Confina esta capitania pelo Norte com a Bahia, ao S. com o distrito de Campos de Goitacases, a Oeste com a capitania de Minas Gerais, a Lest...

Memória estatística da província do Espírito Santo no ano de 1817

Confina esta capitania pelo Norte com a Bahia, ao S. com o distrito de Campos de Goitacases, a Oeste com a capitania de Minas Gerais, a Leste com o oceano. Está situada na latitude Sul de 20°, 10', longitude 337°, 48'.

Segundo a primeira divisão de capitanias neste continente, principiava na ponta do Sul da barra do rio Mucuri, e com 50 léguas de costa de mar para o Sul, findava em Santa Catarina das Mós. Hoje a jurisdição de seu governo abrange 6 vilas e 6 povoações mais notáveis principiando pelo Norte no distrito do rio Doce que fica ao Sul das vilas de Mucuri e São Mateus terreno compreendido na sua demarcação.

Sua principal vila é a da Vitória; cabeça da comarca, tem seu assento em uma ilha montuosa quase duas léguas da barra; dentro forma uma baía estreita, mas capaz de navios grandes; na entrada há 8, 7, 6 braças; mais dentro 5; e acima da vila, junto à ilha do Príncipe, onde está a casa da pólvora, 30 e 40 braças. Seus ares são benignos; o terreno fértil produz todos os gêneros próprios do reino e da Europa, além de outros o trigo, e o trigo mourisco é de excelente qualidade, provado por repetidas experiências de 1813 em diante; 10 rios principais banham seu terreno; os campos alegres; as matas, ricas de toda a qualidade de madeiras de lei; nelas se encontram as delícias dos bálsamos, copaíbas, almocegas, e sassafrases que perpetuamente recendem. O ouro das minas de Santa Maria, vulgarmente chamadas do Castelo, é de superior quilate; há vestígios em diferentes lugares de minas de ferro; e na serra denominada do Mestre Álvaro, termo da vila da Vitória, minas de salitre e enxofre, assim como vulgarmente se diz que nas cachoeiras do rio Jeuí.[ 1 ] para o sertão se encontram pedras preciosas.

Por carta de doação e sucessão do sr. dom João III, rei de Portugal, foi dado o senhorio desta capitania a Vasco Fernandes Coutinho pelos bons serviços que havia feito na Índia, com obrigação de a povoar e aproveitar seu terreno em lavouras e fábricas.

Passou de Portugal, abordou a esta no domingo do Espírito Santo do ano de 1525, e por motivo do dia assim a denominou. Ancorou na primeira enseada, meia légua acima da barra e o gentio da nação Aimoré, armado de arco e frecha se ajuntou em grande número para defender o desembarque na praia; porém o fogo de duas peças de artilharia que guarneciam as lanchas os fez retirar para o interior. Esta nação descendo da cordilheira de montes, que começando na capitania dos Ilhéus com o nome de serra dos Aimorés, e atravessando as de Porto Seguro, e desta vão por perto de 150 léguas acabar na enseada do Rio de Janeiro, onde lhes chamam serra dos Órgãos, a conquistaram a seus primeiros possuidores os gentios Tupinanquins e Tupinais, e as ficaram possuindo até ao tempo da nossa conquista.

Feito o desembarque, se fortificou e fundou a vila do Espírito Santo, não consta em que ano, nem do tempo que nela fez sua residência, nem da fundação do convento dos religiosos Beneditinos, santa casa da misericórdia o alfândega. Hoje destes edifícios apenas se vêm os alicerces. Consta, por tradição, que Vasco Fernandes Coutinho vendo-se de contínuo inquietado pelo gentio, ajuntara suas forças, expulsara-o da maior ilha que havia na baía, uma légua acima da vila, e nela se estabelecera e fundara a vila denominada da Vitória, tendo neste lugar alcançado a maior vitória o por isso como em troféu assim a denominou. Não consta o ano destes acontecimentos, porém sim, que no ano de 1551 o padre Afonso Brás, da companhia de Jesus, um dos quatro mandados por dom João III para a Bahia em 1550, deu princípio a fundar o colégio na vila da Vitória, no qual foi sepultado o venerável padre José de Anchieta em 9 de Julho de 1597, e hoje serve de casa da residência do governador, o que prova já neste ano estar fundada a vila.

O convento de Nossa Senhora da Penha, assentado no morro vizinho da vila do Espírito Santo, teve princípio em 1558, vindo a esta, frei Pedro Palácios,[ 2 ] religioso leigo da província da Arrábida de Portugal, nacional de Medina do Rio Seco, cidade do reino de Leão na Espanha. Este edificou uma capelinha no cume do morro, colocando nela a imagem da Senhora, que consigo trouxera, criou uma confraria, faleceu em 1570, e foi sepultado debaixo do alpendre. Consta que estando os moradores desta em grande aperto pelo cerco em que os tinha o gentio, e de quem recebiam grandes hostilidades e temiam maiores ruínas, Vasco Fernandes Coutinho pedira auxílio a Mem de Sá, governador e capitão-general do estado, e este lho enviou por seu filho Fernando de Sá que, vencendo os bárbaros e assegurando estes moradores, perdeu a vida.

Contudo, a muita perda de gente que lhe havia causado as guerras com o gentio fez retirar a Vasco Fernandes Coutinho para Portugal no ano de 1559, ficando esta capitania quase despovoada; porém não consta se voltou e só sim que seu filho Vasco Fernandes Coutinho já estava de posse desta em 1565, pois neste ano deu auxílio de gente o mantimento a Estácio de Sá, sobrinho de Mem de Sá, governador e capitão-general do estado, para expelir os Franceses e os índios Tamoios seus aliados da enseada e ilha de Villegagnon. Desta gloriosa ação se seguiu o fundar-se a cidade de S. Sebastião no Rio de Janeiro. Tornou a dar a quem logo os aproveitasse os terrenos concedidos por seu pai de sesmaria, que se achavam devolutos por causa das surpresas do gentio. Levantaram-se grandes fábricas de açúcar, das quais hoje existem vestígios: floresceu muito o comércio direto com Portugal. Faleceu nesta em 1589 sem sucessão. Sua mulher dona Luísa Grinalda ficou governando com seu adjunto Miguel de Azevedo, capitão de ordenanças. Seu marido havia pedido para Pernambuco ao padre Custódio da província de Santo Antônio de Portugal frei Belchior de Santa Catarina lhe mandasse religiosos para fundarem na vila da Vitória um convento. Chegaram no ano em que havia ele falecido; e sua mulher lhes concedeu terreno para fundarem o convento no lugar em que hoje existe. Em 6 de Dezembro de 1591 dona Luísa Grinalda e as câmaras das vilas do Espírito Santo e Vitória fizeram doação do cume do morro e capelinha de Nossa Senhora da Penha aos religiosos menores Capuchos.

