Baía de Vitória a partir do Morro do Moreno. Foto Maria Clara Medeiros Santos Neves, 2016. Texto (Text): Luiz Guilherme Santos Neves ...

Espírito Santo, Brasil (Português / Inglês)

Baía de Vitória a partir do Morro do Moreno. Foto Maria Clara Medeiros Santos Neves, 2016.
Baía de Vitória a partir do Morro do Moreno. Foto Maria Clara Medeiros Santos Neves, 2016.
Texto (Text): Luiz Guilherme Santos Neves
Renato Pacheco
Reinaldo Santos Neves


TERRA DE MAR E MONTANHA / LAND OF MOUNTAINS AND SEA

Desta terra sem par a grandeza
O meu canto não diz nem traduz
São cachoeiras de força e beleza
São montanhas cobertas de luz
(Canção Minha terra, letra de Cyro Vieira da Cunha, música de Henrique Vogeler)
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I know not how to sing or tell you
Of this matchless land’s wonders:
Waterfalls in their strength and beauty,
Mountains sparkled with light.
(My land. Lyrics by Cyro Veira da Cunha, music by Henrique Vogeler.)


Espírito Santo, Brasil. O que é? Como é? O que tem de El-Dorado, de Shangri-lá, de Canaã?

Falemos desse pequeno Estado do sudeste brasileiro. E falemos primeiro da terra, porque no princípio era a terra.

Em linguagem de geógrafo se diria que o Espírito Santo é um território de 45.597 km² de superfície, situado nos trópicos entre 17º 55′ 21″ e 21º 17′ 59″ de latitude sul. Mas, em estilo de crônica, vejam: o Espírito Santo, no mapa, nada mais é do que uma faixa de terra espremida entre o vasto Estado de Minas Gerais e o profundo mar azul. Parece mesmo, por ironia ou simbolismo, um Portugal invertido, com Minas fazendo o papel de Espanha, eqnaunto o oceano é o mesmo, Atlântico lá como cá. A diferença está no sol, que aqui se ergue molhado de mar, e lá, é no leito do mar que se deita ao crepúsculo.

É uma terra feita de mar e montanha, que o sol banha de muita luz a maior parte do ano.

As praias se sucedem ao longo de 400 quilômetros de costa, alternando-se em estirões e enseadas. Algumas conservam traços primitivos e edênicos. Outras se sofisticaram em balneários de fama internacional.

No verão essas praias são tomadas de assalto pelos turistas, atraídos pelas águas claras de temperatura agradável. Cresce então a procura pelos pratos típicos da terra, feitos com frutos do mar — peixes, camarões, siris e lagostas — ou com caranguejos, frutos dos mangues do litoral do Espírito Santo. Nessa culinária reina soberana a moqueca de peixe com pirão de farinha, servida fervendo em panela de barro.

A partir de 16 milhas da costa, nas águas azuis, a plataforma continental do Espírito Santo é o principal reduto do mundo para a pesca do marlim. Um marlim azul de 636 quilos mereceu registro noGuiness Book of Records.

As montanhas realçam a beleza natural da região central do Espírito Santo. Esses verdes relevos têm ameno clima tropical de altitude e a temperatura, nas noites de inverno, pode chegar perto de zero grau centígrado. Aí vivem beija-flores e orquídeas, e espalham-se pacatas cidades com jeito rural, onde o tempo não tem pressa de passar. Aí se deparam cenários que lembram recantos europeus, numa transposição mágica de geografias.

A região tem bons hotéis com chalés à beira de lagos onde se pode pescara carpa do almoço e campos de golfe para praticar aquele que é o mais tranqüilo dos esportes. Sem falar nas pousadas e restaurantes de estilo rústico nas vertentes das colinas cobertas de mata.

Rio é coisa que não falta nessa parte do Espírito Santo, com águas frias e arrepiadas caindo em penca em inúmeras cachoeiras e cascatas, ou percorrendo vales cheios de história, porque neles se estabeleceram colônias de imigrantes europeus. O nome de alguns deles — Jucu, Itapemirim — guarda a lembrança dos indígenas, donos da terra por direito natural. O nome de outros, como Benevente, fixa a saudade que o colono português sentia de casa.

