologia da Ufes exatamente sobre a existência de algumas espécies em um dos cursos d'água do Mestre Álvaro.
Alguns autores consideram o Mestre Álvaro como sendo de composição gnáissica, outros tratam-no como granítico. Tal disparidade parece-nos provir do fato de que (considerando-se o conjunto da área que abrange Vitória e todo o seu entorno) a formação geológica desta região é uma colcha de retalhos de rochas de origem magmática e metamórfica, portanto constituídas de vários tipos de granitos e de gnaisses que se sobrepõem.
Em termos geomorfológicos, o Mestre Álvaro é um monadnock tipo härtling, ou seja, constitui-se numa elevação residual que ofereceu resistência ao trabalho erosivo em região de clima úmido. Sendo a constituição rochosa desse maciço mais resistente, foi portanto menos atacada pelos elementos erosivos. Pode-se também chamá-lo de morro testemunho.
Circundando a montanha estão a noroeste uma planície fluvial; ao sul e a sudeste a planície flúvio-marinha; e ao norte e nordeste estão os terrenos dos tabuleiros, terras mais elevadas e planas entre as quais está o chamado Planalto de Carapina.
O ponto culminante do maciço atinge 833 metros, estando assim cento e vinte e três metros acima do famoso Corcovado, da cidade do Rio de Janeiro.
Calculamos o perímetro do maciço, no seu sopé, sendo de aproximadamente 28km, o que representa a distância entre o centro da cidade de Vitória até a sede do município da Serra.
Não podemos deixar de mencionar, mesmo em poucas palavras, a área de preservação ambiental existente que cobre a montanha. Em nove de agosto de mil novecentos e setenta e seis, através da Lei 3.075, foi criado o Parque Florestal e Reserva Biológica Estadual de Mestre Álvaro, abrangendo uma área de 3.470,00ha. Em sete de janeiro de mil novecentos e noventa e um, pela lei 4.507 esta mesma porção de terras, ocupando grande parte dos terrenos do maciço, é transformada em Área de Proteção Ambiental Estadual de Mestre Álvaro.
A finalidade da criação de uma área desta natureza teve por escopo dotar a Grande Vitória de um importante sítio de lazer; humanizar o ambiente urbano da capital; guardar um acidente geográfico de conotação histórica, vez que ele é mencionado em textos desde os primórdios da colonização do solo espírito-santense; preservar a beleza cênica do maciço; resguardar a flora e fauna que fazem parte da Mata Atlântica; evitar danos aos sítios arqueológicos (sambaquis) ali existentes; integrar o maciço num plano turístico-educativo-recreativo; proteger as nascentes, os solos e, enfim, a ecologia local.
A bem da verdade, entretanto, é bom frisarmos que tais objetivos não estão sendo perseguidos, bastando dizer que nunca houve uma desapropriação de terras no local, nem foram colocadas em prática medidas eficazes para combater os abusos de pessoas que agridem os recursos naturais do lugar. As vistorias praticadas visam apenas não permitir que seja utilizado o fogo na destruição do verde. Os ocupantes podem plantar em toda a área já desmatada desde que não afetem as matas ainda existentes. De preferência devem cultivar produtos perenes (café, banana, etc.).
Observando-se fotos aéreas percebe-se que o maciço está bastante retalhado, dividido e erodido. A cobertura vegetal está entrecortada em todos os níveis por pastagens, culturas permanentes, capoeiras, macegas, rochas expostas.
A situação fundiária é caótica: há ocupantes com documentos de posse, outros com documentação de parte da área ocupada, mas sem documento da área restante e, enfim, há os que possuem documento definitivo há muitos anos. Segundo dados de fins da década de 70, havia 113 proprietários cadastrados (ITCF, 1983).
Por informações colhidas no órgão competente da realização de pesquisa, proteção e fiscalização de algumas das reservas florestais existentes no Estado (ITCF), inclusive da Área de Proteção Ambiental de Mestre Álvaro, fomos cientificados de que não existe nenhum fiscal permanente no local para executar o essencial, quando, na verdade, há necessidade de dez homens. Por aí se tem retratado o quadro lastimável da APA do Mestre Álvaro. Não há verbas nem plano de recuperação para atendê-lo.
5 - Conclusões e recomendações
Do que expusemos linhas atrás, concluímos que a população deixa de usufruir de um área por todos os títulos importante para o lazer, principalmente os habitantes da Grande Vitória que poderiam desfrutar, de modo educado e responsável, das belezas do Mestre Álvaro. Por que não embutir, em um plano de preservação da área, a instituição de cobrança de ingressos a preços módicos que reverteriam em favor da manutenção desta APA? Esta serviria também de local para desenvolvimento de programas didáticos de ciências naturais e mesmo para estudos científicos de fauna, flora e pesquisas arqueológicas. Ficaria deste modo preservado um monumento natural histórico, conforme já fizemos alusão neste texto.
Mesmo sem estrutura alguma e com todo o descaso das autoridades competentes, o Mestre Álvaro continua a ser visitado por muitas pessoas, mormente jovens, que se deslocam em grupos para apreciar a vista magnífica que o maciço proporciona, entrando em contato direto com a natureza, sentindo o frescor das matas que ainda resistem à depredação, dos córregos d'água que possuem seus peixes, dos animais que ainda restam, do ar puro que o envolve, dos sons dos elementos naturais que fazem bem a todos que vivem massacrados pelos ruídos ensurdecedores da vida urbana.
[COSTA, Ricardo Brunow. A propósito do Mestre Álvaro. Vitória: Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo/Prefeitura Municipal de Vitória, 1995. 92p. (Cadernos, vol.VI)]
Ricardo Brunow Costa é geógrafo formado pela UFRJ, tendo vários livros e artigos publicados. Para outras informações, consulte a listagem de pesquisadores. (Para obter mais informações sobre o autor, clique aqui)
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