Constando a dona Luísa Grinalda que se havia adjudicado o direito de senhorio si desta capitania a Francisco de Aguiar Coutinho, retirou-se para Portugal em 1593, ficando governando com patente de capitão-mor Miguel de Azevedo. Este ajuntou em 1594 toda a gente possível, e foi atacar os índios Goitacases, que tanto dano faziam com suas surpresas. Deste ataque resultou haver menos estragos de gentio. Não consta a fundação da igreja da Santa Casa da Misericórdia, porém do alvará do 1ª de Julho de 1604 de Felipe II rei de Castela, em que lhe concede os mesmos privilégios da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, se vê que sua fundação foi mais antiga. O donatário Francisco de Aguiar Coutinho tornou posse em 15 de Julho de 1620. Em Março de 1625 deu fundo na barra uma armada holandesa de 8 velas. Fizeram seu embarque e se fortificaram em diferentes portos da costa e ilhas. Nos dias 12 e 14 atacaram a vila e foram repelidos, de que resultou retirarem-se vergonhosamente. Não consta o nome do comandante holandês, detalhes destes combates, nem quais foram os Portugueses que mais se distinguiram; e só consta que a câmara por muitos anos no dia 6 de Agosto fazia uma festa em ação de graças pela vitória alcançada aos Holandeses.

Sendo capitão-mor governador João Dias Guedes, talvez por haver falecido Francisco de Aguiar Coutinho, tomou posse em 15 de Julho de 1643. No dia 27 de Outubro de 1640 deu fundo na barra o ministro holandês, João Délihi com uma esquadra de 11 velas: no dia 29 subiu com um navio, uma barcaça, dois batelões,[ 3 ] o sete lanchas guarnecidos com 800 infantes,[ 4 ] o atacaram a vila da Vitória em diferentes pontos. O capitão-mor havia disposto suas forças para os repelir, as quais consistiam em 30 armas do fogo, duas peças de artilharia, duas companhias de índios com arcos o frechas, e o resto do povo com chuços o piques. No primeiro desembarque perderam os Holandeses 200 homens; porém conseguiram entrar na vila, e o ataque se tornou geral, e durou por espaço de 4 horas com alternativas; por fim a vitória se declarou pelos Portugueses, e o resto dos Holandeses se recolheu às suas embarcações. Merece ser recomendado à posteridade o valor com que se conduziu Antônio do Couto e Almeida; motivo pelo que foi pelo governador e capitão-general Antônio Teles da Silva nomeado capitão-mor e confirmado por carta de 26 de Julho de 1643.

No dia 30 fizeram os Holandeses seu desembarque na vila do Espirito Santo. No primeiro ataque que lhe deram as ordenanças comandadas por seus capitães Adão Velho o Gaspar Saraiva perderam 26 homens; porém vendo os Portugueses que os inimigos eram em maior numero se retiraram para o interior; o que sabido pelo capitão-mor lhe mandou reforço a que se uniram; no terceiro dia deram sobre os Holandeses que os fizeram embarcar, deixando 32 prisioneiros. No dia 13 de Novembro se fizeram de vela deixando a glória aos Portugueses de os haver batido e destroçado com tão diminutas forças, o que sempre foi brasão da nação.

Na família dos Coutinhos se conservou o senhorio desta capitania até Antônio Luiz Gonçalves da Câmara Coutinho, que obtendo alvará de licença para os poder renunciar, datado de 6 de Julho de 1674 o fez na pessoa de Francisco Gil de Araújo, morador na Bahia. Este teve carta de doação régia, datada de 18 de Março de 1675. Residiu alguns anos nesta, trazendo da Bahia muitos casais, doando-lhes terras para lavrarem e a todos os moradores assistiu com cabedal considerável para fornecerem os seus engenhos e lavouras que avultaram por esta causa muito naquele tempo.

Criou a vila de Guarapari junto à foz do rio do mesmo nome por carta de 1ª de Janeiro de 1679. Seu porto é só capaz para sumacas.[ 5 ]

O convento da invocação de Nossa Senhora do Carmo dos religiosos carmelitas calçados não consta da sua fundação, porém em 1682 estava fundado, e era vigário do convento frei Agostinho de Jesus.

Francisco Gil de Araújo faleceu na Bahia a 24 de Dezembro de 1685. Seu filho Manoel Garcia Pimentel teve carta de doação por sucessão de 5 de Dezembro de 1687. Não passou a esta, ocupado com as importantíssimas propriedades que lograva na Bahia.

No ano de 1693, sendo capitão-mor João de Velasco Molina, desceu à vila da Vitória da casa da Caria, nome de uma aldeia sobre a margem do Rio Doce, distrito da capitania de Minas Gerais, Antônio Rodrigues Arzão, natural da vila de Taubaté, da capitania de São Paulo, e fez perante o capitão-mor e a câmara denúncia de 3 oitavas, que por ser o 1ª denunciado no Brasil e tirado das minas se fizeram duas medalhas, ficando uma ao capitão-mor, outra ao dito Arzão. Em 1702, por ordem de dom Rodrigo da Costa, governador e capitão-general do estado, se levantou a fortaleza de São Francisco Xavier da barra da baía do Espírito Santo.

Falecendo sem sucessão legítima o donatário Manoel Garcia Pimentel, foi adjudicada por sentença da relação da Bahia a Cosme Rolim de Moura, a quem a comprou o rei dom João V, por escritura feita em Lisboa aos 6 de Abril de 1718; mandando-lhe dar por ela a quantia de 16:000$000 réis, que Francisco Gil de Araújo havia dado a Antônio Luiz Gonçalves da Câmara Coutinho. Esteve a capitania em poder dos donatários 193 anos.

Sendo neste tempo governada pelo capitão-mor João de Velasco Molina, que havia tomado posse em 13 de Setembro de 1716, continuou até que lhe sucedeu, no 1ª de janeiro de 1721, Antônio de Oliveira Madail com patente de capitão-mor e governador subalterno do governo da Bahia. Por provisão do conselho ultramarino datada de 19 de Abril de 1722, ficou esta capitania sujeita à jurisdição do ouvidor do Rio de Janeiro no foro judicial.