Mas o maior rio do Estado chama-se simplesmente rio Doce. Natural de Minas Gerais, vem desaguar no Atlântico, cindindo o território do Espírito Santo em duas metades quase iguais em tamanho, porém de relevo distinto.

Ao sul ficam os contrafortes da serra da Mantiqueira, que se aproxima do litoral para espiar o mar. Seu ponto culminante é o pico da Bandeira, na serra do Caparaó, muro que separa os quintais do Espírito Santo e Minas Gerais. Do alto de seus2.890 metros fica fácil, quando as nuvens não tapam a vista, contemplar boa parte do Espírito Santo.

Já ao norte do rio Doce abre-se uma região de tabuleiros ondulados onde despontam belos picos solteiros plantados em meio a maciços de granito. O rio São Mateus, chamado Cricaré — ou preguiçoso, em língua tupi — desliza por essas bandas numa pachorra que lhe justifica o antigo nome.

Nessa parte setentrional, em que o porto de São Mateus teve época de fastígio, graças ao comércio da farinha de mandioca, desenvolvem-se hoje a pecuária, o reflorestamento intensivo e a produção do petróleo.

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Espírito Santo, Brazil. What is it? What is it like? What does it have in common with El Dorado, Shangri-la, and Canaan? We will speak first of the land, because it has always been there.

Geographers would state that Espírito Santo has an area of 17,605 square miles in the tropics, between 17º 55′ 21″ and 21º 17′ 59″ south latitudes. But, if we were to write a chronicle, we would say that, on a map, it represents no more than a strip of land wedged between the state of Minas Gerais and the deep blue sea. It seems — be it ironically or symbolically — like an inverted Portugal, with Minas playing the role of Spain whereas the ocean is the same. It is the Atlantic, both here and there. We find the difference in the sun. Here it rises, drenched by the sea, and there its settles into a watery bed at dusk.

This is a land forged from the mountains and sea, basking in the sun most of the year.

Its beaches lie along more than two hundred miles of coast, alternating between long, sandy stretches and small bays. Some have retained their primitive, Edenic features while others have become sophisticated resorts of world renown.

During the summer, those beaches are stormed by tourists, attracted by the clear, warm waters. And the demand grows for typical local dishes prepared from the fish, shrimp and lobsters taken from the sea or crabs from the mangrove swamps along the coast. The matchless specialty there is fish moqueca, served boiling in earthenware pots with a side of pirão de farinha — a spicy cassava flour mush.

The continental shelf, which begins 16 miles offshore, is by far the best spot in the world for marlin fishing. A 1,404-pound blue marlin caught there was duly granted an entry in the Guinness Book of Records.

Mountains heighten central Espírito Santo’s beauty. Those green highlands enjoy a mild climate, where the temperature may drop to zero degree Celsius on winter nights. In an area that is home to hummingbirds and orchids, peaceful rural towns abound where there is no hurrying time. And we can find scenes that remind us of Europe, in a magical transposition of geography.

The region features good hotels with lakeside chalets. You can catch a carp for your lunch or take advantage of the golf course built for fans of that particularly relaxing sport. And we have not even mentioned the rustic restaurants and inns scattered on the slopes of tree-covered hills.

There is no shortage of streams in the area. Their chilly waters rush over numerous falls and wash along valleys drenched with the history of the European immigrants who once settled on their banks. Some of their names — Jucu, Itapemirim — remind of the land’s original inhabitants, the Indians. Others, like Benevente, express the Portuguese colonists’ longing for their homeland.

The state’s greatest river is simply called the Rio Doce — Fresh Water River. With its headwaters in Minas Gerais, it flows eastward to the Atlantic ocean and divides Espírito Santo into two halves, almost identical in size but with quite different contours.

In the south lie the foothills of the Mantiqueira range, which approach the coast as if to peep at the sea. They culminate at Bandeira peak in the Caparaó range, forming a wall that separates the backyards of Espírito Santo and Minas Gerais. At 9,462 feet, you can easily see much of Espírito Santo on a clear, dry day.