Constando ao capitão-mor Madail que Domingos Antunes, natural da cidade do Porto, casado na vila da Vitória, se havia com sua família estabelecido próximo do rio São Mateus, distrito desta capitania, e que seu terreno era fértil; por bando de 3 de Outubro de 1722 concedeu faculdade a todo o morador desta capitania para poder ir povoar aquele lugar com sua família, e persuadido da conveniência que resultaria ao real serviço de se povoar as margem deste rio, mandou, para animar mais a ida dos novos colonos, aprontar embarcações para os conduzir grátis. Na primeira expedição foi Antônio Gomes da Fonseca com 4 pessoas da sua família, Sebastião Lopes com 6; Manoel de Souza com 3; Antônio Mendes de Vasconcelos com 10; e Antônio Borges com 1 escravo. Deu provisão de nomeação de capitão-mor, na conformidade do seu regimento, a Antônio Vaz da Silva; e a câmara da vila da Vitória nomeou juiz da vintena a Antônio da Rocha Cardoso. Consta que em 1743 ainda esta povoação estava sujeita à jurisdição deste governo. Hoje está ao governo da Bahia, pertencendo à comarca de Porto Seguro, sem que nesta conste ordem régia, ou do governador e capitão-general da Bahia para esta separação.

O conde de Sabugosa, vice-rei do estado em 1726, mandou da Bahia para esta o engenheiro Nicolau de Abreu para fazer as precisas fortificações na vila da Vitória, levantando-se a fortaleza de São João na garganta que faz a baía acima da vila do Espírito Santo, e os fortes de Nossa Senhora da Vitória, de Nossa Senhora do Carmo, Santo Inácio e São Diogo; hoje destes só existe a fortaleza de São João.

Foi criada a comarca do Espírito Santo pelo ouvidor Pascoal José de Melo, que tomou posse em 3 de Outubro de 1741, e na demarcação que lhe fez uniu as vilas de São João e São Salvador de Campos de Goitacases.

Foram criadas vilas, pelo alvará de 8 de Maio de 1758, a aldeia dos índios dos Reis Magos com a denominação — Nova Almeida; e pelo alvará de 1º de Janeiro de 1759, a aldeia dos índios de Iriritiba, com a denominação de Benevente, ambas beira-mar, sendo seus portos só capazes de pequenas embarcações.

O marquës do Lavradio, governador e capitão-General da Bahia em 1768, mandou a companhia de linha denominada do Pinto do regimento de Alvim, para que unida à infantaria desta capitania formasse uma companhia de 90 infantes. Em data de 29 de Janeiro de 1788 determinou Dom Rodrigo José de Menezes, governador e capitão-general da Bahia em virtude da carta régia de 22 de Março de 1766 se criasse nesta um regimento de infantaria de milícias, e se lhe agregasse duas companhias de cavalaria. Organizado em 1789, foi nomeado coronel-comandante Inácio João Monjardim, capitão-mor governador desta capitania. Dom Fernando José de Portugal, governador e capitão-general da Bahia, por ordem de 27 de Agosto de 1793 regulou a companhia de infantaria de linha com 114 praças. Por outra de 17 de Agosto de 1798 mandou criar o hospital militar, executada pelo capitão-mor governador Manoel Fernandes da Silveira. A este sucedeu com patente de governador subalterno do governo da Bahia em 29 de Março de 1800, Antônio Pires da Silva Pontes. Foi esta capitania governada por capitães-mores depois da compra que sua majestade fez, 82 anos.

Antônio Pires da Silva Pontes, em observância do aviso de 29 de Agosto de 1798 de dom Rodrigo de Souza Coutinho, ministro e secretário de estado dos negócios da marinha e domínios ultramarinos, que manda observar nesta a carta régia de 12 de Maio de 1798, dirigida a dom Francisco de Souza Coutinho, governador e capitão-general do estado do Pará, criou o corpo de pedestres em 4 de Abril de 1800 e formou deste o destacamento do porto de Souza no distrito do rio Doce para servir de registo, e evitar as surpresas do gentio antropófago. Regulou de acordo com o governador e capitão-general da capitania de Minas Gerais Bernardo José de Lorena pelo auto celebrado em 8 de Outubro de 1800, os limites desta capitania com a de Minas no rio Doce.

A este sucedeu em 17 de Dezembro de 1804 Manoel de Albuquerque e Tovar. Durante este governo por decreto de 4 de Junho de 1807, foi anexado o posto de coronel-comandante do regimento de infantaria de milícias ao governador desta capitania; e pela carta régia de 28 de Maio de 1809 foi criada a junta da administração e arrecadação da real fazenda, abolida a provedoria, e, no que respeita à fazenda, independente da Bahia. Em Outubro de 1809 deu a denominação de Linhares ao lugar em que se havia de levantar a povoação do rio Doce, e estabeleceu a linha de destacamentos contra o gentio em toda a capitania.

Por decreto de 18 de Agosto de 1810 foi criado um batalhão de artilharia miliciano, organizado no 1o de Dezembro do mesmo ano: e ficou esta capitania quanto ao militar independente da Bahia por decreto de 13 de Setembro de 1810.

Teve por sucessor Francisco Alberto Rubim em 6 de Outubro de 1812, com patente, sem ser sujeito ao governador e capitão-general da Bahia, sujeito ao qual haviam estado os governadores desta por espaço de 12 anos.

Durante este governo, e em 15 de Fevereiro de 1813, foram situados os primeiros casais na povoação que criou, e denominou de Viana, no sertão da margem do Norte do rio Santo Agostinho, termo da vila da Vitória, vindo os casais das ilhas dos Açores remetidos de ordem de sua majestade pelo intendente geral da polícia Paulo Fernandes Viana.

Pela carta régia de 17 de Janeiro de 1814 foi autorizado este governo para conceder terrenos por sesmarias. Em 14 de Setembro de 1814 se rompeu o sertão intermédio desta capitania com a de Minas Gerais, ficando uma estrada de comunicação da cachoeira do rio Santa Maria, termo da vila da Vitória, à Vila Rica, da capitania de Minas Gerais, para cujo rompimento havia o governador dado instruções e ordens ao capitão do corpo de pedestres Inácio Pereira Duarte Carneiro.

Pela provisão do conselho supremo militar de 14 de Agosto de 1815 foi este governo autorizado para passar patentes aos oficiais de ordenanças. Em 15 de Dezembro de 1815 lançou o governador a primeira pedra para a edificação da igreja na povoação de Viana, que dedicou a Nossa Senhora da Conceição. As cartas régias de 4 de Dezembro de 1816 dirigidas ao governador e capitão-general da capitania de Minas, e ao governador desta capitania, aprovam o auto da divisão e demarcação de 8 de Outubro de 1800, e marca a linha divisória pelo sertão entre as duas capitanias. A provisão do real erário de 5 de Março de 1817 manda fazer pelo cofre da junta a despesa para uma igreja matriz em Linhares, distrito do rio Doce, e teve princípio em 13 de Setembro do mesmo ano. Por provisão do bispo diocesano e capelão-mor dom José Caetano da Silva Coutinho, foi nomeado capelão, curado independente da igreja da povoação de Viana, frei Francisco do Nascimento Teixeira, religioso do convento de Santo Antônio da província da Conceição. Por decreto de 23 de Dezembro de 1817 foi sua majestade servida mandar criar na vila da Vitória um hospital debaixo da inspeção da mesa da Santa Casa da Misericórdia, confirmando as doações e donativos oferecidos para seu estabelecimento.