A vast expanse of rolling tablelands stretches north from the Rio Doce, displaying beautiful, solitary peaks that crop up among granite massifs. Rio São Mateus, also know as Cricaré — Lazy River in Tupi — flows across those areas at a sluggish pace that accounts for its earlier name.

Today, we find cattle farming, intensive reforestation, and oil production in this northern region where São Mateus was once a booming port, thanks to cassava flour.


UM POUCO DE HISTÓRIA / A BIT OF HISTORY


Falamos da terra. Falemos agora um pouca da história do povo que nela habita.

Pode-se dizer, com liberdade de imagem, que a história do Espírito Santo tem uma estrutura sinfônica, dividindo-se em três movimentos: vivace com brio, adagio e presto.

O primeiro movimento abrange o século inicial da colonização portuguesa, quando se põem face a face, na terra luxuriosa, portugueses e índios, no confronto dos contrários. A fundação dos primeiros povoados, a criação de uma agricultura permanente, a exploração do território, a pregação do cristianismo pelo jesuítas, a escravização e aldeamento dos indígenas, fazem estalar conflitos inevitáveis entre colonos e índios, marcando com a violência os compassos dessas overture. A introdução do africano para o trabalho das lavouras agrava e amplia o ritmo desses entrechoques.

Vasco Fernandes Coutinho, o primeiro donatário, é o personagem principal desse período. Sua longa vida teve duas fases bem distintas: na primeira ele é o herói camoniano, o lusíada que desbrava os mares e conquista as Índias, na Segunda, que é a aventura brasileira, Coutinho protagoniza uma tragédia shakesperiana de fracasso, miséria e morte. Tendo empenhado patrimônio e saúde na colonização, morreu quase ao desamparo depois de 25 anos de Brasil.

A chegada dos portugueses à terra se deu em 23 de maio de 1535, Domingo do Espírito Santo — razão do nome. Espírito Santo também chamou-se a primeira vila, fundada no remanso de uma enseada, a Prainha. Quinze anos depois, o lugarejo passou a chamar-se Vila Velha, não porque tivesse envelhecido a olhos vistos, mas porque a administração da colônia foi mudada para local mais seguro, a ilha montanhosa no interior da baía. Desde então, a Vila Nova de Nossa Senhora da Vitória tornou-se sede do governo do Espírito Santo.

Esparsos núcleos de povoamento surgiram ao norte e ao sul de Vitória — São Mateus, Nova Almeida, Serra, Guarapari, Reritiba — sempre na franja litorânea. Suas populações, ralas e humildes, daí não arredavam pé, sofrendo da crônica falta de recursos, atemorizados pelos índios do sertão e pelos piratas do mar.

Era o pau-brasil e o açúcar da capitania que atraíam esses piratas, mas suas incursões não passaram de grandes sustos. Nem os franceses, nem os ingleses, que aqui estiveram em 1592 sob o comando do célebre corsário Thomas Cavendish, conseguiram butim que valesse a pena.

Maior foi o susto nas duas ocasiões em que holandeses assaltaram Vitória subindo suas ladeiras. Em 1625 tiveram de se ver com a jovem Maria Ortiz, que se fez heroína e virou mito. Em 1640, foram repelidos após ferozes escaramuças que serviram para batizar uma ladeira com o nome de rua do Fogo.

Lá na Bahia, o padre Antônio Vieira celebrou a derrota dos protestantes com estas palavras de duplo sentido: “Esta foi a vitória do Espírito Santo uma das mais notáveis que hão tido no Brasil as armas católicas”.

São palavras de exaltação que encerram o vivace com brio de nossa sinfonia histórica.

O segundo movimento é um adagio. Descobrira-se ouro no sertão, que foi logo desmembrado do território do Espírito Santo para constituir a capitania de Minas Gerais. Para proteger riquezas recém-descobertas, Portugal proibiu a abertura de caminhos naquela direção, sob pena de confisco e degredo para Angola.

Mesmo parcos de bens, os habitantes do Espírito Santo não se arriscaram ao desterra, e até acharam na ameaça oficial um motivo a mais para ficar como estavam. Permaneceram aquietados no litoral, emendando o vazio dos dias com os pavores da noite, bastando-se das roças de milho, feijão e mandioca. O regalo das proteínas, em sua dieta diária, vinha dos peixes que colhiam ao mar e aos rios e que comiam do jeito que já se sabe, cozidos em panelas de barro, fortalecendo assim a tradição das moquecas.

O século XIX vê brotar um outro Espírito Santo, no que seria o terceiro movimento — presto — da sinfonia, uma sinfonia ainda inacabada. Esgotado o ouro das Minas Gerais, foi estimulada a comunicação com aquela capitania pelo governo português. O sertão, antes impenetrável, passou a ser desbastado e o botocudo, que nele habitava, defendeu como pôde seu território.

Nesse século começa também, em ondas crescentes, o avanço dos cafezais pelo sul da província, ficando raízes no chão antes recoberto de matas. Lavradores fluminenses e mineiros fundam fazendas no vale do rio Itapemirim e em terrenos vizinhos. Em pouco, um novo pólo econômico centraliza-se na vila de Cachoeiro de Itapemirim.

A partir de meados do século foram criados, nas serras centrais do Espírito Santo e nos vales dos rios que por entre elas correm, colônias com novos imigrantes europeus. São colonos da Europa Central, alemães — especialmente pomeranos — austríacos, suíços e holandeses. Mas o maior número vem do norte da Itália em fluxo que não pára.

Plantando e colhendo café juntamente com outros produtos agrícolas, os imigrantes e seus descendentes vão gradativamente incorporando novas áreas à agricultura, transpondo o rio Doce e desbravando as terras setentrionais, onde mineiros e baianos também se estabeleciam. Na metade do século XX o território do Espírito Santo estava enfim todo conquistado. A população rural sobrepujava a urbana mas a cidade de Vitória, capital do Estado, já pontificava como importante porto do litoral brasileiro.

Esta situação demográfica se inverteu nas décadas seguintes. Atualmente quase metade da população do Espírito Santo, cujo total ascende a cerca de 3 milhões de habitantes, vive nas cidades, com maior concentração na região metropolitana da Grande Vitória. Constituída pelos municípios da Serra, Vila Velha, Cariacica, Viana e Vitória.

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We have talked about the land, so let us now turn to the history of those who live there.

We can imagine the history of Espírito Santo as being a three-movement symphony. The first movement — vivace con brio — spans the first century of European colonization, as the Portuguese and Indians faced each other in a battle of contrasts over a lush, tropical country. The founding of the first settlements, introduction of permanent agriculture, exploration of the land, preaching of Christianity by Jesuit missionaries, and attempts to settle the Indians and reduce them into slavery gave rise to inevitable conflicts between the native population and the colonists, thus stamping this overture with a high pitch of violence. The forced arrival of Africans to work in the fields aggravated and deepened those hostilities.

Vasco Fernandes Coutinho, who received the first grant in Espírito Santo, was the outstanding figure during this period. His long life had two very different phases. He began as a typical Portuguese hero in the style of Camoëns’s Lusíadas by braving unknown seas and conquering the East Indies. As a middle-aged man, however, he took part in a Shakespearean tragedy of failure, misery, and death on Brazilian shores. He invested both his property and health in the colonial effort, only to die almost penniless after twenty-five years in the country.

The Portuguese landed on May 23, 1535, Pentecost Sunday — Domingo do Espírito Santo in their language — which explains the origins of the name. They also christened their first settlement on the backwaters of the bay — Prainha, or Small Beach — with the same name. Fifteen years later, it was changed to Vila Velha — Old Village, but not because the village had aged. Rather, they moved the colonial administration to a safer location — a mountainous island in the bay. Since that time, the new village — Vila Nova de Nossa Senhora da Vitória — has been the seat of government in Espírito Santo.

Dispersed settlements sprang up north and south of Vitória — São Mateus, Nova Almeida, Serra, Guarapari, Reritiba — all along or near the coast. Poor and few in number, the colonists would not budge, even though they suffered from chronic shortages of supplies and were terrified of Indians from the backlands and pirates from the sea.