Breve estatística

Pela parte Norte do distrito do rio Doce está demarcado pelo sertão com a capitania de Minas Gerais pela carta régia de 4 de Dezembro de 1816 pelo espigão que corre de Norte Sul entre os rios Guandu e Amanaçu, sendo do dito espigão para o rio Guandu águas vertentes o distrito da capitania do Espírito Santo; servindo-lhes outrossim da parte do Norte do rio Doce de demarcação a serra que está defronte do quartel do porto de Souza.

Beira-mar com a capitania da Bahia não tem porto determinado, porque segundo a primeira divisão de capitania neste continente, principiava esta na parte Sul do rio Mucuri, onde finalizava a capitania de Porto Seguro dada por Dom Pedro II a Pedro de Campos Tourinho, ao Sul fica a vila de São Mateus, e ao Sul desta o distrito do rio Doce.[ 6 ]

O quartel do rio do porto de Souza está na parte do Sul do rio Doce, duas léguas abaixo da foz do rio Guandu que entra no mesmo por baixo do último degrau das cachoeiras das Escadinhas. O quartel se acha guarnecido com um inferior e 11 soldados do corpo de pedestres. Do quartel segue pelo sertão uma estrada para a capitania de Minas Gerais, e atravessando o rio Guandu vai até ao quartel do registo da dita capitania, denominado quartel de Lorena, cuja estrada tem de distância três léguas e nela as precisas pontes e estivas[ 7 ] por onde descem os Mineiros com os seus gêneros até junto ao quartel do porto de Souza e onde se embarcam em canoas para descer o rio Doce até à povoação de Linhares; ali fazem as suas transações e voltam com sal, descendo o rio Doce do quartel do porto de Souza até à foz do rio Santa Joana, que fica na margem do Sul a 5 léguas; desta à foz do rio Pancas que fica na margem do Norte, duas léguas e meia defronte da qual fica a ilha do mesmo nome, que tem de comprido três quartos de légua. Desta ao quartel de Anadia, situado na margem do Sul duas léguas e três quartos, cujo está guarnecido com 1 inferior e 7 soldados do corpo de pedestres. Deste à povoação de Linhares que fica na parte do Norte 11 léguas e meia.

Esta povoação está situada em uma muito alta barreira em forma de meia lua para o rio Doce, superior a todos os terrenos que a rodeiam, porque são várzeas ou planícies na distância de muitas léguas, e por isso não obstante achar-se ainda inculta por todos os lados é da mais aprazível vista que pode imaginar-se, principalmente a do rio, que por ser largo e estar cheio de grandes ilhas e outras mais pequenas representam ao longe grandes e pequenas diferentes embarcações. Todas elas são férteis como todos o terreno firme, cuja produção é tão prodigiosa que os que plantam um alqueire colhem 200, tendo mais a vantagem de que ao mesmo tempo que todos os lavradores dos mais distritos desta capitania lamentam o incalculável estrago que lhes causa a formiga, estes se alegram por não terem encontrado uma só em suas lavouras. O que se pode asseverar é que a natureza parece se esmerou em fazer apetecível todos os terrenos deste distrito, sendo de lamentar que o gentio ou índios Cuités vulgarmente chamados Botocudos ou Gamelas, pela extravagância com que furam o beiço inferior e as orelhas, em cujos buracos metem grandes rolhas, sejam os que estejam utilizando da sua formosura e da sua fertilidade. Tem a povoação 57 fogos[ 8 ] e 305 almas; nela há um hospital militar com um cirurgião-mor e os medicamentos precisos. Há 1 alferes do corpo de pedestres, comandante de toda a linha de destacamentos do distrito, e que mensalmente os visita. Está-se-lhe edificando uma igreja matriz com o orago de Nossa Senhora da Conceição. Tem 1 quartel denominado primeiro quartel de Linhares, guarnecido com 1 inferior e 18 soldados do corpo de pedestres. Há nesta povoação um grande cercado de muito bom pasto, onde os moradores lançam seu gado vacum sem prejuízo algum da parte do gentio por estar todo entrincheirado de mataria grossa derribada: esta mesma trincheira continua até ao quartel denominado segundo quartel de Linhares na distância de quase uma légua, vindo a ficar este sobre a lagoa de Juparanã.[ 9 ] Está guarnecido com um inferior, 11 soldados pedestres, cobrindo assim as plantações dos habitantes, as quais ficam igualmente defendidas por um lado com a trincheira, e pelo outro com o rio da lagoa que deságua no rio Doce, tendo ao mesmo tempo a vantagem de ficarem com a povoação em uma ponta, e com o quartel na outra, comunicando-se com uma estrada que vai atravessar pela testada de toda a plantação, e do outro lado desta estrada para o sertão se fez uma derrubada para servir de trincheira, e nela girarem as rondas militares até à povoação, a fim de que o gentio não penetre nas lavouras com facilidade. Do lado do Norte da povoação em distância de légua e meia está a grande lagoa de Juparanã abundantíssima de peixe: esta se comunica por um rio do mesmo nome com o rio Doce, e é tão grande que tem em si uma ilha em que se recolhem os pescadores todo o tempo que não gastam no exercício da pesca. Na margem do rio do lado do Sul, defronte da povoação, está a fazenda denominada Bom-Jardim, com engenho de açúcar, fábrica de farinha de guerra, olaria onde se faz famosa telha e tijolo. O dono dela é João Felipe de Almeida Calmon, branco casado e nela vive com 22 pessoas. Desta fazenda segue uma estrada que finaliza no quartel de Aguiar, a qual tem 4 léguas de comprido e 30 palmos de largo com 3 pontes fortes, e por ela podem facilmente carregar todos os gêneros de importação e exportação para saírem pela barra do Riacho, uma vez que não queiram transportá-los pela do rio Doce. Tem de mais esta estrada a vantagem para os viandantes, que da capitania seguem suas jornadas para aquele distrito ou para a capitania da Bahia, não terem de dar uma volta de 8 léguas pela praia para chegarem à povoação de Linhares. Da povoação de Linhares à barra do rio Doce na margem do Norte tem 8 léguas. Acima se acha estabelecido com lavouras e gados Antônio José Martins, homem branco, casado, com uma família de 16 pessoas. Da casa deste segue pela costa do mar a estrada geral desta capitania à da Bahia, ficando distante 4 léguas o quartel de Monsarás, guarnecido com 1 inferior e 5 soldados pedestres, o qual serve de registo.

A barra do rio Doce não tem outro embaraço mais do que a sua corrente, violenta em tempo das águas, e neste tempo por espaço de quase légua se vê correr a água clara do rio por entre o azul do mar. O rio dentro é muito largo a modo de baía e pode navegar-se por ele acima em barcos e canoas mais de 20 léguas: na barra podem entrar sumacas e maiores embarcações quando a corrente não for tão violenta. Tem piloto-mor da barra por nomeação régia de 12 de Janeiro de 1818.

Da fazenda Bom-Jardim, situada em frente de Linhares, à margem do Sul do rio Doce tem 8 léguas. Neste lugar está o quartel da Regência Augusta guarnecido com 1 inferior e 4 soldados pedestres. Deste para o Sul pela costa do mar ao quartel do Riacho são 4 léguas, e é o quartel guarnecido com 1 inferior e 4 soldados do corpo de pedestres, e serve de registo para o interior desta capitania. Dele, subindo o rio do mesmo nome, está em distância de pouco mais de 3 léguas o campo do Riacho ou aldeia dos índios com 200 almas, que ora vivem neste lugar, ora junto ao quartel de Aguiar. Seguindo 3 quartos se acha a lagoa do mesmo nome. Desta para o Sul está a lagoa Dourada em distância de duas léguas e meia da primeira da parte do Norte, e ao Sul do rio Doce está o quartel de Aguiar, o qual fica 4 léguas para o sertão, e quase na altura da povoação de Linhares, guarnecido com 1 sargento-mor de ordenanças e 16 soldados índios.

Deste principia a estrada que sai defronte de Linhares, de que acima se tratou. No mesmo rio do Riacho deságua o rio dos Comboios, e 3 léguas para o sertão se acha o quartel do mesmo título, guarnecido com 1 inferior e 2 soldados pedestres. Não há em todo este distrito igreja alguma senão a matriz que se está edificando, nem outro algum lugar ou povoação.

Conta muitas lagoas largas e extensas, que têm sido descobertas em ocasiões de entradas para atacar o gentio, assim como alguns rios; mas por falta de gente se não tem podido ver onde vão desaguar as primeiras, e a foz e direção dos segundos. Em 1817 teve 16 batizados, 18 óbitos e 6 casamentos. No Riacho, onde finda o distrito do rio Doce, começa o da vila de Nova Almeida, cujo distrito, na criação da mesma vila, foi demarcado pelos limites da sesmaria que naquele lugar fora dada aos índios pelo donatário desta capitania no ano de 1610.

Tem de Norte a Sul 12 léguas com 6 para o sertão; porém depois da formação do quartel do Riacho ficou pertencendo para o Norte ao dito destacamento. Ao Sul do Riacho 3 léguas está situada a Aldeia Velha porto de mar, que admite sumacas formado pela confluência dos rios Piraquê-açu e Piraquê-mirim, que corre mais ao Norte, os quais se unem pouco antes de chegar ao mar. De um e outro lado do rio da Aldeia Velha, e nos seus braços se acham dispersos pelas suas margens os habitantes desta aldeia. Tem somente 17 fogos e 34 almas por ficar desamparada depois que os índios passaram para Vila Nova. Na margem do rio Piraquê-açu, caminho de 4 léguas desde a barra da Aldeia Velha, está a povoação de Piraquê-açu com 59 fogos e 373 almas.

Ao Sul da Aldeia velha, duas lagoas, fica a vila de Nova Almeida, a qual dista da da Vitória 7 léguas, situada em um lugar alto, sobranceiro ao mar. Corre junto a ela um pequeno regato chamado Piraém, e pelo Norte o rio de Sananha, por cuja barra, por ser de pequeno fundo, só entram lanchas. Há na vila um convento que foi dos extintos jesuítas, cuja igreja serve de matriz e tem por orago os Reis Magos, e parte do convento serve de residência aos vigários, e parte de casa da câmara e aposentadoria. Tem 175 fogos e 579 almas. Teve em 1817 200 batizados, 180 óbitos e 53 casamentos.

À meia distância entre esta vila e Aldeia Velha fica o lugar chamado Frecheiras, onde há uma engenhoca; e para o Sul próximo à vila, a Capuba onde há outra. A estrada geral corre junto ao mar ou próximo a ele. Há outra estrada desta vila para a freguesia da Serra, distrito da vila da Vitória, na qual já 3 engenhos, a saber: na Ladeira Grande, no Rio Novo e no Jacaraípe, que divide o distrito da vila de Nova Almeida do da Vitória. Da barra do rio Jacaraípe, em que só entram canoas, que, como fica dito, limita-se pelo Sul; o distrito da vila de Nova Almeida, e pelo Norte o da Vitória, a povoação da Serra são 3 léguas, e desta à margem do Norte do rio de Santa Maria, onde finda a compreensão da mesma freguesia, duas e meia, cujo orago é Nossa Senhora da Conceição da Serra, e foi esta freguesia desmembrada da de Nossa Senhora da Vitória em 1752. Esta povoação está debaixo do morro da Serra conhecido dos navegantes pelo Mestre Álvaro, o qual, por ser sobranceiro a todos os mais, lhes serve de baliza quando vindo do Norte procuram a barra da vila da Vitória. Tem de distância o distrito da freguesia desde a barra do Jacaraípe Norte Sul até a margem do Norte do rio de Santa Maria 5 léguas e meia, e de largura duas. Tem 23 engenhos de fabricar açúcar denominados Guaranhum, Cavada, Muribeca, Laje, Tabuleiro, Pesqueiro, Bettes, Dois, Campo do Morro, Morro, Calhaia, Porto de Jacaraípe, Santa Rita, Enseada das Pedras, Enseada Larga, Limeiras, Cachoeira, Prejura, Jacuí, Tacobaia, Dois, Pontal da Enseada Larga, e Vera; e 14 engenhocas denominadas Córrego das Pedras, Caiambola, Jacaraípe, Jumnem, Dois, Jum, Queimado 4, e Tramirim 4. Tem 317 fogos, com 2.422 almas. Em 1817 teve 84 batizados, 51 óbitos e 40 casamentos. Da freguesia da Serra à vila da Vitória são 7 léguas, e pela costa de mar, estrada geral, 6, desde a barra de Jacaraípe, onde há uma boa ponte, e, uma légua antes da vila, se atravessa outra chamada de Maruípe, que tem de comprimento 60 braças, construída há 18 anos sobre um braço do rio do Espírito Santo, que cerca a ilha em que está a vila da Vitória.

Até este ponto e em todo o mais terreno da ilha em torno da vila, tem uma igreja e um pomar no lugar de Carapina, 2 engenhos de açúcar, um nos Cardosos, outro em Carapina, e 4 engenhocas na parte dos Fachos, Bisanga, Camburi e Carapina. Tem 197 fogos com 2.493 almas.