The pirates coveted brazilwood and sugar, but their raids in Espírito Santo caused little more than great alarm. Neither the French nor the English — the latter led by the famed privateer Thomas Cavendish in 1592 — were able to take enough loot to justify their effort.

The Dutch tried and almost succeeded where others had failed. They twice fought their way up the island’s slopes. In 1625, they had to deal with Maria Ortiz, a young heroine who became a local legend. They were driven off in 1640 after a series of wild skirmishes that gave Fire Street its name.

In Bahia, Father Antônio Vieira commemorated the Protestants’ defeat with a play on words: “This Victory of the Holy Spirit was one of the most remarkable victories ever achieved by Catholic arms in Brazil.” In Portuguese, Vitória do Espírito Santo can mean both the name of the city and, literally, the victory in question.

And with these words of exaltation, the first movement of our historic symphony comes to a close.

Our second movement is an adagio. Gold was discovered in the hinterlands, which led the Portuguese to separate it from Espírito Santo and create the captaincy of Minas Gerais. So zealous were they about protecting their newly-found mines that they forbade the opening of roads westward, under the penalty of forfeiture of property and banishment to Angola.

Though destitute, Espírito Santo’s inhabitants would not risk being transported overseas. They even regarded the official threat as another reason to stay the way they were. They quietly remained on the coast, coupling fear of their nights with the emptiness of their days while contenting themselves with crops of corn, beans, and cassava. The protein in their daily diet came from fish they caught at sea or in the rivers, which they boiled in earthenware pots, thus strengthening the tradition of moquecas.

Our third symphonic movement — presto — brought with it the flowering of a new Espírito Santo in the nineteenth century, which is still in progress. With the depletion of gold in Minas Gerais, the Portuguese government encouraged the opening of new routes to that captaincy. The backlands, formerly barred, were now opened and the Botocudo Indians living there defended their land as best they could.

At the time, coffee groves were planted in southern Espírito Santo on formerly forest-covered lands. Farmers from Rio de Janeiro and Minas Gerais established plantations in and around Itapemirim Valley and a new economic axis was soon centered on the village of Cachoeiro de Itapemirim.

By mid-century, new waves of European immigrants had begun settling in the central highlands and along the rivers running through its valleys. The immigrants were from Central Europe — Germans, mainly from Pomerania, as well as Austrians, Swiss, and Dutch. But the greatest numbers came from northern Italy in a never-ending flow.

The immigrants and their descendants, planting and harvesting coffee, gradually occupied new areas for agriculture. They spread beyond the Rio Doce into northern Espírito Santo, where people from Minas Gerais and Bahia had already put down roots.

By mid-twentieth century, Espírito Santo’s territory had been fully occupied. The rural population out-numbered that in urban areas, but Vitória, the state capital, had grown into a major Brazilian port.

This demographic pattern was reversed in subsequent decades. Today, roughly, half of the state’s three million inhabitants live in cities, particularly in Cariacica, Viana, Vila Velha, and Vitória.

RAÍZES CULTURAIS / CULTURAL ROOTS


Se a história do Espírito Santo veio do mar, sua cultura formou-se na terra, de outras culturas pré-existentes.

Os índios contribuíram com palavras que batizaram lugares e enriqueceram a língua do povo. A expressão capixaba é uma delas. Significando em tupi pequena roça de milho, virou o gentílico dos nascidos no Espírito Santo. Os índios transmitiram ainda técnicas tropicais de pescar e caçar, do fabrico da farinha de mandioca, da produção de panelas de barro usadas na culinária e na decoração. De lambuja ensinaram os portugueses a pescar com gestos artísticos usando tarrafas.

Os africanos entraram, de sua parte, com danças populares como as Bandas de Congo e o Ticumbi, de indumentária vistosa e coreografia guerreira. Deles veio a devoção a São Benedito, o requinte no preparo das comidas à base de farinha de mandioca, da torta de marisco da Semana Santa e da gostosa moqueca capixaba, feita com o africano capricho de temperos e azeites.

Os portugueses trouxeram a língua, a organização administrativa, a arquitetura colonial e a fé católica, cujo monumento máximo é o convento da Penha, na entrada da baía de Vitória, o mais notável templo seiscentista da costa do Brasil. Fundado pelo fanciscano frei Pedro Palácios, o convento tornou-se sede do culto a Nossa Senhora da Penha, padroeira do Espírito Santo.

Os imigrantes da Itália e da Europa Central deixaram sua marca na culinária, de que é exemplo a polenta da receita italiana, e na arquitetura de telhados inclinados. Com experiência milenar legaram a aptidão para o cultivo do solo, a prática de ofícios artesanais e mecânicos e o gosto pela música o vaivem alegre e serpentino das concertinas. Seu poder de iniciativa revela-se em grandes empreendimentos do comércio e da indústria, acompanhados mais tarde pelos descendentes dos sírios e libaneses, chegados ao Espírito Santo no começo do século XX.

O perfil cultural do Espírito Santo não está acabado. Ele continua sendo conformado pelas transformações econômicas e sociais. Os japoneses, mais recentemente, estão se integrando a este grande caldeamento cultural, atraídos como técnicos pelos projetos industriais em expansão, principalmente nas áreas portuária, siderúrgica e de indústrias de ponta.


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If Espírito Santo’s history arrived by sea, its culture was forged on land from other cultures.

Indians gave us place names and enriched our everyday language. The very word capixaba serves as an example. Originally a Tupi word meaning a small corn field, capixaba now signifies anyone born in Espírito Santo. They also contributed hunting and fishing skills, cassava flour, techniques for making earthenware pots used for cooking and decorative purposes. As a bonus, they taught the Portuguese the graceful art of fishing with throw nets.

The Africans, on their part, also contributed folk dances replete with colorful costumes and warlike choreography, such as the Congo and Ticumbi. In addition, they gave us the cult of St. Benedict, excellent cassava-based culinary, a seafood pie traditionally served during Holy Week, and the delicious moqueca, concocted with typically African spices and oils.

The Portuguese brought their language, administrative organization, colonial architecture, and the Catholic religion. The convent of Our Lady of the Rock, atop a hill overlooking the entrance to Vitória bay, is the most notable example of colonial church architecture on Brazil’s coast. Founded by the Franciscan friar Pedro Palácios, it became the shrine of Our Lady of the Rock, Espírito Santo’s patron saint.

Immigrants from Italy and Central Europe also left their mark on local cuisine and architecture, as shown by Italian polenta and tall, sloping roofs. Their millennial legacy included agricultural techniques, handicrafts, mechanical skills, and a taste for concertina music. Many large commercial and industrial ventures bear witness to their entrepreneurial abilities, an aptitude they share with the descendants of Syrians and Lebanese who arrived here in the early twentieth century.

Espírito Santo’s cultural profile has not yet been completed. It is still undergoing economic and social transformations. The Japanese, recent newcomers, are integrating themselves in this great cultural melting pot. They are being employed as technicians in expanding industrial projects, especially in port facilities, iron ore mills, and state-of-the-art technology.

A CAMINHO DE UM TEMPO NOVO / BOUND FOR TOMORROW


Falemos, finalmente, do que se fez e se pode fazer nesta terra.

Até meados do século passado, a economia do Espírito Santo limitava-se à pesca artesanal, à extração de madeiras, à pecuária incipiente, às lavouras de subsistência e da cana-de-açúcar e da mandioca.

O cultivo do café alterou este quadro tornando-se a base da economia, responsável pela transformação de Vitória em ativo porto de exportação.

O café ainda tem expressiva participação no produto interno bruto estadual, contando com milhões de cafeeiros produtivos. Novos produtos, porém, encontram-se em franca expansão, como alho, tomate, macadâmia, pimenta-do-reino e outros. O cultivo de frutas tropicais e de clima temperado se firma aceleradamente. Outras frutas como abacaxi, mamão e banana são exportadas para vários Estados brasileiros. A industrialização de alimentos à base de carnes de qualidade e de derivados do leite tem campo aberto pela frente devido ao avanço da pecuária.