A vila da Vitória, capital deste governo, terá de latitude 400 braças e de longitude 200 para 300: está situada em uma ilha de mais de 4 léguas de circunferência numa ponta do Monte Vigia, à margem do Norte do rio Espírito Santo, o qual, cercando a mesma ilha, faz barra em distância de uma légua no grande Oceano, e admite nelas galeras e bergantins;[ 10 ] oferecendo em toda esta distância que está povoada de ilhas capazes para grandes fortalezas, excelentes ancoradouros para muitas embarcações, abrigados de todos os ventos à exceção somente do Leste, que raras vezes aparece. Em toda a vila se aporta em canoas e escaleres[ 11 ] com a maior facilidade, porém seus primeiros desembarques são o cais novo das Colunas, que fica abaixo da casa do governo e do Azambuja; o cais Grande, onde até atracam sumacas; o do Santíssimo, o do Batalha, e o dos extintos jesuítas, vulgarmente chamado Porto dos Padres.

Tem esta vila uma freguesia do orago de Nossa Senhora da Vitória, que lhe dá o nome, a igreja do colégio dos extintos jesuítas contígua à casa do governo, e defronte desta a da Santa Casa da Misericórdia. Tem dois conventos, São Francisco e Carmo e 6 igrejas mais, inclusive as duas capelas das ordens terceiras dos ditos conventos. Tem uma junta de administração e arrecadação da real fazenda; duas fortalezas, Carmo e São João, e esta com 3 baterias, 2 corpos de tropa de linha, a companhia de infantaria de linha com 116 praças aquartelada na fortaleza do Carmo e o corpo de pedestres com 300 praças comandado por um tenente-coronel, cujo corpo está dividido por diferentes quartéis em todos os sertões da capitania para defender seus habitantes das incursões do gentio. Tem mais 3 corpos milicianos, o regimento de infantaria com duas companhias de cavalaria anexas, o batalhão de artilharia com um excelente parque de campanha, e a companhia de Henriques, é verdade que formados estes corpos com soldados também do termo. Tem um hospital regimental militar para a tropa de linha. Tem um professor régio de gramática latina, e outro das primeiras letras; e além destes 3 mestres mais que as ensinam. Tem 3 fontes de excelentes águas; a da Capixaba e a da Lapa, nas extremidades da vila, e a Fonte Grande quase no centro. Tem 945 fogos com 4.245 almas. Ainda que não rica é contudo assento do governo e cabeça da comarca. Sua perspectiva é bastantemente elegante, suas casas pela maior parte são de sobrado, e reformadas rodas por um só gosto à moderna. Os homens, se ocupam no comércio, para o qual possuem embarcações costeiras, e nos diferentes ofícios, e as mulheres em cozer e fiar.

Pelas costas da vila fica o rio Santa Maria, que desemboca no do Espírito Santo, povoado desde sua foz até a sua cachoeira, que são 6 léguas, compreendendo esta extensão até a barra do rio Cariaina também no do Espírito Santo, meia légua abaixo do de Santa Maria, 4 engenhos de açúcar, a saber: Pirau, Trapuchas, Asca e Una, e 10 engenhocas; e 347 fogos com 2.262 almas. Deságuam neste rio os de Mangaiari e Mulundú povoados de lavradores, e o de São Miguel nas cabeceiras do qual se estão estabelecendo vários lavradores, e já ali se acham em meia légua do terreno 17 fogos e 163 almas. Desde a cachoeira de Santa Maria, onde principia a nova estrada para Minas, desce por sua margem uma estrada que depois entranha-se pelo interior, e vem sair com 6 para 7 léguas à barra de Cariacica, de onde vai ao porto de Itacibá com pouco mais de uma légua, e ali se faz passagem para a vila, cuja estrada é aberta para facilitar a jornada daqueles Mineiros, que não querendo embarcar-se na cachoeira de Santa Maria seguem com suas tropas para o porto de Itacibá. Da barra do rio de Cariacica, pela margem do do Espírito Santo ao porto de Itacibá é pouco mais de uma légua, e deste porto pela margem do Sul, da vala que vem do rio Jem, e faz barra pouco abaixo do mesmo porto, e depois pela margem daquele à foz do rio Santo Agostinho serão 6 para 7 léguas, e tem em toda esta extensão 20 engenhos de açúcar denominados Santa Ana, dito; Maricará; Jem, dito; Buaiairas; Ladeira Grande, dito; Jacaroaba, Paú, Itapoca, dito; Campo Grande, Tanque, Caçarosa, Calabouço, Piranema Pequena, Piranema Grande, Capoeiraçu e Guaiamum e 12 engenhocas — Guaiamum, 2; Camarás, 2; Frechal, Cangaíba, Tambataí, Cariacica, Maricará, Rosas Velhas, Cachoeira, Campo Grande e Itacibá. Tem 3 igrejas de particulares, duas em Jem e uma em Piranema Grande. Tem 249 fogos com 2.341 almas.

Em distância de 4 léguas do porto de Itacibá, defronte da vila, são os sertões de Santo Agostinho, nos quais está situada a povoação do Viana, de ilhéus mandados estabelecer em culturas pelo governo, cuja povoação se acha o mais brilhante possível. É defendida por 4 quartéis, guarnecidos com 34 soldados pedestres, comandados por um alferes, dois nas suas extremidades para lhe servir de registo, e dois no sertão, em altos montes, a fim de vigiar e a defender das incursões e roubos dos gentios. Tem um cirurgião-mor para tratar das enfermidades de seus habitantes, igreja com capelão curado; um moinho d'água no meio da povoação, comum para todos, e olaria em que se fabrica telha. Seus colonos estão estabelecidos às bordas do rio Santo Agostinho da estrada nova das Pimentas, cuja testada corre a Oeste, 4ª de Norte com fundos ao Norte 4ª de Norte, até a casa do cirurgião-mor, e depois ao Norte com diferentes voltas, com fundos a Oeste até à estrada de Parobas, que segue por este rumo desde a margem do rio Santo Agostinho, e da nova estrada de Parobas que corre para Leste com fundos aos Norte até o colono Francisco Coelho Borges, donde sai a rumo de Sul a que vai para o moinho d'água e outros nas suas sobrequadras, e cada um tem de sesmaria terreno de 112 braças de testada com 500 de fundo, e lhes passa a todos quando não pelas portas, ao menos muito próximo córregos de excelentes águas. Ao presente tem esta povoação 59 fogos com 308 almas. Do interior da mesma segue uma estrada, que próximo das nascentes do rio Jem corta a estrada do cachoeiro do rio Santa Maria à Vila Rica. Da mesma povoação se vem à vila da Vitória por duas vias, primeiro embarcado saindo pelo rio Santo Agostinho ao de Jem, e deste ao do Espírito Santo 6 para 7 léguas, seguindo por terra a pé enxuto 4 léguas de Itacibá, onde se faz passagem para a vila, e atravessando esta estrada o rio Itaquari que deságua no Jem, o qual com as enchentes tornando-se às vezes invadeável se fez sobre ele a forte ponte Itaquari, obviando-se com ela qualquer inconveniente que os novos colonos de Viana, assim como os moradores d'além da mesma povoação pudessem encontrar em suas jornadas. Todo o terreno desta povoação, que terá de longitude duas léguas, e de latitude pouco mais de uma, é mui fácil, e cortado de muitos córregos. As habitações dos colonos estão todas em pequenos montes cercados de fertilíssimas várzeas capazes de todas as plantações pelo que se conservam em extremo alegres.