Com a implantação, a partir da década de 60, dos chamados grandes projetos, a fisionomia econômica estadual mudou radicalmente. A Companhia Vale do Rio Doce inaugurou, em 1966, o porto de Tubarão, para exportação de minério de ferro, inclusive pelotizado.

Nas proximidades do porto o governo brasileiro instalou a Companhia Siderúrgica de Tubarão tendo, à época, parceiros italiano e japonês. A empresa está hoje privatizada produzindo mais de três milhões de toneladas de placas de aço por ano.

Contíguo ao terminal de Tubarão foi montado o grande porto de Praia Mole que completa, com o complexo industrial da Aracruz Celulose, ao norte de Vitória, o elenco dos grandes projetos.

O Centro Industrial de Vitória — Civit — no município da Serra abriga hoje cerca de cem indústrias inclusive a JDR, uma joint-venture da Xerox com dois de seus ex-empregados, dedicada à fabricação de periféricos para impressoras eletrônicas. Dois centros industriais já estão projetados para os municípios de Vila Velha e Linhares, com previsão de novos para Cariacica, Cachoeiro de Itapemirim e Colatina. Nesta última cidade, à margem do rio Doce, acaba de ser inaugurada uma Escola Técnica Federal para a preparação de técnicos de nível médio. Ela passa a integrar a rede de ensino especializado que tem na Escola Técnica Federal de Vitória, no Senai – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial e na Universidade Federal do Espírito Santo centros fundamentais de formação profissional.

Mas é sem dúvida, o corredor de exportação da região centro-leste do Brasil que rasga incomparáveis perspectivas para o Espírito Santo. O corredor escoa por meio de ferrovia a produção do cerrado brasileiro — vastíssima e rica área que compreende os Estados de Minas Gerais, Goiás, Tocantins e Mato Grosso do Sul. Para isto o terminal de Tubarão foi dotado do aparelhamento necessário, além de unidades especiais de armazenamento de grãos, notadamente soja. A Companhia Vale do Rio Doce participa do transporte com sua estrada de ferro Vitória a Minas.

Vitória transformou-se no maior complexo portuário brasileiro, voltado para a importação de produtos vários como o carvão e para a exportação principalmente de minérios, produtos siderúrgicos e grãos. Caminha assim para ser poderoso pólo comercial e financeiro internacional graças a sua posição portuária privilegiada, integrada à região que, com os Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerias e São Paulo, gera a maior renda interna do Brasil.

Buscando equilibrar o desenvolvimento da Grande Vitória com o do interior do Estado, medidas estão sendo postas em prática. São projetos diferenciados, ligados aos recursos naturais e às possibilidades econômicas dos municípios do Estado. O beneficiamento do granito e do mármore com segurança de absorção pelo mercado externo, onde o mármore do Espírito Santo tem sido confundido com o de Carrara, é um exemplo.

O turismo, atrelando a região serrana às praias próximas, já movimenta investimentos públicos e privados atentos à capacidade da recepção do Estado para 5.000.000 de turistas por ano.

O desenvolvimento do Estado está sendo alcançado com a consciência da necessidade de se priorizar a preservação do meio ambiente.

O Espírito Santo fecha o século bem diferente de quando começou. O projeto de expansão econômica que se tem agora é arrojado e diversificado, dentro de planejamento bem estruturado, de sólida sustentação. Suas diretrizes apontam para o século que se aproxima e dão a certeza de que é possível se realizar o sonho de que fala o hino do Espírito Santo: alcançar a estrela prometida.

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And, finally, let us speak about what has been and can be done in this land.

Until the mid-nineteenth century, Espírito Santo’s economy was restricted to rudimentary fishing and cattle ranching, lumbering, subsistence level agriculture, sugar cane and cassava.

Coffee, which became the basis of the economy, changed this picture altogether. It made Vitória evolve into a major port for exports.