Teve em 1817 a freguesia 415 batizados, 276 óbitos e 76 casamentos. Em Jacaroaba defronte da povoação de Viana principia o distrito da vila do Espírito Santo pela margem do Sul do rio Jem até a fazenda de Caçaroca, e por detrás desta e direção ao esteiro Alaberi que sai um quarto de légua abaixo da vila da Vitória da parte do Sul junto ao penedo que fica oposto à fortaleza de São João, e 3 quartos de légua distante está a vila do Espírito Santo (6 léguas desde Jacaroaba) situada próximo à entrada da barra no fundo de uma pequena enseada da parte do Sul sobre outra muito pouco superior ao nível do mar. Tem ao lado do Sul uma íngreme montanha, no cume da qual está edificado o convento de Nossa Senhora da Penha. Ã entrada da vila, junto ao mar está a cadeia, e fronteira a esta, em distância de 200 passos, a matriz, cujo orago é Nossa Senhora do Rosário, ficando de um e outro lado, em distância de 50 passos, as casas bem alinhadas.

Logo imediato à matriz principia uma grande campina, que tem de extensão légua e meia, e confina com a pequena povoação de Guaranhum, cuja campina tendo sido por muitos tempos a ruína daqueles povos por causa das exalações pútridas condensadas na atmosfera, extraídas das águas que estagnadamente se conservavam na dita campina, já depositadas pelas chuvas, já pelas enchentes e inundações do rio Jem, que lhe passa próximo, é ao presente utilíssima, não só por nelas pastarem imensos gados de todas as espécies sem perigo nem temor das cheias, como por se transitar em todo o ano a pé enxuto, por se haver de novo limpado a vala aberta pelos extintos jesuítas, pela qual se esgotam ao rio da costa que sai por baixo da fortaleza de São Francisco Xavier da barra, que está entre a vila e o monte Moreno, todas as águas que pelos ditos motivos se arrojam na mencionada campina. Meia légua dela passa o rio Jem, e faz barra no Oceano, em que só entram canoas, sobre o qual há uma boa ponte de mais de 70 braças, ficando além dela, na margem do Sul do rio, a povoação da barra do Jem, cujos moradores vivem da pesca. A estrada geral segue sempre pela borda do mar, e duas léguas distante fica a Ponta da Fruta Pequena, povoação também de pescadores, e pouco adiante o Ribeiro Doce, que divide pelo Sul a vila do Espírito Santo da de Guarapari. Tem 6 engenhos de açúcar denominados Calheiras, Ilha de Óleo, Jeuma, Araçatibu, dito, e Jacaroaba, 4 engenhocas — Ponta da Fruta, Jacaraçu, Camboapina, e Ribeiro Doce. Em 1817 teve 33 batizados, 26 óbitos e 14 casamentos.

A vila de Guarapari tem por limite da parte do Norte o Ribeiro Doce, que a divide da do Espírito Santo, e da do Sul da lagoa de Maimbá, que a separa da nova Benevente. De um a outro ponto da referida divisão há 6 léguas de distância, e duas pouco mais ou menos de beira-mar até as últimas culturas para a parte do sertão. Dentro desta compreensão há uma freguesia, cuja igreja matriz tem por orago Nossa Senhora da Conceição, e outra capela filial dedicada ao Santíssimo Coração de Jesus. Além da enseada de Meaípe[ 12 ] (pequena povoação de pescadores ao Sul da vila, e estação pouco fiel para as embarcações por mais pequenas que elas sejam) não há mais que dois portos de mar, um junto da vila, e outro no distrito de Perocão; no primeiro entram sumacas grandes, no segundo só pequenas e nas marés cheias. Há 3 rios de água doce, mas nenhum deles é navegável, a saber: o do Una, que desemboca continuadamente no mar; o de Meaípe, que em alguns meses fecha a barra; e o do Engenho Velho, que se confunde com um braço salgado do rio, em cuja foz está situada a povoação principal ao Sul da entrada. Em 1817 teve a freguesia 55 batizados, 66 óbitos e 18 casamentos. A estrada geral corre ao longo da praia, e por ela se passa sobre 3 pontes: no Una, Perocão e Meaípe. Em todo o termo da vila há 5 engenhos de açúcar, denominados — Muripicoca, Adão Velho e Fazenda do Campo, duas, e 14 engenhocas — Una, Coutinho, Tabipemó, Camarugi, Rio do Engenho, Casca de Ostras, Piaura, Aldeia Velha, duas, e Lameirão quatro. Tem 283 fogos com 2.721 almas.

No lugar onde faz barra a lagoa Maimbá começa o distrito de Benevente, que tem pela costa do mar 6 léguas de extensão e outras tantas para o sertão, e finda este distrito ao Sul da praia de Piabanha perto da barra de Itapemirim. A duas léguas da lagoa Maimbá, caminho do Sul, está situada a vila de Benevente em um pequeno monte sobre o mar da parte do Norte do rio Iriritiba. A igreja e o convento, que foram dos extintos jesuítas, servem de matriz tendo por orago Nossa Senhora da Assunção, e de casa de câmara, cadeia e residência dos vigários. Este rio Iriritiba dá entrada a pequenas sumacas, e nele vêm desaguar 7 pequenos rios a saber: 4 da parte do Norte — Salina, Araraquara, Curindiba e Quatinga, e 3 do Sul — Pongá, Picoã e Jacuba. Da parte do Norte da vila até à ponta chamada dos Castelhanos há uma enseada grande e muito abrigada do vento Leste. À distância de légua e meia da vila tem sua foz o rio Piúma que corre do Norte quase paralelo ao Iriritiba, o qual não dá entrada senão a canoas e nele se perde da parte do Sul uma légua acima da sua foz, o Rio Novo, e logo acima outra légua o de Tapuã. Entre Benevente e Piúma faz a costa outra enseada na qual há algumas pequenas ilhas, e entre elas e a costa se abrigam as embarcações maiores que não podem entrar na vila de Benevente. O total da população de todo este distrito são 352 fogos com 2.017 almas. Tem 6 engenhos de açúcar — Quatinga, Itaúna, Três Barras, Monte Urubu, Boa Vista e Inhaúma: e 4 engenhocas — Taubinha, Araru, Ponta Grossa e Inhaúma. A estrada geral corre sempre junto ao mar até à praia de Piabanha, onde se limita o distrito da vila de Benevente com o de Itapemirim. Em 1817 teve 98 batizados, 124 óbitos e 46 casamentos.

Na praia do Piabanha começa o distrito de Itapemirim, e meia légua distante sai ao mar o rio do mesmo nome, em cuja barra entram lanchas, e meia légua acima está a vila de Nossa Senhora do Amparo de Itapemirim, cujo título é o orago da sua freguesia.

O primeiro cacheiro deste rio dista da vila 6 léguas; e nele se acha estabelecido um quartel da parte do Sul, guarnecido com um inferior e 30 soldados do corpo de pedestres. Suas margens até ao quartel estão povoadas de grandes fazendas com 9 engenhos reais e uma engenhoca coberta de sapê denominados — Areia, Cardoso, Cutia, Boa Vista, Barra Seca, Passo Grande, Paineira e São Gregório da Ribeira. À distância de 3 léguas fica o quartel da Boa Vista, que serve de registo à capitania pela parte do Sul. Está guarnecido com um alferes de infantaria e 18 soldados, 10 de infantaria e 8 de pedestres, Sobre uma alta barreira à borda do mar. Quatro léguas ao Sul se atravessa o rio de Itapemirim, onde há outro quartel que como não serve senão para passar os viandantes está guarnecido com 3 soldados do de Boa Vista. A grande fazenda de Muribeca dista pouco deste quartel pelo rio acima, e tem engenho de açúcar e imenso gado de produção. Meia légua ao Sul de Itabapoana fica Santa Catarina das Mós, onde faz termo pelo lado do Sul a capitania do Espírito Santo, e principia o distrito da vila de São João da Barra dos Campos de Goitacases, pertencente já à capitania do Rio de Janeiro, sendo desde o princípio do distrito da Itapemirim até este porto 8 léguas.

As belas margens do rio Itapemirim seriam incultas como outras muitas de vários rios desta capitania do Espírito Santo, se as invasões dos índios antropófagos não constrangessem aos habitantes das minas do Castelo estabelecidas nas cabeceiras do dito rio e seus confluentes (onde houveram 5 povoações denominadas Barra do Rio de Castelo, Caxixe, e Arraial Velho, Salgado e Ribeirão) a virem estabelecer-se meia légua distante do mar, trazendo para ali a imagem de Nossa Senhora do Amparo, que colocaram no dito lugar, levantando-lhe nova matriz, começando por conseqüência a atual povoação há pouco mais de 30 anos, vindo a real fazenda a perder com o abandono das povoações do Castelo, lugar hoje muito despovoado, e a ganhar no dízimo que pagam as fazendas de Itapemirim. Tem a dita vila e seu termo 147 fogos com 2.025 almas. Em 1817 teve 83 batizados, 83 óbitos e 20 casamentos.


RESUMO

Fundação desta capitania 292 anos. — Governada por donatários 192 anos. — Por capitães-mores, 83. — Por governadores ou subordinados subalternos à Bahia, 10. — Por governador independente 5. — Vilas 6. — Povoações 6. — Freguesias 8. — Capelania curada 1. — Colégios dos extintos jesuítas 3. — Santa Casa da Misericórdia 1. — Igrejas de particulares 4. — Igrejas filiais 5. — Conventos franciscanos 2. — Do Carmo 1. — Ordens terceiras 2. —Portos de mar 7. — Rios principais 10. — Engenhos 76. —Engenhocas 68. — Fogos 3.729. — Almas 24.585. — Batizados (em 1817) 1.087. —Óbitos 824. — Diferença a favor da população 263 almas. — Casamentos 273.

N.B. — A população desta capitania se considera exceder muito à que dão em mapa os comandantes dos diferentes distritos, principalmente na parte relativa à escravatura, e a experiência tem mostrado que os senhores não denunciam o número exato dos escravos que possuem; talvez que com a continuação de novas relações se possa vir no exato conhecimento do total da população.

Há nesta capitania uma espécie de Bômbix,[ 13 ] cujo casulo é muito maior que o persiano. A cor da seda é amarela escura, encontram-se alguns cor de ouro, de carne e verde. O intendente geral da polícia, Paulo Fernandes Viana, mandou fazer as precisas experiências para provar sua qualidade, reconhecendo este que o estado pudera perceber considerável interesse, porque o inseto nutre-se da folha da mamona e da laranjeira brava, que está no seu país nativo.

Vitória, 30 de Março de 1818. — Francisco Alberto Rubim.

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NOTAS


[ 1 ] No original, Jeuhy.
[ 2 ] No original, Paulo.
[ 3 ] Embarcação robusta, de ferro ou de madeira, fundo chato, usada para desembarque ou transbordo de carga.
[ 4 ] Soldado da infantaria.
[ 5 ] Antigo navio à vela.
[ 6 ] Carta de doação do sr. dom Pedro II, datada de 18 de Março de 1657 a Francisco Gil de Araújo, declara fazer-lhe doação de 50 léguas de terras principiando onde acabasse as que havia concedido a Pedro de Campos Tourinho. Está registrada no livro de registo da câmara da vila da Vitória, n. 59 à fl. 105 v. [Nota original]
[ 7 ] Pontes toscas.
[ 8 ] Casas.
[ 9 ] No original, Gyparanan.
[ 10 ] Antiga embarcação à vela e remo.
[ 11 ] Pequena embarcação de proa fina e popa chata, impelida a remo ou vela, que executa serviços de um navio ou repartição marítima.
[ 12 ] No original, Mihaype.
[ 13 ] Bicho-da-seda.

Francisco Alberto Rubim  da Fonseca e Sá Pereira nasceu em Lisboa, na freguesia de Santa Isabel em 13 de Abril de 1768, filho de José Pedro Bocardo Rubim e Eusébia Teresa da Fonseca Sá Pereira, e faleceu na mesma cidade, na freguesia da Encarnação, a 14 de Novembro de 1842. Comendador e Cavaleiro da Ordem de Cristo, Capitão de Mar-e-Guerra da Armada Real. Foi governador da capitania do Espírito Santo (1812—1819) e em seu governo foi criado o município de Cachoeiro do Itapemirim. Ele foi parabenizado por D. João VI pelos esforços para o desenvolvimento do Espírito santo, abrindo estradas, expandindo as lavouras, incentivando a mineração e melhoramentos da navegação. Rubim levantou importantes construções no Espírito Santo como a Casa de Misericórdia e a reforma do Forte São João, tendo sido responsável também por trazer imigrantes para o Estado. Foi também nomeado para governar a capitania do Ceará, cargo em que permaneceu de 1820 a 1821.

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