Coffee remains an important item in the state’s gross domestic product, as there are millions of productive coffee plants. A new line of products, however, is now being fully expanded to include, among others, garlic, tomatoes, Queensland nuts, and black pepper. The cultivation of tropical and temperate fruits has been rapidly increased. Other fruits, such as pineapples, papaya, and bananas, are being exported to several Brazilian states. Improved cattle ranching has opened the horizon for the meat processing and dairy industries.

The state’s economic profile began to change drastically in the early sixties due to the implementation of so-called major projects. The Vale do Rio Doce Company inaugurated the port of Tubarão in 1966 to export iron ore, including in the form of pellets.

The Brazilian government opened the Tubarão Steel Company near the port in conjunction with Italian and Japanese partners. This company has since been privatized and now has an annual output of over three million tons of steel plates.

The large Praia Mole port was constructed near Tubarão, which, with the Aracruz Celulose industrial complex north of Vitória, rounds out the list of the state’s major projects.

The Vitória Industrial Center (Civit) in the municipality of Serra now houses nearly one hundred industries. Among these, we find JDR, a joint-venture established by Xerox and two of its former employees to manufacture peripherals for electronic printers. Another two industrial centers have been planned for Vila Velha and Linhares, and others are being considered for Cariacica, Cachoeiro de Itapemirim, and Colatina. Colatina, on the banks of the Rio Doce, just witnessed the inauguration of a federal technical school to train middle level technicians. This school has been integrated into the network of specialized education that includes the Federal Technical School in Vitória, the National Service for Industrial Apprenticeship (Senai) and the Federal University of Espírito Santo.

However, it is undoubtedly the transport corridor in Brazil’s central-eastern region that has brought the state incomparable perspectives for growth. Products from the Brazilian cerrado — a vast and fertile area including the states of Minas Gerais, Goiás, Tocantins, and Mato Grosso do Sul — are carried along the corridor by rail, which is why the Tubarão terminal was given all of the equipment it needed, in addition to special facilities for storing grain, particularly soy beans. The Vale do Rio Doce Company has contributed its Vitória-Minas railroad to this transportation network.

Vitória has become Brazil’s largest port facility, focussing on importing goods like coal and exporting iron ore, steel, and grain. It is thus on its way to becoming an important international commercial and financial center because of its highly developed port, which is closely integrated with the states of Rio de Janeiro, Minas Gerais, and São Paulo — Brazil’s greatest income-producing region.

Measures are being taken to balance Greater Vitória’s economic growth with that of the state’s rural areas. These projects are varied in nature and are linked to the natural resources and economic potential of the state’s municipalities. As an example, we can cite the processing of granite and marble. The state’s marble — in great demand overseas — has been ranked equal to that of Carrara.

Tourism, which links the highland and coastal regions, has already brought about public and private investments aimed at the state’s capacity to accommodate five million tourists per year.

Furthermore, development in the state is being carried out with an awareness of the need to make environmental protection a priority.

Espírito Santo is different altogether from the humble province it was at the turn of the century. The daring and diversified economic development project now under way is being carried out in accordance with sensible, carefully thought-out guidelines. It is geared toward the coming century, certain of realizing the dream spoken of in the state’s an them: to reach the promised star.


[Reprodução autorizada pela Xerox do Brasil e pelos autores.]

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© 2011 Texto com direitos autorais em vigor. A utilização / divulgação sem prévia autorização dos detentores configura violação à lei de direitos autorais e desrespeito aos serviços de preparação para publicação.
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Luiz Guilherme Santos Neves (autor) nasceu em Vitória, ES, em 24 de setembro de 1933, é filho de Guilherme Santos Neves e Marília de Almeida Neves. Professor, historiador, escritor, folclorista, membro do Instituto Histórico e da Cultural Espírito Santo, é também autor de várias obras de ficção, além de obras didáticas e paradidáticas sobre a História do Espírito Santo. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)
Renato Pacheco foi importante pesquisador da história e folclore capixabas, além de escritor, com vários livros publicados. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)
Reinaldo Santos Neves é escritor com vários livros publicados e foi responsável pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas da Literatura do Espírito Santo, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Espírito Santo. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui

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